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PAI E FILHO VÃO AO CINEMA [Raul J.M. Arruda Filho]

PAI E FILHO VÃO AO CINEMA 

Fomos assistir um desses desenhos da Disney. Despesas por minha conta, é obvio, apesar da conta bancária assinalar níveis próximos da falência.

Como é de conhecimento geral, sair com filho pequeno implica em carregar mochila com o básico: muda de roupa, sandália, salgadinhos diversos e, talvez o item mais importante, um urso de pelúcia (no caso, o Godofredo, mundialmente conhecido como “Godô”). 

Em ritmo caracol (carregando a casa nas costas), estávamos quase chegando à bilheteria, quando... Um pequeno obstáculo: comida. Criança sempre está com fome! Depois de “nutritivo” lanchinho, o cinema. Ingressos na mão, parada obrigatória na bomboniere (balde de pipocas, chocolate e refrigerante).

Quando, finalmente, sentamos nas poltronas e joguei a mochila no chão, sobraram alguns segundos para olhar a platéia. Claro, milhares de crianças. E... Oba!, centenas de mães. Algumas bem bonitinhas. Uma pequena compensação para essa vida de pa(i)trocinador!

Nesse momento, o menino começou a me contar uma história comprida sobre alguma coisa que aconteceu na sua escola. Confesso que não prestei muita atenção. Meu pensamento estava distante, em um tempo já perdido, quando morávamos juntos e a dor era apenas um trecho tolo de um romance de segunda classe. 

A salvação veio com o apagar das luzes e o início da sessão. Ao mesmo tempo em que a tela era invadida pelas cores da projeção, retirei um lenço do bolso e, fingindo limpar os óculos, sequei os olhos úmidos. E − que remédio? − mergulhei nas pipocas, aquilo tudo estava me deixando com fome!                                                  

Uns quinze minutos de projeção e o primeiro problema: “pai, quero fazer xixi!”. Fomos procurar o banheiro. Na volta, ao tentar localizar o nosso lugar, não vi o pé de uma senhora. Constrangido, pedi desculpas.

O segundo problema foi quase imediato: com o menino entupido de pipocas, a sede era uma questão de tempo. Fui buscar refrigerante. O que se seguiu pode parecer brincadeira. Não foi. Pisei, outra vez, no pé daquela adorável criatura. O palavrão que ela pronunciou foi ouvido no outro lado da cidade. Pedi perdão, novamente. Na volta, tomei o maior cuidado para não repetir a cena. Mas levei o troco, ou melhor, uma rasteira. Só não beijei o chão por pouco, muito pouco. Coisas da vida, pensei, enquanto tentava enxugar as mãos molhadas de refrigerante.

Depois disso, seguiu-se um período de assustadora tranqüilidade. As aventuras da tela foram superiores às desventuras da vida. Com frio, ele pediu para sentar no colo e assim, deitado no meu peito, continuou se divertindo com as trapalhadas que estavam acontecendo na tela grande. Foi fantástico sentir os meus braços em torno do seu corpo, as mãos acariciando-lhe o rosto e os cabelos.

Terminado o filme, fomos comer pastel, tomar sorvete, ver as lojas (na livraria demorei uma eternidade, reclamou o menino).

Quando voltamos para casa, estava escurecendo. No ônibus, abraçado ao Godô, o menino dormia. Desejei poder repetir aquele dia outras vezes.  

* Imagem Google- O ator Vladimir Brichta e seu filho caçula.

Raul J.M. Arruda Filho, 53 anos, Doutor em Teoria da Literatura (UFSC, 2008), publicou três livros de poesia (“Um Abraço pra quem Fica”, “Cigarro Apagado no Fundo da Taça” e “Referências”). Leitor de tempo integral, escritor ocasional, segue a proposta por um dos personagens do John Steinbeck: “Devoro histórias como se fossem uvas”. 
Todos os direitos autorais reservados ao autor.

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