Trair
Eu te traí. Por quê? O certo não
seria você perguntar com quem? Não me importa quem ele é. E se fosse ela? Ela?
Uma mulher. Quem seria ela? Não prefere saber o porquê agora? Quem é ela? Eu te
falo o motivo: eu a amo. Quem é ela? Minha professora de dança. A professora?
É, de dança. E quem dançou fui eu. Ela é maravilhosa. Isso é abominável. O que
é abominável? Eu estar com outra mulher ou eu ter trocado por uma mulher? As
duas coisas. Você não me parece triste. Quer que eu chore? Você deveria ter
ficado arrasado. Quer medir a minha reação agora? Você nunca me amou. Não crie
pretextos. Você ama os seus camaradas de bar. Ok, isso é clássico, faça-se de
vítima agora. Seu idiota, você riu! E não é pra rir? Forje uma lágrima! Eu não
sou ator, ao contrário de você. Eu também não sou ator, sou atriz, meu bem.
Atriz? Na relação você é a atriz, é isso? Babaca. É a professora de dança que
te penetra o consolo, assumindo o papel de macho? É, é ela sim, e daí? Aquele
piru de borracha dá de dez no seu. Agora vai dizer que fingiu todos os orgasmos
comigo. É, eu fingi mesmo. Você quer que eu saia de casa? Não, você que deve me
expulsar de casa! Não, imagina. Eu saio com prazer. E pretende ir pra onde, seu
malandro? Vou pro bar, afogo as mágoas e retorno. Olha, eu vou embora, eu vou
morar com a Bebel. Bebel... O que a Bebel tem que eu não tenho? Na verdade,
seria o que ela não tem. Por que não traz a Bebel pra morar com a gente? O que?
Traga a Bebel. Eu não me importo, cedo o lado esquerdo da nossa cama para ela.
Eu não to ouvindo isso... Ao contrário do que pensa, eu amo você e esta será
uma prova de amor minha. Amor é o cacete! Você tá fantasiando um ménage a
trois que eu sei, seu safado. Juro que não pensei nisso, nem swing eu
aceitei fazer daquela vez, lembra? Mas a Bebel é gostosa, você se sentiria
atraído por ela. Ela é gostosa, eu sei. Como o senhor sabe que a Bebel é
gostosa, pode me explicar? Ora, você não ia colar velcro com uma baranga, ia?
Você afirmou com muita segurança, eu te conheço! Foi pura suposição, vai
prolongar o mise en scène? Mise o que, o que andou lendo? Você trocou um
homem culto por uma professora que ensina rebolado. Ela ensina tango, seu
idiota. Eu sei, ela adora “Por una cabezza”. Ei, como sabe disso? Ora, se
existir uma professora de tango que não adore Gardel, eu quebro os meus discos
do Raul. Chega dessa conversa, vou arrumar minha mala, e você, não vai falar
mais nada, não vai me impedir? Eu não vou te impedir porque sei que não vai a
lugar algum. Eu não estaria tão convencida no seu lugar, pague pra ver. Eu
pago. Arrgh! Ok, você venceu. Eu não te traí. Eu já sabia. Idiota, sabia como,
minto tão mal assim? Não, até que você desempenhou bem o seu papel. Então como
matou a charada? Porque eu te traí. Você me traiu? Quem é a vadia? O certo não
seria saber o porquê? Quem é a vadia? É a Bebel. Seu filho da puta, você comeu
a minha professora de dança? Todo final de semana. Desgraçado! Sai da minha
frente, some dessa casa! Filho da puta!
LOHAN LAGE PIGNONE-Graduado
em Letras (Port./Lit.) pela Universidade Estácio de Sá. Professor da
rede Estadual do Rio de Janeiro, músico e roteirista.
Publicou,
em 2011, o livro "Poesia é Isso" (Ed. Multifoco) e, por dois anos
consecutivos, foi eleito destaque em arte e cultura na cidade onde
reside, Trajano de Moraes (RJ).
Possui textos no blog coletivo Autores S/A. Escreve, mensalmente, para a Revista Samizdat.
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