Uma viagem ao mundo mágico das letras
Este era o título do projeto educacional com o objetivo de incentivar a leitura entre os jovens estudantes, que desenvolvi numa escola estadual nos últimos três anos – Uma viagem ao mundo mágico das letras. Tudo surgiu por acaso, como no acaso de uma grande paixão, ou um caso de amor. Simplesmente a diretora da escola chegou pra mim numa noite de frio e me mostrou uma sala morna abarrotada de livros, porém, abandonada havia tempo – é toda sua, foi o que ela disse, saindo vagarosamente pela via lateral.
Por um momento me senti um peixe fora d’água: sou professor de literatura, não um bibliotecário! Mas a leitura estava no sangue e na alma, pois sempre gostei de ler: jornais, revistas, versos e prosas, enfim, tudo que tivesse palavras em suas linhas. Já na primeira semana, ainda espanando os vermes que por lá habitavam, deixando apenas aqueles famosos de Augusto dos Anjos, fui alvejado de surpresa, atravessando o pátio, por um olhar faminto e carente por cultura de um menino que me parou de repente – Ei, professor, está lendo o quê? Naquele momento, eu estava me familiarizando com Hassan, um dos personagens do romance O caçador de pipas de Khaled Hosseini, e sua enigmática frase pronunciada ao seu melhor amigo, Amir, “Por você, eu faria isso mil vezes”, adentrando nessa belíssima amizade, marcada por amor e ódio ao longo das quase quatrocentas páginas. Como nunca fui de esconder os livros nas estantes, pois sempre tive em mim que os livros não foram feitos a ficar nas estantes, antes passar por mãos e mãos, acabei cedendo àqueles olhos famintos a me dizer – gostaria tanto de ler este livro. Isto, após olhar a capa, a resenha do livro, a quantidade de páginas, e algumas palavras sobre o livro que havia jogado ao vento aos seus ouvidos. Mas palavras ao vento se tornam perigosas, então, emprestei o livro ao garoto, ainda no primeiro capítulo. Com a certeza de que o menino haveria de demorar uns quinze dias ou mais, procurei logo pedir via net um novo exemplar da história de Hassan, porém, para minha surpresa, o jovem estudante havia chegado para mim na outra manhã, com os olhos vermelhos e sonolentos, como quem não dormira na noite anterior – professor, madruguei de olhos abertos, não consegui dormir, amei esta história. Que bom! Mas ele não veio só, em sua companhia havia mais dois colegas lutando entre si para ver em qual das mãos haveria de ficar o livro na próxima madrugada. Aquilo foi a tempestade que faltava na mansidão de todos os dias. Haveria de comprar mais três exemplares do mesmo livro. Daí em diante, comecei a passar com livros de sala em sala expondo oralmente a resenha dos livros, muitas vezes até no pátio, ou na entrada da escola. Geralmente entrava com trinta livros e saía com as mãos abanando. Foi uma febre! Um delírio! No primeiro ano, mansamente, chegamos a trezentos e sessenta e oito leituras; no ano seguinte, evoluímos bastante, pois fomos para mil e duzentas leituras; já no terceiro ano, batemos o recorde em matéria de leituras não-obrigatórias estudantis – foram mil e oitocentas leituras. A cada livro, os alunos viajavam no tempo e no espaço, vivendo outras realidades, conhecendo novas personagens, novas culturas, novas imagens. E dava pra ver e sentir o estranhamento que a literatura causava em cada um.
Robson Veiga - Mestrando em Literatura e Crítica Literária pela PUC de Goiania-GO. Página pessoal na internet: Café Literário.
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