Nino Cais [Artista Plástico Brasileiro]
2001 Bacharelado, Artes Plásticas - FASM Faculdade Santa Marcelina
Palestras
2010 Oficina de Colagem - Projeto Zig Zag - MAM SP
2009 Prêmio Aquisitivo - 15º Salão da Bahia
As fotos expostas na coletiva do Centro Cultural São Paulo mostram partes do corpo do artista, que aparecem pressionando louças de porcelana contra a parede ou o chão. Ao desdenhar do perigo da louça se quebrar, o artista se coloca como uma criança. Ele ignora os riscos de sua atitude cedendo a uma intensa vontade de experimentar e conhecer o mundo pelo contato sensível direto com as coisas que o cercam. Já no início da psicanálise, Freud descreveu o polimorfismo sexual das crianças. Ele fala que, nos primeiros anos de vida, o indivíduo encontra prazer no próprio corpo. É só com o desenvolvimento da sexualidade que se chega à maturidade, quando finalmente o objeto de desejo não está mais no próprio corpo, mas em um objeto externo: o outro. A investigação de Nino pára antes disso. Não há outro em seu trabalho; há apenas o artista e, às vezes, seu próprio reflexo.
Os objetos escolhidos pelo artista são parte do universo doméstico. Utensílios de cozinha como panelas, xícaras e bules de ágata, que a memória de Nino associa à figura da avó. Escovas, colheres de pau, espátulas. Ferramentas para pequenos reparos domésticos. A costura é um outro elemento recorrente, é a forma pela qual os diferentes objetos se ligam entre si e com o artista. Nino aprendeu a costurar observando sua mãe trabalhar em casa.
No vídeo que fez para a presente exposição individual no CCSP, o artista aparece vestindo uma camisa feita por ele da qual saem longas faixas de tecido. Diversos objetos desse universo doméstico, então, são embrulhados em um tecido branco e amarrados junto a seu corpo. Aos poucos, o corpo ágil e magro de Nino tem seus movimentos truncados. O artista constrói para si uma espécie de escudo que o protege do mundo externo ao mesmo tempo em que atrapalha sua mobilidade. O acúmulo de objetos dos quais o artista não quer se afastar traz a lembrança de Arthur Bispo do Rosário, artista que passou vinte anos internado num hospital psiquiátrico. Bispo juntava objetos que esperava levar consigo no dia de sua “apresentação” a Deus. A fantasia que Nino dá forma nessa obra é a vontade de levar consigo, ter sempre presente, as pessoas que gosta, suas memórias, suas escolhas, aquilo que, enfim, constitui sua interioridade. Mas a obra transparece melancolicamente – pois a forma capenga do artista carregado de objetos já anuncia um fracasso – a impossibilidade de se fixar uma interioridade imutável, eterna e solitária."
O paulista Nino Cais esta entre os 110 artistas brasileiros e estrangeiros convidados para a 30ª Bienal de São Paulo.
O Nino e eu nos conhecemos no ano passado, em um projeto no Paço das Artes chamado Ocupação. Ele foi lá ocupar o espaço levando uma máquina de costura, desenhos e croquis de uma curiosa camisa que ele estava construindo para amarrar objetos da sua memória afetiva ao corpo. Eu fui lá acompanhar quase que diariamente o evento como crítica do Paço das Artes, para ir produzindo textos processuais, como era o trabalho dos artistas no evento. Naquela ocasião, escrevi este pequeno trecho a respeito da participação do Nino:
O happening que ninguém vê, do rapaz tímido que não quer se expor mas que se obriga a tanto porque é como as coisas funcionam. o pequeno príncipe dono de seu reinado de xícaras, pires, bules e outros utensílios carregados de afeto, de afetividade, de transitividade, de trânsito.
Trânsito das sensações que (quase) todo mundo lembra da casa da avó, a maneira como o bule da avó nos faz sentir, o cheiro do café com biscoitos. o reinado da promessa de uma existência segura. o reino da proteção.
