NALDO VELHO. Poeta, músico (compositor) e artista plástico, com formação na área de administração, atualmente aposentado e dedicando-se inteiramente à sua realização como artista, teve como principais influências literárias no que se refere à poesia: Manoel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e Vinicius de Moraes; despertado para o prazer da leitura bem jovem ainda por Monteiro Lobato, prazer este aprofundado na adolescência por Hermann Hesse, de quem adquiriu o gosto pela linguagem povoada de imagens e metáforas, e a paixão pela espiritualidade em sua escrita.
Além das diversas participações em antologias, tem dois livros individuais publicados: o “Mania de Colecionado” e “A Dança do Tempo” recentemente lançado, e com um terceiro livro em fase de revisão para publicação em 2012, o “Asas Que Tenho Por Dentro”.
Blogs do Naldo Velho
http://naldovelhopoemas.blogspot.com/
POESIAS QUE FIZERAM PARTE DAS GRAVAÇÕES
Coisas esquecidas por seus donos
Sei de gente que anda pela vida
catando coisas esquecidas pela pressa.
Coisas entristecidas, abandonadas por seus donos.
Outro dia um recolheu um monte assim de saudade,
limpou tudo com carinho e guardou numa sacola.
Fico aqui pensando no uso que ele há de dar.
Esta gente cata de tudo um tanto
e anda com as costas curvadas
pelo peso das coisas entristecidas.
Faz tempo perguntei a um deles
o destino que ele dava ao que catava,
qual sua serventia?
Ele abriu sua sacola e falou emocionado
das coisas e dos seus significados.
Senti inveja desta gente
que vive de transmutar coisas entristecidas,
fazendo-as crer que há quem cuide delas.
Agora a pouco achei numa esquina
uma quantidade enorme de nostalgia.
Limpei com carinho e guardei em minha sacola.
Logo mais a noite vou tentar
dar brilho aos seus significados...
Tomara Deus eu tenha conseguido compreender.
Lua desgovernada
Lua desgovernada
nas trilhas da imensidão,
tomou torneis de aguardente,
tropeçou numa estrela cadente,
mergulhou num oceano de escolhas,
soçobrou numa praia deserta,
naufraga de suas ilusões.
Lua desgovernada
saiu perambulando pela cidade,
refugiou-se numa casa suspeita,
ficou amiga de uma mulher da vida,
fumou um baseado e meio,
trepou com o bordel inteiro
e adormeceu seu coração.
Lua desgovernada
não quer mais iluminar minhas noites,
cansou da nostalgia do poeta
e virou mulher de vida incerta.
E tome mais aguardente
que a noite vai ser de saudade...
Quando olho de minha janela
vejo a dor lá no céu e me calo.
Contrição
Rosários de palavras?
É isto o que eu procuro!
Enfiadas de versos
a demonstrar contrição.
Assim é o meu confessionário.
E a cada metáfora uma transgressão,
e a cada poema uma penitência.
Haja pecado!
E aí: começar tudo outra vez.
No altar, meus santos
não conseguem esconder a contrariedade.
Às vezes até eu fico envergonhado!
A carne ainda é fraca, a sede também.
Uma heresia aqui, uma escorregada ali,
uma tentação acolá.
Haja poemas!
O padre disse que o significado dos meus versos
é o da busca pelo perdão.
Coleciono rosários, palavras, poemas,
pecados, penitências, permissividades, absolvições.
Vida de poeta que gosta
de caminhar por entre escombros.
Coisas que sobraram do incêndio
Há um quê de delicadeza
nas coisas que sobraram do incêndio.
Vestígios de sonhos misturados a destroços..
Madeira, reboco, papeis, muitos panos.
Pela casa aos pedaços eu recordo a história
de um amontoado de livros, parte deles queimados.
Há um quê de suavidade
nas cinzas que sobraram pelos cômodos.
Luz do sol, fumaça, vidraças quebradas,
e ainda assim, eu percebo os detalhes.
Portas arrombadas denunciam o desastre,
no ar um cheiro de demolição.
Há um quê de poesia
em pode sentar num canto e apreciar os estragos.
Há um quê de magia
em poder renascer dos escombros.
Curriculum Vitae
Tenho mestrado em inquietude
com tese defendida nas esquinas desta vida,
pós-graduado em bares que funcionem
no intestino da cidade,
em vez por outra tropeçar e cair da merda do meio-fio,
em dormir bêbado em recantos que sejam sombrios,
em buscar em meio aos escombros
versos que causem arrepio,
em poeira de estrela colhida em noites desertas,
em colos que sejam molhados de orvalho,
em mulher enluarada que saiba sussurrar meu nome
e em ser viciado em veneno ardido da madrugada.
Tenho também doutorado em coisas mal resolvidas,
em caminhar aos tropeços pela beira do abismo,
em palavras fazedeiras espinhosas de umbigo,
em buscar significados que ninguém mais queira,
em cometer sacrilégios toda vez que eu penso,
em destruir muralhas que me impeçam o acesso,
em alongar horizontes quando ouso um sonho,
em desafiar o destino sempre que me proponho
em manter as janelas que eu tenho sempre abertas,
em cultivar em meu peito a palavra libertação.
Texto manifesto sobre a poesia
Naldo, por que poesia?
Porque a poesia humaniza a nossa trajetória, aumentando nossa percepção, depurando nossa sensibilidade e desenvolvendo a nossa capacidade de reflexão. E são estas coisas que nos possibilitam vivenciar infinitos matizes para uma mesma cor e nos permite saborear estas nuances.
A poesia abre para o ser humano a existência em toda a sua amplitude e o faz capaz de viajar através do imaginário das coisas que ainda não existem, fazendo com que seja possível trazê-las a realidade. A poesia transforma as pessoas, levando-as a evolução.
E é através da poesia que aprendemos a perceber o mundo pela ótica do coletivo, fazendo com que os nossos pensamentos consigam viajar livres do aprisionamento dos nossos limitados umbigos, fazendo-os promíscuos de muitos umbigos, tornando-nos mais receptivos ao diferente: brancos, negros, amarelos, índios, mulatos, mestiços de todas as espécies; homens e mulheres de qualquer opção sexual que possa existir, e não importa o credo, ou a convicção política; gordos, magros, baixos, altos, qualquer que seja a forma que o ser humano possa se apresentar, na realidade: passageiros de um mesmo barco, com defeitos e qualidades, com virtudes e fraquezas, seres semelhantes em suas infinitas possibilidades.
Se a poesia no mundo moderno fosse mais fomentada, e o meu sonho é que tal coisa aconteça a partir dos primeiros passos das pessoas, passando por todos os níveis de educação, sejam eles formais ou não; o nosso convívio seria fundamentado na compreensão e por conseqüência, bem mais fraterno, o que certamente diminuiria sensivelmente a discriminação, o constrangimento imposto ao diferente e a insensibilidade à injustiça social que hoje existe.
Por isto a poesia! Porque a cada poema eu me reinvento, eu me aprimoro, eu me transformo numa pessoa melhor, aumentando a minha capacidade de compreender.
Naldo Velho
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2 comentários
O que é ser poeta? Parafraseando você Naldo Velho
Porque a cada poema eu me reinvento, eu me aprimoro, eu me transformo numa pessoa melhor, aumentando a minha capacidade de compreender.
o mundo e os diversos corações que nele há. Parabéns e sucesso.Bjs Luciana Saldanha Lima
Seus versos atravessaram meu ser me perdi e me refiz em cada palavra...Quanta poesia em cada palavra...
amei, parabéns!
www.preteritosmatinais.blogspot.com
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