Memórias de um pequeno
paulistano
Quando eu era menino, pelos treze e quatorze anos,
e trabalhava de office boy no centro de São Paulo, deparava-me todos os dias
com vários petistas vendendo “estrelinhas” vermelhas e pregando pela praça
Ramos de Azevedo, em concorrência com os camelôs e religiosos, ou pela
praça da Sé - palco de toda efervescência no cotidiano citadino - que os
“brasileiros não tinham memória”, pois votavam nos velhos políticos e não
neles. Não sei se estou doente ou não sou brasileiro, mas lembrei-me disso há
pouco ao ler a “Carta aberta aos brasileiros” redigida por José Genuino,
ex-presidente do PT na qual diz que o Supremo Tribunal Federal “cometeu
injustiça” ao condená-lo por corrupção. Ontem eu já havia lido a declaração de
José Dirceu e ambas trazem afirmações parecidas.
Não sei se ainda afirmam essa ausência de memória
dos brasileiros, porém fiquei preocupado com essa minha repentina lembrança e
procurarei um psicólogo, ou será que não preciso?
Será que os brasileiros estavam certo em não se
lembrar e eu estou doente lembrando disso agora, assim tão automaticamente,
misturando com minha infância de trabalhos no centro dessa metrópole, tão doce
e meiga em sua aparência de esquizofrenia agitadiça, distante de minha moradia
em Guaianases, à época; tempo em que deixei os estudos para voltar só mais
tarde e concluí-lo de modo tardio, e, por salutar teimosia, ingressar em uma
Universidade Pública?
Estou muito mal hoje: lembrei-me até de ouvir um
discurso, em meio a bandeirolas cosidas em bambu verde na escadaria do Teatro
Municipal, em que se dizia, roucamente, de um governo puro, por cujas portas,
corruptos quaisquer jamais entrariam (este discurso não era da igreja nem de
poéticas utopias). Lembro-me, também, de que dei pouco ouvido àquelas
palavras e que continuei fazendo meus esforços por conta própria, perdendo-me e
encontrando-me por essas vias paulistanas repletas de esquivanças. No entanto,
hoje me rói a dúvida: devo fazer análise, sentar-me no divã para que me livre
dessas lembranças? O que farei, deixarei de ser brasileiro se continuar me
lembrando? Será que deverei esquecer minha própria história e deixá-la que
outros a construam a canetas bem pagas?
Elói Alves
é paulistano, estudou Teologia (FATEMOC – 2003), graduou-se em Letras
(FFLCH-USP -2007) e licenciou-se em língua vernácula (FE-USP – 2007).
Sua produção literária passeia por diversos gêneros (poesia, teatro,
crônica, ensaio crítico e diferentes tipos de narrativas ficcionais). No
ano 2000, por ocasião dos 500 anos, ganhou seu primeiro prêmio
literário com o poema “Oh, meu Brasil” e em 2011 obteve sua última
premiação com a crônica “Olhares e passadas pela cidade”, como vencedor
do concurso Valeu professor, promovido pela Prefeitura de São Paulo,
sendo um dos autores do Livro “Sob o céu da cidade”. É autor do romance
As pílulas do Santo Cristo, publicado pela Editora Linear B, em novembro
de 2012. Página na internet : http://realcomarte.blogspot.com.br/2011/09/anuncios-pela-cidade.html
3 comentários
Você não precisa de um psicologo amigo, quem dera todos tivessem esta memória e bom senso, tivessem esta firmeza de caráter e não se deixassem levar por promessas absurdas de semi analfabetos, que pensassem como seres cultos que deveriam ser. Eles sim precisam fazer terapia para tentar recompor o carater torto e os desvios de conduta tão peculiares a essa raça nojenta chamada PT! eca! Amei a cronica, bem real, poderia ser escrita por muita gente se tivessem o bom senso de reconhecer a besteira que fizeram ao colocar no poder o apedeuta.
Comentar depois da Jane é até coverdia!Ela sempre diz tudo de forma perfeita.
Concordo com ela quando diz que você nào precisa de análise, o povo sim precisa acordar e perceber que já faz tempo que o 'lulês' fugiu do discurso míope sobre honestidade e honra e caiu pela sarjeta, levando consigo o sangue - quem sabe inocente - de Celso Daniel e toda a sua história dúbia de um partido de trabalhadores, mas que trabalhou e aind atrabalha em benefçio próprio plaginado os corruptos que eles diziam existir desde sempre em nossas terras tupiniquim.
Riquíssimo o seu texto.
Parabéns!
Muito grato pelos comentários, queridas Jane Uchôa e Elisabeth; é muito bom saber que, como diz no VT, nem todo mundo se inclinou a BAAL
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