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Não é mais preciso navegar...Neologismar, sim! [Erika Jane Ribeiro (Pók Ribeiro) ]

Não é mais preciso navegar...Neologismar, sim!

Não admitia a existência real do amor. Durante toda a vida, ele não passara de um substantivo mais que abstrato. Não se tratava de oposicionismo prosaico, mas é que o amor lhe parecia demais grileiro, e, seu íntimo estava mais para as revoluções que para os latifúndios. 

Por anos a fio, vivera sem o amor; ele não lhe faltava. Em suas caixas coloridas e gavetas em ordem, não havia espaço para o amor. Nos mapas de fuga, espaço além, também não havia lugar para ele. Sua mochila era extremamente compacta.  Até seus versos, néctar mais puro daquela alma menina, não conheciam o amor; dele nada diziam.

Fora num encontro orquestrado pelas gotas estelares que os olhos esbarraram-se,  comeram-se em um ritual sacro de anjos libertinos. E de lá, despontara em espiral o mais extraordinário neologismo, quem nem Guimarães Rosa ousara criar. 

Agora, neologismava como quem, pela primeira vez, bebe o sal do mar e nos olhos, não se sabe se arde ou descortina; e na boca, não sabe se sufoca ou gargalha. Neologismava numa grandeza de pássaro que voa sem roteiro e, quando quer, volta. Seu neologismo agigantava, à medida que o suor lhe aguava, e, as mãos entrelaçadas, farfalhavam-lhe sua terra.

Neologismava tanto, que até transmutara-se. Fizera um puxadinho para abrigar aqueles que escoltavam o neologismo. Já não falava; havia riso em excesso nos cantos de sua boca e eles adormeciam as palavras. Já não dormia; os sonhos lhe arrastavam a todo instante e, neles, o neologismo alastrara-se. 

De tanto neologismar, perdeu o tato com as palavras,  perdia-se pelas ruas, perdia a chave do sótão onde adormeciam, engasgava-as...Aí descobriu que neologismar lhe bastava.


Erika Jane Ribeiro (Pók Ribeiro). Poeta, cronista, professora de Língua Portuguesa, oficineira, articuladora textual com adolescentes e blogueira. Natural da cidade de Uauá – Bahia, terra iluminada pelos vagalumes e com forte veia cultural, foi acolhida pelo Rio São Francisco desde os idos de 2000 quando iniciou o curso de Licenciatura em Letras pela UPE/FFPP em Petrolina - PE. Já em 2010, concluiu o curso de Direito pela UNEB em Juazeiro – BA e, em 2012, especializou-se em Direito Penal e Processo Penal. Amante da literatura desde sempre, começou a escrever poemas por volta dos 12 anos. Em 2007 lançou, numa produção independente, o livro de poemas “Noites e Vagalumes”. Atualmente, além de poemas, escreve crônicas, memórias literárias e arrisca-se em composições musicais, em parceria com amigos músicos. Página na internet: Vagalumes, poesia e vida

2 comentários

Lua disse...

Texto formidável!

Aury disse...

Até neologismos faltaram... Simplesmente perfeito!