Crowdfunding para livros
Depois de ser convidada a apoiar uma peça de teatro na
qual atua uma amiga, e de comprar o CD do Vitor Ramil sobre o qual comentei no
finalzinho desse post, decidi entender a dinâmica desses portais que captam
recursos via web para entender se e o quanto eram aproveitados em projetos na
área de literatura. Então, resolvi avaliar os tipos de projetos cadastrados e
as estratégias utilizadas pelos que pleiteam recurso para viabilizar suas
publicações, seja em formato impresso, e-book ou ambos. O crowdfunding ainda é
algo relativamente novo, mas vem crescendo no Brasil e tem sido bastante
procurado por artistas independentes (mas com bom planejamento e em geral com
boas equipes trabalhando junto) para viabilizar diferentes atividades
culturais, inclusive para a publicação, mas o crowdfunding para livros ainda
parece estar engatinhando.
Segundo o Estadão, em 2012, plataformas de crowdfunding
cresceram 85% e arrecadaram US$ 1,4 bilhão no mundo, viabilizando desde
projetos de produção de hardware a eventos e produtos culturais. No Brasil, o
crowdfunding se consolidou principalmente como um modelo de apoio a projetos
culturais e o serviço mais utilizado é o Catarse, que cobra uma taxa de 13% do
total arrecadado, caso a meta de arrecadação seja atingida. Em geral esses
sites funcionam de modo similar, variando apenas as taxas cobradas e o período
que o projeto pode ficar no ar para arrecadação. Quando o projeto não consegue
o total previsto, não leva nada e a grana é devolvida aos apoiadores (que são
convidados a escolher outro projeto a apoiar).
Analisando o cenário no Catarse, até o momento de
concluir esse artigo (05/08/13) encontrei 67 projetos na categoria literatura.
Dentre os que já encerraram o período de arrecadação (60 dias) 37 não obtiveram
sucesso. Desde 2011, 23 projetos envolvendo literatura conseguiram levantar o
dinheiro suficiente (ou mais, em alguns casos) para sua empreitada de publicação através do
Catarse. É um percentual baixo se compararmos com outros tipos de projeto como
gravação de CD´s ou realização de peças teatrais.
Tentando entender as possíveis diferenças entre os
projetos aprovados e os não financiados, creio ter identificado alguns aspectos
comuns a cada grupo. Dos não financiados, muitos parecem ter sido cadastrados
no site sem o devido planejamento, com descrições incompletadas do projeto e
aparentemente sem um plano de divulgação (há alguns que não obtiveram nenhum
apoio!); diversos pleiteiam um valor muito baixo, que pode estar associado ao
desconhecimento do custo total envolvido num projeto bem elaborado de
publicação e mesmo das taxas cobradas pelo Catarse. Absolutamente todos os
projetos não apoiados ficaram muito longe da meta, ou seja, não é que tenha
faltado pouco apoio para chegar lá, senão que quase nenhum apoio foi
efetivamente angariado (nenhum conseguiu mais de 29% da meta, sendo que a maioria
ficou entre o 0 e o 5%).
Os projetos que foram apoiados (ou estão perto de
atingir a meta) tem em comum uma descrição mais detalhada ou bem cuidada do
projeto (incluindo especificação de como o recurso será empregado) e costumam
ter “recompensas” simpáticas para os apoiadores, como brindes exclusivos,
personalização de exemplares e os que analisei com mais cuidado foram projetos
encaminhados por gente que já tem alguma estrada na área, mesmo que seja apenas
na blogosfera, como o Beto Pacheco e a Izadora Pimenta, por exemplo. Também se
percebe que os projetos apoiados pediram mais dinheiro, e contam na descrição
como esse dinheiro será usado. Ficam as dicas, então.
Também notei que, dos 23 projetos que conseguiram
arrecadar o valor previsto, somente três possuíam versão e-book ou previam este
formato como parte do projeto. Esquecimento, desinteresse? Confesso que
esperava mais.
No site começa.aki (não descobri qual taxa cobram
porque tive preguiça de fazer o cadastro e a informação não está clara e
acesível no site), havia apenas um
projeto envolvendo publicação e ele arrecação somente 3% do planejado. Talvez o
proponente tenha deixado de lado alguma das dicas que o próprio site dá sobre
os passos básicos para ter sucesso numa campanha de financiamento coletivo.
O site Juntos.com.vc, que não cobra taxa de
administração porque capta recursos para se manter, é mais voltado para financiamento
coletivo de projetos de cunho social. Quando visitei o site não encontrei
nenhum projeto relacionado com literatura na categoria Arte & Cultura.
O Zarpante (taxa de 7%) é português mas seu foco é o
mundo lusófono. De qualquer modo, só encontrei lá 2 projetos um apoiado
(infantil) e outro em fase de captação (religioso), ambos do Brasil, focados em
versões impressas. No kickstarter (em inglês, mas com vários projetos
brasileiros) havia projetos para publicação bem sucedidos nos EUA e Canada, mas
não no Brasil.
Assim, depois de
passar pelos mais populares sites de crowdfunding fiquei com algumas dúvidas
que elenco abaixo para suscitar discussão:
Será que os
autores independentes ainda não descobriram essa possibilidade de viabilizar
publicações?
Os apoiadores
mais dispostos nesses sites de crowdfunding não gostam de ler?
Os autores
tem dinheiro suficiente para bancar suas publicações e por isso não recorrem ao
financiamento coletivo?
Os autores
desconhecem todos os custos envolvidos numa publicação bem cuidada (revisão,
leitura crítica, preparação de originais, produção do e-book e da versão
impressa, impressão, lançamento, divulgação)?
Os leitores
não consomem publicações independentes e, sabendo disso, os autores nem tentam
o crowdfunding?
Sou eu que
estou viajando sobre o financiamento coletivo como forma de alavancar
publicações independentes mas que incluem as etapas fundamentais para uma
edição de qualidade?
E então, quem apresenta outras visões a respeito?
Maurem
Kayna é engenheira florestal, baila flamenco e se interessa por literatura
desde criança. Depois de publicações em coletâneas, revistas e portais de
literatura na web resolveu apostar na publicação em e-book e começou a se
interessar por tudo que orbita o tema, por acreditar que essa forma de
publicação pode ser uma das chances de aumentar o número de leitores no Brasil.
Autora da coletânea de contos Pedaços de Possibilidade, viabilizado pela
iniciativa da Simplíssimo. Sites: mauremkayna@uol.com.br
- mauremkayna.com/ - twitter.com/mauremk
Assinar:
Postar comentários
(
Atom
)
Nenhum comentário
Postar um comentário