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Um entortador de palavras: Manoel de Barros [Ivana Schäfer]

Um entortador de palavras: Manoel de Barros

Manoel de Barros, popularmente chamado de Nequinho pelos mais íntimos, vem de um estado conhecido pela fauna e flora exuberante, de um Estado que ainda não tinha se dividido. Nasceu em Cuiabá capital de Mato Grosso e mora em Campo Grande capital de Mato grosso do Sul. É, essencialmente, Matogrossense.


Manoel, nequinho, Maneco, vem do chão, do mato, da pedra, dos pássaros, das coisas inúteis , das mentiras que se tornam verdades, da simplicidade, da poesia que encanta, pois ele é um verdadeiro poema.

Quando se fala de Manoel de Barros, lembro logo do passarinho João de Barros, das cantigas de rodas, da infância, do linguajar simples, o poeta que humanizou as paisagens pantaneiras, trouxe um pantanal poético, mas não gosta de ser conhecido com o poeta pantaneiro , acha que isso folcloriza sua poesia.

Com Nequinho nasceu o seu vocabulário manoelês, o gosto pela insignificâncias e pelas inutilidades.

Um entortador de palavras, poeta que tem um abridor de amanhecer na alma e tem orgasmo com as palavras, o menino poeta que voa nas asas  do esconde esconde das palavras, que diz que é adoecido pela poesia, que tem tara mesmo.

Tem o costume de entrar na sua sala para escrever, seu escritório que o chama de “lugar de ser inútil”, entra às 7 horas, e sai ao meio dia, anota coisas em pequenos cadernos de rascunhos. 

Arrumo versos, frases, desenho bonecos. Leio a Bíblia, dicionários, às vezes percorro séculos para descobrir o primeiro esgar de uma palavra. E gosto de ouvir e ler "Vozes da Origem".” 

Não usa computador para escrever, diz que chegou antes dele, usando a mão esquerda possui alguns dedos “adormecidos”, apenas usa o lápis ou caneta bic, pois acha que na ponta do lápis que se dá o nascimento de seus poemas.

Manoel não gosta de dar entrevista, nada de aparecer em público, nada de lançamento, nada de autógrafo, nada de entrevista  em microfone ou telefone, só por carta, avesso as entrevista, avesso a jornalista. 

Diz que o anonimato foi "por minha culpa mesmo. Sou muito orgulhoso, nunca procurei ninguém, nem freqüentei rodas, nem mandei um bilhete. Uma vez pedi emprego a Carlos Drummond de Andrade no Ministério da Educação e ele anotou o meu nome. Estou esperando até hoje", conta Manoel de Barros

"Para o compreender é preciso virar bocó. Ou seja, voltar à infância, desaprender" 

O seu jeito meio tímido, delicadeza, a leveza e a simplicidade ele com certeza herdou do seu lado cuiabano. 

Manoel de Barros só foi reconhecido como um grande poeta depois dos 70 anos de idade, mesmo tendo publicado seu primeiro livro, Poemas concebidos sem pecado, em 1937.

Autor de inúmeras obras poéticas e detentor de importantes premiações culturais (dentre as quais, dois Prêmios Jabutis: 1989 e 2002) e incontáveis homenagens. Sua obra tem sido objeto de teses, ensaios, filmes, peças de teatro e vídeos.

Os livros dele também vendem bem na Europa, onde tem seguidores principalmente em Portugal.

O Ano passado no seu aniversário, ganhou uma poesia de Mia Couto de presente, a pedido da Escritora Goiânia Nara Rúbia Ribeiro.

Imagem: Ana Carolina Conti Cenciani
UM ABRAÇO PARA MANOEL

Dizem que entre nós
há oceanos e terras com peso de distância.
Talvez. Quem sabe de certezas não é o poeta.
O mundo que é nosso
é sempre tão pequeno e tão infindo
que só cabe em olhar de menino.

Contra essa distância
tu me deste uma sabedora desgeografia
e engravidando palavra africana
tornei-me tão vizinho
que ganhei intimidades
com a barriga do teu chão brasileiro.

E é sempre o mesmo chão,
a mesma poeira nos versos,
a mesma peneira separando os grãos,
a mesma infância nos devolvendo a palavra
a mesma palavra devolvendo a infância.

E assim,
sem lonjura,
na mesma água
riscaremos a palavra
que incendeia a nuvem.

(Mia Couto -19/12/2013)

Manoel de Barros não anda nada bem de saúde, tem escrito pouco, mas continua produzindo.

