"Isso é em Portugal e na Europa!..."
Estando na companhia amiga de meu cunhado, a almoçar suculenta feijoada brasileira, onde não faltava boa farofa, couve guisada e abundante carne, tudo bem regado com fresco e encorpado vinho gaúcho, este, volvendo-se afetuosamente, para mim, disparou:
- " Por que não obtêm Bilhete de Identidade brasileiro, como o avô de minha mulher, que era português?
Fiquei mudo de espanto.
Ele, risonho, prosseguiu:
- " Eu ajudo... Casou com comunhão de bens, com paulistana, em Perdizes, perante Juiz de Paz. Foi abençoado na Bexiga. Tem muita família e amigos, no Brasil, e casa em Santa Catarina. Fala português. Tem documentos brasileiros. Não é jovem, em breve estará aposentado. Não vai tirar emprego a ninguém..."
Enquanto assim falava, pensava na alegria que daria a minha mulher de poder passar, em minha companhia, a velhice, no torrão natal.
Fomos à Polícia. Atendeu-nos jovem funcionário. Historiei a situação, apresentei certidão de casamento...
Alegrei-me, quando me disse: "Basta, sendo português, com casa no Brasil, não deve haver obstáculo”.
Gentilmente indicou o fotógrafo, que tirava retratos, com os requisitos necessários.
De fotografias na mão, dirigi-me de novo à Polícia. Mandaram-me preencher papelada...
Depressa se esvaneceram as minhas esperanças. O malfadado computador, teimava em não aceitar os documentos, perante a estupefação do amável empregado.
Então surgiu homem grandalhão, de voz meiga, lamentando o sucedido. "Que fosse á Polícia Federal...Que fosse á Federal..."
Receoso, penetrei no edifício da Federal. Expôs o pretendido. Encaminharam-me para gabinete sobriamente decorado, onde fui recebido por carrancudo guarda. Ao tomar conhecimento do pretendido, a fisionomia desnudou-se, abrindo-se em festivos sorrisos:
- " Para nós, os portugueses, são nossos irmãos. Infelizmente não o posso satisfazer. Mas consegue, direito de residência; mas, cuidado! Se ausentar mais de seis meses, caduca! Naturalmente, se pedir, será de novo concedido”.
Respondi-lhe: o brasileiro, para obter a nacionalidade portuguesa, basta-lhe ter ascendência portuguesa, ou residir meia dúzia de anos em Portugal...
Com disfarçado risinho, bailando nos grossos lábios, afirmou:
- "Isso é em Portugal! E na Europa!...”
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Humberto Pinho da Silva nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA. Foi redactor do jornal: “NG”. e é o coordenador do Blogue luso-brasileiro "PAZ. Página na Internet: http://solpaz.blogs.sapo.pt/
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