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Anúncios paulistanos [Elói Alves]

Anúncios paulistanos 

"PROCURA-SE" dizia o título de anúncio em um cartaz de um poste, próximo à Câmara Municipal de São Paulo no viaduto Jacareí. Apreensivo a princípio, fui relaxando, no entanto, e logo o achei pitoresco. Era sobre uma dessas aves que falam ou tentam falar. Havia sumido fazia dias, era um xodó para a família, sentia-se falta em casa, em fim, dizia a palavra “tatá” e seria recompensado com dinheiro o bom coração que o achasse e o devolvesse. Demorei-me ali um instante e minha namorada veio também ler o anúncio e acabou-se rindo.


Em caminho a um teatro da Brigadeiro Luis Antônio fui me lembrando de alguns anúncios antigos e curiosos que me ficaram à cabeça. Depois da época dos outdoors a cidade mudou de cara com a entrada em vigor em 2007 da “ Lei da Cidade Limpa”. Mas quem está habituado à cidade desde os anos anteriores vai se lembrar de como sua paisagem era diferente. Quem vai atualmente de São Paulo aos municípios da região metropolitana, ou faz o caminho inverso, sente rapidamente a diferença. Eu mesmo levei um susto há coisa de um ano quando fui a uma palestra em uma escola na entrada de Taboão da Serra, indo pela Avenida Francisco Morato, logo ali depois do Butantã. A escola funcionava em uma casa pequena e térrea, a rua era estreita e sem saída, a placa via-se a novecentos metros, com o nome e o lema da instituição em letras e cores chamativas.
Um dos lugares de maior concentração de publicidade externa era os grandes corredores viários da cidade, como as Marginais Tietê e Pinheiros e a Avenida Radial Leste. Mas as avenidas menores não ficavam excluídas. Na Rebouças, na Avenida São
João, na Rua da Consolação, na Avenida Doutor Arnaldo largos espaços eram ocupados por outdoors, placas, faixas de vários tipos e tamanhos .
Também as faixadas dos prédios eram pintadas com anúncios ou tinham cartazes gigantescos colados em suas laterais, de modo que muito antes de se entrar na cidade já se podia ler na parte alta dos prédios do centro propagandas de roupas, marcas de calcinhas e cuecas, nomes de galerias comercias e a insistente ordem para se tomar coca-cola.
Mas a disputa por espaços não era harmônica nem benévola. Algumas marcas mais poderosas ocupavam os melhores locais ao longo de todo o ano. No entanto, em períodos eleitorais, mesmo marcas internacionalmente conhecidas não podiam disputar com alguns nomes tradicionais ou economicamente mais poderosos da política. No período da campanha as marcas comerciais cediam espaço às caras engravatadas dos candidatos. Mesmo alguns vereadores tinham propaganda em nível de candidato a prefeito. Era colossal.


Algumas propagandas nos distraiam, é verdade. Outras eram aturáveis. Mas a maioria era um tédio. Tédio infernal às vezes, quando a mesma placa era posta em grande quantidade numa mesma via. Dessa estirpe eram aquelas propagandas do candidato de quem não gostávamos. E lá estava ele, enorme, dando-lhe jóia e olhando no fundo dos seus olhos, rindo-se; e você querendo chorar.
Na parte da estratégia o publicitário não podia brincar. A concorrência era grande, o povo andava saturado, como ele iria captar atenção? Houve um de que me lembro bem, e nem sei como classificá-lo, que foi uma peça única. Numa segunda feira, ao entrar na Radial Leste, vi um outdoor de fundo branco com os dizeres garrafais: “ELE VEM A!”. Na verdade, foi espalhado por vários pontos da cidade. Na terça, ele não veio, nem na quarta; na quinta, já não tinha mais graça alguma. Mas na segunda feira da outra semana, ele lá estava no outdoor seguinte da série, firme e imponente: era um talco que fulminaria de vez com o chulé.
 A Lei da Cidade Limpa surgiu com intenção de acabar com a poluição visual da cidade, proibindo a publicidade externa como autdoors, painéis em faixadas de prédios, backlights e frontlighs. Além disso, traz a proibição de anúncios publicitários em ônibus, táxis e bicicletas. Essas medidas e outras regulamentações da lei provocaram fervorosos debates na imprensa e em diversos setores da sociedade paulistana à época de sua promulgação e ainda hoje é tema importante e bastante recorrente.
Uma implementação dessa altura gera naturalmente vários descontentamentos. Nem todos que são contrários à lei deixam de ter bons argumentos para criticá-la e, assim, suas razões. O empresário quer anunciar seus produtos, o comprador precisa de ter ciência de tal fato. O empresário para anunciar contrata um agência de publicidade; ambos pagam impostos com essas atividades; precisam ainda de funcionários para levar as tarefas a cabo, gerando emprego para a população; e, por sua vez, o proprietário que cede o espaço para a placa de publicidade ganha também o seu dinheirinho.


Essas razões parecem ser boas e louváveis, mas também há o lado da cidade, de como fica ela em meio a tudo isso? É neste ponto que entra o papel da sociedade e do gestor público. Aí está a questão de ver o que é melhor para a cidade no seu todo. Como fazer a cidade mais limpa, como combater e diminuir a poluição visual e de outras naturezas, como melhorar a qualidade de vida dos que a habitam, que implica em resolver os problemas da cidade. Sem dúvida é uma questão complexa que exige firmeza e compreensão em seu enfrentamento.
Um meio termo são boas alternativas. 


