Viver plenamente.
Me toma agora a
compreensão de que não se pode viver pela consciência. A via primeira pela qual
conhecemos as coisas imediatamente, pelo que as coisas nos tocam e nos falam de
sua existência. É preciso deixar as coisas penetrar-nos dentro de nós para além
da superficial camada primeira que nos cobre: a consciência - essa camada tão
superficial e externa, que precede mesmo a camada mais superficial do nosso
próprio corpo, a pele.
Viver pela moral, a ética
da consciência, parece-me uma forma de vida vegetativa em que vive-se na
superfície da vida, sem conhecê-la profundamente e deixar-se penetrar por ela,
sem tocar o âmago das coisas, a sua camada mais profunda e sensível, sem
conhecer a essência das coisas. A única forma verdadeira de vida é a vida
sensível e a única realidade da vida verdadeira são as sensações que as coisas
nos fazem sentir ao tocarmos a sua essência.
Às vezes, quando estou
doente, com dores, penso que devia cair na real, parar de sonhar, de fingir que
não devia viver como uma pessoa enferma que sou, viver de acordo com o que se é
bom e é certo, dizem. Mas a vida me ensinou a pensar errado, a agir errado, a
ser alheia a tudo e todos, porque convém, porque pelo que sou, pelo que tenho
vivido, quase nada do que dizem que é certo parece certo, quase nada do que se
impõe como justo parece bom. Porque quase tudo que dizem ser certo e justo e
bom é alheio à mim e, se cada um pensar sobre isso, verá que é alheio a si
também e à todos nós, na verdade.
Isto pode parecer
filosofia barata de auto-ajuda e idealismos utópicos de rebelde sem-causa ou
coisa semelhante, mas é uma verdade prática cotidiana. Viver é quase sempre um
cansaço exaustivo em momentos de dor e moléstia. Mas a vida tem me ensinado que
se pode viver para além daquilo do que o que se é, que o sonho, o querer-ser, a
fantasia também é o que somos.
Eu vivo pelos meus sonhos,
pelos meus interesses, pelas minhas sensações, pois são para mim a única
realidade sensível, aprazível que posso experimentar plenamente, com tudo
aquilo que tenho sido. Porque o mundo não é capaz de compreender o que cada
pessoa tem de individual, de seu só, eu vivo errante, alheia ao mundo. E isto
me parece certo e bom, porque só assim é que consigo viver plenamente.
Janne Alves de Souza - Publicitária,
bacharela em Comunicação Social: Publicidade e Propaganda pela PUC-SP.
Pesquisadora intercambista no Curso de Licenciatura em História da Arte
da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (Portugal) com bolsa do
Programa Fórmula Santander de Mobilidade Estudantil. Artista plástica,
desenhista e fotógrafa amadora. Escreve para o site Obvious Lounge no
blog: Megalomaníaca (http://lounge.obviousmag.org/megalomaniaca).
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Um comentário
Lindo, belo texto " Viver plenamente." Escrito com a beleza da alma...Mas nem se preocupe com estado vegetativo a que se refere...Viver pela moral, ética, temos obrigação o que é importante, é consertar o que acha errado... devemos fazer isto. Escrever, passar para o papel nossa sabedoria...Excelente seu texto, maravilhoso.
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