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Próximos Capítulos [Dy Eiterer]


Próximos Capítulos

Pelos corredores da faculdade agora ela caminhava tranquila. Já olhava com saudade para cada ladrilho do chão, cada descascado da tinta na parede, típico de espaços públicos onde circulam muitas pessoas e há certo descaso com a conservação.

Lembrava com saudade de seus primeiros dias naquele lugar quando se perdia de um andar para o outro, quando os rostos eram todos desconhecidos e só havia dois tipos: os assustadores veteranos e os assustados calouros.

Hoje ela não era nem um nem outro tipo. Hoje ela era só saudade. Hoje ela tinha só um desafio: entender como tinha chegado até ali. Como tinha se tornado uma pessoa que dominava tão bem as palavras. Ao final de seu curso ela entendia muito bem de construções textuais, de literatura, de formação de palavras. Em alguns dias contados teria o título de professora. Dominava a sua língua. Conhecia vocábulos simples, mas sabia alguns complexos, desses que deixam uma frase simples com ares de coisas do outro mundo. Hoje ela se sentia dona. Dona das palavras. Dona da vez. Dona do jogo, da banca, dos livros, do caderno e da caneta.

***
Com ares despreocupados ele caminhava por um prédio qualquer. O fato de já ter extrapolado o seu prazo de formatura não o incomodava. Gostava de estar rodeado por seus livros. Andava sozinho na maioria das vezes, prendendo seus sonhos atrás de lentes finas, antirreflexo, anti espiões e curiosos. A camisa branca já sem alinhamento e puída combinava com o ambiente universitário.

Estava absorto em pensamentos que teimavam a trazer à tona uma certa interferência em uma aula de literatura inglesa do último semestre. Uma moça bancou a especialista em Plath. Ele achou graça na hora. Era uma jovem de ar petulante. Convicta do que gostava e parecia que os poemas de Sylvia Plath estavam na lista top-10.

Poderia descrever os detalhes daquela aula. Descreveria a participação da moça como se fosse um quadro. Conseguiria dar as nuances das cores e sensações com as palavras que conhecia. Tarefa muito difícil para ele, que julgava as palavras poucas para sentimentos humanos. Em sua caminhada ele desejou encontra-la, mas logo riu-se de si mesmo, balançou a cabeça, e espalhou a imagem morena de seus pensamentos desfazendo-a como nuvem.

***

Quiseram as linhas do destino, realizar os caprichos do rapaz e o poema moreno de seus pensamentos ganhou vida no final do corredor que ele percorria. O coque atrapalhado que ela trazia preso com um lápis a deixava deslumbrantemente informal. Ele ensaiou um cumprimento consigo mesmo. Um sorriso.

A dona das palavras passava pelo corredor como quem anda em um parque, sem compromissos. Avistou o rapaz que há tempos pareceu se incomodar com a ideia de ela gostar de poemas ingleses. Ela reparou em como ele caminhava despreocupado e tranquilo e desejou ser como ele. Ser com ele. O coração atrapalhou-se. Ela ensaiou um cumprimento consigo mesma. Um sorriso. 

***
Em um tempo que parecia sem tempo, jovens se cruzaram em um corredor de um prédio qualquer. Se pudessem se traduzir em palavras ele seria o despojado, ela a dona.

Por dentro eles desejavam se falar. Se olhar, se aproximar. Por dentro eles sabiam o que havia de ser feito, mas por fora, tremiam e deixaram-se passar um pelo outro, sem aproveitarem a sutil oportunidade que tiveram de mudar o rumo de seus caminhos.

Os jovens ainda eram muito jovens para saber que estavam segurando as rédeas de suas vidas em uma encruzilhada que não permitiria retorno. Ainda não sabiam perceber os sinais sutis que a vida usa para indicar os caminhos que podemos seguir.

Ele, despreocupado, imaginou que a encontraria novamente e que poderia se valer de Plath para começar a meada de fios que ele desejava unir. Ela, dona de si, não soube ser dona da situação e o viu passar como página de um livro que se folheia na biblioteca para pegar depois e nunca mais o encontra.

Passou-se ali o tempo, a chance, as páginas, os pensamentos, as futuras intenções e tantas histórias que poderiam ter sido vividas e escritas. Ficaram pelo corredor dois personagens que combinariam seus enredos, não fosse a desatenção que os guiou pela mão por atalhos distintos. Passaram-se ali cenas dos próximos capítulos que jamais seriam exibidos.



Dy Eiterer. Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil. Edylane é Edylane desde 20 de novembro de 1984. Não ia ter esse nome, mas sua mãe, na última hora, escreveu desse jeito, com "y", e disse que assim seria. Foi feito. Essa mocinha que ama História, música e poesia hoje tem um príncipe só seu, seu filho Heitor. Ela canta o dia todo, gosta de dançar - dança do ventre - e escreve pra aliviar a alma. Ama a vida e não gosta de nada morno, porque a vida deve ser intensa. Site:Dy Vagando

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