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Três [Cinthia Kriemler]

Três

por Cinthia Kriemler


Três vezes. E três era o número de sorte dela.

Na primeira esbarrada, deixaram ambos cair das mãos os livros que tinham acabado de escolher. Ele, na estante de Medicina; ela, na de Artes. Pediram-se desculpas rapidamente e cruzaram os olhares por alguns instantes. Nada de mais naquele par amarronzado de olhos, ela reparou. Mas as mãos, quando se tocaram, provocaram uma sensação gostosa de calor. Hum... O que essas mãos quentes não devem fazer..., viu-se pensando, enquanto seguia para o caixa.

Esbarraram-se de novo na escada rolante. Ela, estacando subitamente antes de pôr o pé no primeiro degrau, tentando achar a chave do carro dentro da bolsa. Ele, sem tempo de frear o corpo, e agarrando-se ao dela para que ambos não caíssem nos degraus.  Respirações suspensas. Ele, rindo do próprio pensamento: Bundinha dura e empinada.... Mais uma vez, desculpas trocadas. Risos trocados. E ela, com certa timidez:

— Eu sempre esqueço que vem gente atrás. 

E a certeza de que nunca tinha dito nada tão idiota!  O olhar malicioso dele, comprovando que a frase tinha sido mesmo infeliz. Ou não...


Da terceira vez, esbarraram no cheiro bom um do outro, ao se apresentarem e trocarem beijos inocentes nas bochechas.
E vieram três meses. Três trepadas numa madrugada. Três dias de lua de mel na praia. Três cachorros — um para cada um dos três filhos.

Três brigas. Três voltas. Três desejos todo fim de ano. Três apartamentos, três empregados, três traições [dela, por ano].
Três balas no peito.
Sobreviveu.

Três é o número de sorte dela.


Cinthia Kriemler - Formada em Comunicação Social/Relações Públicas pela Universidade de Brasília. Especialista em Estratégias de Comunicação, Mobilização e Marketing Social. Começou a escrever em 2007 (para o público), na oficina Desafio dos Escritores, de Marco Antunes. Autora do livro de contos “Para enfim me deitar na minha alma”, projeto aprovado pelo Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal — FAC, e do livro de crônicas “Do todo que me cerca”. Participa de duas coletâneas de poesia e de uma de contos. Membro do Sindicato dos Escritores do Distrito Federal e da Rede de Escritoras Brasileiras — REBRA. Carioca. Mora em Brasília há mais de 40 anos. Uma filha e dois cachorros. Todos muito amados.


Um comentário

cecilia disse...

Como não gostar dos textos dessa extraordinária escritora? Show de texto. Acabou de repente, contrariando toda minha expectativa de um final feliz, que fiquei atônita com a criatividade de Cinthia. Li três vezes e depois mais seis, já que nove é o meu número de sorte. Parabéns, Cinthia.