Então, para proteger o legado do pires, o pequeno príncipe o embrulha em tecido branco e imaculado e o amarra a um suporte onde também são amarrados outros afetos embrulhados e a força de um nó somado à força do outro e do outro torna este invólucro quase indevassável, um abrigo nuclear.
E o suporte (o abrigo) para onde tudo converge é o corpo franzino do rapaz tímido.
Este ano nós nos aproximamos mais e trocamos muita idéia, participamos de projetos juntos, e a empatia foi tanta e as conversas tão ricas que arrisco dizer que nos tornamos amigos. É importante contar tudo isto antes de começar a escrever sobre a exposição individual dele na galeria Virgilio porque eu gostaria de partir, neste texto crítico, de uma confissão: tanto o Nino quanto eu sofremos uma perda este ano, perdas de natureza diversa, mas, todavia, perdas doídas, destas que deixam um vazio irreversível.
O motivo porque preciso contar isto é que foi ao lamentarmos nossas perdas um ao outro, e não ao discutirmos o trabalho que ele iria expor na galeria, que eu pude vislumbrar o sentido mais profundo de sua produção artística. A obra do Nino trata de perda, sua obra é constituída de líricas tentativas de reter e fixar o efêmero, tentativas estas fadadas ao fracasso, claro, porque há coisas que não se podem reter e perdas que não há como remediar. Mas na melancolia deste "fracasso" reside a potência dos trabalhos de Nino Cais.
Logo na entrada da exposição, vemos uma faceta menos conhecida de sua obra: os desenhos, que antes serviam como croquis para as fotografias, ganham autonomia e são expostos lado a lado com desenhos de pássaros feitos pela mãe do artista, Rita Cais. Por um lado, Nino vai buscar nas origens familiares, no avô artesão que fabricava tachos, colheres e bonecos, na avó que bordava e fazia rendas, na mãe que o ensinou a costurar a gênese de sua trajetória artística, ao mesmo tempo em que, apresentando desenhos seus em que um corpo aparece dotado de asas junto aos desenhos da mãe, ele configura um nó simbólico que amarra os sonhos de ambos.
"A gente não tem medo de morrer", afirma o artista, "a gente tem medo de perder os laços, os nós que nos ligam afetivamente aos outros". No vídeo que "encerra" a exposição, vemos Nino Cais segurando com o corpo vários objetos frágeis que, quando chegam ao limite suas forças de mantê-los fixos e, assim, protegê-los, despedaçam-se no chão. Esse vídeo, assim como a imagem impactante da instalação principal da mostra, em que uma dança das cadeiras impossível nos mantém suspensos, prendendo o ar diante da fragilidade da situação, colocam em xeque o "medo de perder os laços".
Essa vontade de flutuar que todo o conjunto da exposição sugere é uma metáfora da permanência dos laços: sim, os objetos da memória afetiva se quebram, as nossas forças nunca são suficientes para proteger aquilo que amamos, a morte irrompe sem aviso prévio, mas os nós são perenes, e os vôos da imaginação artística e os sonhos aí estão para nos reafirmar esta única certeza.
Arte Virgilio by Nino Cais
Nino Cais
Maiastra - instalação - 2006
fotografia
Maiastra - instalação - 2006
fotografia
Sem título - 1.10 x 85 cm - 2009
fotografia
Sem título - 60 x 90 cm - 2007
nanquim sobre papel
Sem título (instalação) - dimensão variável - 2008
madeira e utensílios de plástico
Outro tema recorrente nesse tipo de trabalho é, como na fotografia, a interação pessoa-objeto. Esta se dá pela substituição ou cobertura de uma parte do corpo humano (geralmente a cabeça) por um recorte de um objeto.
Contato
Fonte:
Nino Cais
galeriavirgilio
revistacontemporartes
istoe.com
Nino Cais
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