 A administração pública pode combater a poluição visual por outros meios, menos rigorosos. Poderia recorrer a conscientização das pessoas em geral, do empresário. Poderia ainda oferecer incentivos fiscais aos empresários de boas ações. Por outro lado, o empresário poderia anunciar também por outros meios. Há hoje a mídia eletrônica, a internet, as redes sociais, blogs, microblogs, além de torpedos por meio dos quais se pode atingir novos consumidores, inovar em seus meios de comunicação com seus clientes. Além disso, estão aí à disposição os velhos espaços dos classificados dos jornais, das revistas especializadas, o rádio e a televisão.

A cidade de São Paulo é com efeito um microcosmos, um mundo dentro do mundo onde as coisas fervem e borbulham, onde os interesses são vários e diversos. Para isso está a administração pública, com a tarefa de regulamentar, normatizar e ordenar o espaço público, procurando ajustar-se ao bem da vida comum dos munícipes.

Mas a Lei da Cidade Limpa tem uma tarefa árdua, pois, tanto organizações de todos os tipos e tendências, como os populares, possuem um espírito propagador. 

 Quando não se contentam em anunciar verbalmente, como faziam os arautos dos reis antigos, usam os inventos de Gutemberg, isto é, o papel e a tinta, que é mais interessante por ser mais moderno, sobretudo quando combinados com outros meios ou técnicas de imprensa ou de publicidade... Mesmo depois dessa nova regulamentação, tenho saboreado vários anúncios jocosos dos quais lembrarei apenas um. 

Era de um jornalzinho do centro sem boa diagramação onde se dizia ter perdido certa quantia de dinheiro, que não era muito. Sem maiores provas, dava apenas as ruas por onde havia passado no dia em que o perdera. Tinha ido da baixada do Glicério à praça do Patriarca e andado por outras ruas imediatas. Lamento mesmo que tenha andado tanto e não vejo nada de inverossímil em que se perca dinheiro entre tantos milhares e até milhões de transeuntes que se esbarram e até se atropelam na correria do dia-a-dia no centro. O que me parece mais difícil, para dizer pouco, é alguém conseguir achar algum, e, se o achar, ter o tempo suficiente de abaixar para pegá-lo.



Elói Alves é paulistano, estudou Teologia (FATEMOC – 2003), graduou-se em Letras (FFLCH-USP -2007) e licenciou-se em língua vernácula (FE-USP – 2007). Sua produção literária passeia por diversos gêneros (poesia, teatro, crônica, ensaio crítico e diferentes tipos de narrativas ficcionais). No ano 2000, por ocasião dos 500 anos, ganhou seu primeiro prêmio literário com o poema “Oh, meu Brasil” e em 2011 obteve sua última premiação com a crônica “Olhares e passadas pela cidade”, como vencedor do concurso Valeu professor, promovido pela Prefeitura de São Paulo, sendo um dos autores do Livro “Sob o céu da cidade”. É autor do romance As pílulas do Santo Cristo, publicado pela Editora Linear B, em novembro de 2012. Página na internet :

4 comentários

Jane Eyre Uchôa disse...

Como diz o caboco "Quem dera se assim CESSE"" em todas as cidades, não teriamos tanta sujeira e tanta poluição visual. Pessoalmente odeio bagunça, sou extramente organizaa, não presta, não te utilidade jogo fora, meu marido sempre diz que ele precisa ser manter útil senão jogo-o fora também rsrs e é verdade kkkkkkkk. Eu gosto do teu jeito de escrever, como vês as coisas e correlaciona-as, e principalmente como coloca no papel ou no computador. Eu não consigo ler revistas com muitas propagandas ou como muita poluicao visual, perco o interesse. Mas também gosto de figuras, elas quebram um pouco o ritmo da leitura, mas é ncessário saber dosar, agora imagine o que eu sinto quando vejo um monte de anuncios, propagandas, outdoors? realmente é necessário dar um basta, para que possamos enxergar as outras coisas. Parabéns bj

Elisabeth Lorena Alves disse...

Eloi
Lindo texto. Revisitei através dele, nossa São Paulo querida de anos atrás. Lembro-me bem destes anúncios gigantescos, como os garrafais do extinto Mappim, que víamos de longe, mesmo ele ficando expremido entre milhares de prédios. Gostei de seu modo de ver o anúncio da Coca-Cola e claro, como odiava ver a cara dos políticos com aqueles sorrisos maquiados para disfarçar a calhanice!
Lembrei-me daquelas lojas do Centro, tipo a Calçados Sé e a Americanas que abusavam dos anúncios quilométricos para divulgar suas promoções milimétricas. Lembra do Sebastian, da C&A que estampava as paredes da maioria dos prédios do centro?
De fato sou partidária da limpeza feita através da Lei em 2007. Muitos edifícios antigos voltaram a ter suas frentes mostradas ao público. A maioria estava escurecida pelo mofo de serem cobertos diariamente por cartazes enormes. Muito se tem reformado nestes últimos anos e nossa São Paulo querida agradece o carinho de ter de novo espaço para respirar.
Quanto a nós, temos sim nossos olhos mais calmos, não sendo agredidos pelas constantes apresentação de peças comerciais escancaradas pelos cimos dos edifícios.
Parabéns pelo delicioso texto.

ELÓI ALVES disse...

Muitíssimo grato, Jane Uchoa por suas lindas palavras, amiga, sou muito fã também do seu estilo de escrever; vamos ver se um dia tenha uma " lei do Brasil limpo" rs.

ELÓI ALVES disse...

Grato Elisabeth, nossa cidade é muito grande, muitos problemas; vamos escrevendo, vc com suas comparações históricas importantes, dando nossas ideias para ver se a coisa melhora; bjos gratos