Sérgio Gerônimo - [Poeta Brasileiro]
Mergulho no povo a cem p/h
como se procurasse uma palavra
em um dicionário ambulante
quisera ter tentáculos que tentassem
plugar/conectar uma alma
um livro vivo
mas, súbito, vejo a ponte
o vão central – boca aberta
da baía cheia de gente da guanabara
linhas suponho e as ponho
acima onde duas gaivotas
copulam exaustivamente
em pautas simétricas
e gloria gaynor sussura
under my skin em ondas
armazéns atracados são pontos
de exclamação de indignação
em um cais-do-porto enferrujado
de mastros maestros do caos
tudo é mangue à míngua
folhas amassadas de um ditado
sem leitura silenciosa
extra extra!
a poesia procura um sonetango
que justifique tal desafinação
entre o dizer e o fazer
a ética mofa ao lado do código
de honra? da vinci?
civil
sim vil
livros esquecidos sim
mas, súbito, vejo a ponte
o vão central – boca aberta
da baía cheia de gente da guanabara
o que resta é pular?
a cem p/h
rasgo as águas
bêbado e exausto
aprecio o êxtase aéreo
das minhas gaivotas
meu peixe no bagaço
e a rua? infindável mistério
da perspectiva
mary columbus
(você sabe, eu sou do méier!)
Sérgio Gerônimo
a estação ferroviária do méier ainda dormia
quando maria colombina
do alto de seus um metro e oitenta
mais dez de tamanco gritou
berrou lá de cima da ponte
ontem fui rainha
ontem fui rainha
naquela madrugada de cinzas
maria colombina olhos encerados
rímel des-ri-ti-ma-do
serpentinou umas cervas
e como fetiche repartiu-se
em confetes para gregos e gregórios
ontem fui rainha
ontem fui rainha
do meio da praça com duas lâmpadas bêbadas
o coreto bocejou e praguejou um coco de pombo
no tombo pela escadaria degraus abaixo
daquele monumento mais do que carnalvalesco
e vejam só a alça do tubinho apertadinho
esticado silicone fio-de-aço
não aguentou o amasso
e mostrou todo aquele corpinho passista
ora, ora, qual o quê!
mary columbus para os gringos
ajeitou os brincos de estrasse
rodopiou numa ginga capoeira
e se foi pela rua dias da cruz
ontem eu fui rainha
ontem eu fui rainha
um bonde parado no tempo a tudo assistia
e joão nogueira cantava:
“você sabe, eu sou do méier...”
Campo minado
o som deslizou pela pele
cantou três orações em mantra
de uma tecnomissa orgânica
ele estava sendo observado
estranhos corpos desnudos
em movimentos malabaristas
intimidadores desmaios
respiração arqueada
inventei flechas assassinas
atirando em sombras e desvios
houve outro som...
disparei intenções
perseguindo silhuetas e vontades
explodi inseguranças
demarquei limites
ciúmes e invejas
sem tato
rastejando tristezas
por entre armadilhas
e origames falsos
plantei o aviso
meu território é campo minado
poemanocio
poemanocio
pronuncio assim:
o poema não me é fiel
na madrugada de sons abafados
palavras disputam palavras
torrentes de fonemas reticentes
rasgo folhas, respiro letras
reescrevo o texto
(ele nunca será meu)
sinto falta dele (o anterior)
mas...
meu poema tem pernas – ventosas
sugam ouvidos incautos
e nem se dá conta
que nas sombras dos momentos
(longe da minha escrita)
sua alma pode me corromper
rapidamente amasso o rascunho
eu permito tudo
ele se entrega
que os leitores se deleitem
com os comos e porquês sugeridos
quantos mais possuí-lo
melhor
que seja sempre essa a leitura
permissível a todos
a fidelidade dele está em sua página imaculada
nem sempre branda a minha é inventá-lo
somos leais e cúmplices do nosso destino
ele: vagar em prateleiras e mãos
eu: paternidade de versos
de pretensa maneira
poeiras
em total esquecimento
Sérgio Gerônimo
Todos os Direitos Autorais Reservados ao Autor
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