Sinto nequinho como uma vela que vai se apagando, e ele diz:

“O que eu queria era fazer brinquedos com as palavras. 
Fazer coisas desúteis”. Todos morrerão, o poeta morrerá.

Mas a poesia, ah! Essa tem parte com Deus. Sobreviverá aos tempos, aos desenganos, às doenças, aos limites físicos, á impossibilidade humana. 

O menino poeta, com seu sorriso encantador, que produz e transforma imagens, que traz a nossa doce infância em uma brincadeira de esconde esconde com as palavras, a nossa doce liberdade do mato, que dá asas para voar na imaginação tanto  da criança como no adulto, uma verdade que grita em cada um de nós. O Pantanal é o cenário dessa poesia, berço do poeta, que fala do homem contemporâneo através do pantaneiro.


“A poesia está guardada nas palavras – é tudo que eu sei.
Meu fado é o de não saber quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não tenho conexões com a realidade.
Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado.
Sou fraco para elogios.”
(Tratado geral das grandezas do ínfimo, Manoel de Barros)
 

"Me acostumei com o silêncio. Eu sou conformado como um sapo."


“Que as minhas palavras não caiam de louvamentos à exuberância do Pantanal. Que eu não descambe para o adjetival. Que o meu texto seja amparado de substantivos. Substantivos verbais. Quisera apenas dar sentido literário aos pássaros, ao sol, às águas e aos seres. Quisera humanizar de mim as paisagens. Mas por que aceitei o desafio de glosar esta obra exuberante de Deus? Aceitei para botar em prova minha linguagem. Que eu possa cumprir esta tarefa sem que o meu texto seja engolido pelo cenário.”


Manoel de Barros é um dos maiores expoentes da poesia nacional, e é o poeta que mais vende no Brasil. Mesmo sendo um dos maiores poetas contemporâneos vivo , e talvez o mais lido também, ainda muito poucos brasileiros e alguns poetas e escritores conhecem a obra deste escritor Matogrossense. Como cuiabana, gostaria muito de ver os poemas do Nequinho nas escolas, passeando por salas de aulas e bibliotecas, propiciando  o encontro dos jovens com esse grande escritor.
Termino este post emocionada, com a alma leve, pois sei que sua poesia será sempre referência para jovens e adultos e espero, sinceramente, que apesar de sua saúde um pouco debilitada, que a sua chama nunca se apague, que sua  poesia possa voar ainda mais alto, aterrisse nas escolas e faça ninhos no coração das crianças, dos  jovens e dos adultos.


Deixo com vocês um dos poemas que mais  gosto do Manoel, se bem que   amo todos, mas esse me toca muito: 

O Menino que Carregava Água na Peneira 
(Manoel de Barros)

Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino
que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira
era o mesmo que roubar um vento e
sair correndo com ele para mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo
que catar espinhos na água.
O mesmo que criar peixes no bolso.
O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces
de uma casa sobre orvalhos.
A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio, do que do cheio.
Falava que vazios são maiores e até infinitos.
Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito,
porque gostava de carregar água na peneira.
Com o tempo descobriu que
escrever seria o mesmo
que carregar água na peneira.
No escrever o menino viu
que era capaz de ser noviça,
monge ou mendigo ao mesmo tempo.
O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor.
A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou: Meu filho você vai ser poeta!
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher os vazios
com as suas peraltagens,
e algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos! 

Quer saber um pouquinho mais sobre esse grande escritor clique no link:  Manoel de Barros 

Fonte:
Revista Biografia
Jornalista Bosco Martins 
Folha de S.Paulo
Linhas Livres

Ivana Schäfer - Pedagoga com Habilitação em Orientação Educacional, Especialização em Psicopedagogia e Cerimonialista. Sou Cuiabana de "tchapa e  cruz", amo minha terra, meu povo e a nossa cultura. Sou do Mato ....de Mato Grosso. Página na internet:
http://espiacuyaba.blogspot.com.br/

2 comentários

Unknown disse...

Excelente. Só é uma pena que use como capa a arte exclusiva de outro de outro blog (www.contioutra.com), coloque o poema postado lá e nem se lembre de informar a fonte.

Revista Biografia disse...

Olá CONTI outra, artes e afins., a imagem presente na matéria, foi pesquisada no google imagens e onde estava a fonte não estava citada. Vamos corrigir isso agora mesmo e peço desculpa pelo transtorno causado, não era nossa intenção. Agrademos o comentário postado na matéria e nos colocamos a disposição para qualquer esclarecimento.
Atenciosamente. Ivana Schafer e Revista Biografia.