O cheiro do amor
CONWAY, David. O presente mais importante de todos.
Tradução de Rosana Rios. Ilustrações de Karin Littlewood. São Paulo, FTD, 2012.
32p.
Diz o sábio e velho leão que tão certo quanto o cheiro
da chuva que é trazido pelo vento, nós reconheceremos o amor quando o
encontrarmos. Simples assim!
Ama é uma menina que após o nascimento do irmãozinho
Azizi procura o melhor presente para dar a ele. Ouve da avó Sisi que o presente
mais importante de todos é dar amor ao irmão. Por isso, na manhã seguinte, Ama
sai pelo grande vale africano onde vive, a procura desse presente chamado amor.
Pergunta aos que encontra no caminho - o pássaro tecelão e a girafa – que
também não sabiam onde encontrar tal presente. É o leão quem dá a pista: quando
o encontrar, você o reconhecerá! Mas Ama é surpreendida pela noite e não
consegue voltar pra casa. No dia seguinte, quando seu pai a encontra, ela sente
na pele as respostas que buscava. Em sua casa, na festa que a aguardava naquela
noite, as respostas se completam intensa e calorosamente.
Este livro é também um presente: o texto simples e
direto flui como um sopro. Mas não abre mão do tratamento delicado e poético
para um assunto tão difícil e metafísico. Já nas primeiras tentativas de
definição, deparamo-nos com conceitos do tipo: o amor é suave como uma nuvem
branca, reluzente como uma estrela. As palavras, claro, só dão conta de
traduzir, simbolicamente, essas coisas que estão no reino do invisível e do
impalpável. E quando consegue finalmente expressar-se por imagens de beleza,
parece que há enfim, uma harmonia e um equilíbrio. É o que ocorre quando o
texto diz que a alegria é uma “revoada colorida de borboletas”. No mínimo
plástico e impactante! O livro inteiro é assim.
Colocar o leitor em contato com outra geografia é
também ampliar o mundo. Aqui vamos ver um vilarejo africano, com suas cabanas,
sua vegetação, seus objetos, sua culinária, seus vestuários, sua rotina, sua
vida comunitária, em que acontecimentos como o nascimento de uma criança são
festejados por todos. Mas são as distribuições das tarefas cotidianas que
também seduzem, porque vividas de uma outra maneira, como pegar água no poço,
encostar-se ao tronco de um baobá, ou esperar por notícias no jardim.
Como não poderia deixar de ser, a história é cercada de
afetos: de pai, de mãe, dos animais, entre os vizinhos, da natureza
circundante, e até afeto pelo que virá. O livro é sem dúvida uma bela maneira
de celebrar a vida. E a imagem final não poderia ser mais potente: o sábio e
velho leão farejando no ar a descoberta do amor e a chuva que logo chegaria. Lindo!
As ilustrações também são um presente: amplas, de
páginas duplas inteiras e com cores fortes, em que predominam os amarelos,
laranjas, vermelhos. As luzes do dia e da noite, as silhuetas, as pinceladas
aguadas, as visões de diferentes ângulos, os cortes nas imagens complementam a
estratégia do ilustrador para ampliar a leitura do texto. Há um artifício
interessante: páginas duplas divididas em três partes, mostrando três cenas
diferentes. O que dá uma boa dinâmica para a narrativa. Mas a imagem mais emblemática
e sedutora é a menina Ama voltando pra casa nas costas do pai, depois de passar
uma noite sumida. Inesquecível! Talvez por isso seja essa a ilustração da capa
da edição inglesa.
O autor é um premiado escritor inglês e já foi indicado
para o Kate Greenaway Medal, importante prêmio, conferido pela British Library
Association, que desde 1955 distingue os mais belos trabalhos de ilustrações e
livros para crianças. A ilustradora também já foi indicada, por três vezes, ao
mesmo prêmio. Dupla perfeita! Aliás, trio, porque a tradutora Rosana Rios
também é uma grande autora!
Fonte:http://www.artistasgauchos.com.br/
Celso Sisto
é escritor, ilustrador, contador de histórias do grupo Morandubetá
(RJ), ator, arte-educador, crítico de literatura infantil e juvenil,
especialista em literatura infantil e juvenil, pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), Mestre em Literatura Brasileira pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Doutor em Teoria da
Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUC-RS) e responsável pela formação de inúmeros grupos de contadores de
histórias espalhados pelo país.
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