Análise da obra Grande Sertão Veredas, de
Guimarães Rosa
É o único romance escrito por Guimarães Rosa, publicado no mesmo ano que Corpo
de Baile (1956). Obra-prima, traduzida para muitas línguas, é uma narrativa em
que a experiência de vida e de texto fundem-se numa obra fascinante,
permanentemente desafiadora. O romance constrói-se como uma longa narrativa
oral. Riobaldo, um velho fazendeiro, ex-jagunço, conta sua experiência de vida
a um interlocutor, que jamais tem a palavra e cuja fala é apenas sugerida.
Conta
histórias de vingança, seus amores, perseguições, lutas pelos sertões de Minas,
Goiás, e sul da Bahia, tudo isso entremeado de reflexões. As demais personagens
falam pela boca de Riobaldo, valendo-se de seu estilo de narrar e de suas
características lingüísticas individuais.
As
histórias vão sendo emendadas, articulando-se com a preocupação do narrador de
discutir a existência ou não do diabo, do que depende a salvação de sua alma.
O
tempo é psicológico. A narrativa é irregular (enredo não linear), sendo
acrescidos vários casos pequenos. Narrado em primeira pessoa -
narrador-personagem - utiliza-se do discurso direto e indireto livre.
A trama
ocorre no sertão mineiro (norte), sul da Bahia e Goiás. No entanto, por se
tratar de uma narrativa densa, repleta de reflexões e divagações, ganha um
caráter universal - "o sertão é o mundo".
Personagens
Riobaldo: personagem-narrador que
conta sua estória a um doutor que nunca aparece. Riobaldo sente dificuldades em
narrar, seja por sua precariedade em organizar os fatos, seja por sua
dificuldade em entendê-los. Relata sua infância, a breve carreira de professor
(de Zé Bebelo), até sua entrada no cangaço (de jagunço Tatarana a chefe
Urutu-Branco), estabelecendo-se às margens do São Francisco como um pacato
fazendeiro.
Diadorim: é o jagunço Reinaldo, integrante do
bando de Joca Ramiro. Esconde sua identidade real (Maria Deodorina)
travestindo-se de homem. Sua identidade é descoberta ao final do romance, com
sua morte.
Zé Bebelo: personalidade com
anseios políticos que acaba por formar bando de jagunços para combater Joca
Ramiro. Sai perdedor, sendo exilado para Goiás e acaba por retornar com a morte
do grande chefe para vingar o seu assassinato.
Joca Ramiro: é o maior chefe
dos jagunços, mostrando um senso de justiça e ponderação no julgamento de Zé
Bebelo, sendo bastante admirado.
Medeiro Vaz: chefe de jagunços
que se une aos homens de Joca Ramiro para combater contra Hermógenes e Ricardão
por conta da morte do grande chefe.
Hermógenes e Ricardão: são os traidores,
sendo chamados de "judas", que acabam por matar Joca Ramiro. Muitos
jagunços acreditavam que Hermógenes havia feito o pacto com o Diabo.
Só Candelário: outro chefe que
ajuda na vingança. Possuía grande temor de contrair lepra.
Quelemém de Góis: compadre e
confidente de Riobaldo, que o ajuda em suas dúvidas e inquietações sobre o
Homem e o mundo.
As três faces amorosas de Riobaldo:
Nhorinhá: prostituta, representa o amor
físico. O seu caráter profano e sensual atrai Riobaldo, mas somente no aspecto
carnal.
Otacília: contrária a Nhorinhá, Riobaldo
destina a ela o seu amor verdadeiro (sentimental). É constantemente evocada
pelo narrador quando este se encontrava desolado e saudoso durante sua vida de
jagunço. Recebe a pedra de topázio de "seô Habão", simbolizando o
noivado.
Diadorim: representa o amor impossível,
proibido. Ao mesmo tempo em que se mostra bastante sensível com uma bela paisagem,
é capaz de matar a sangue frio. É ela que causa grande conflito em Riobaldo,
sendo objeto de desejo e repulsa (por conta de sua pseudo identidade).
Enredo
A primeira parte do romance (até aproximadamente à página 80), Riobaldo faz um
relato "caótico" e desconexo de vários fatos (aparentemente sem
relações entre si), sempre expondo suas inquietações filosóficas (reflexões
sobre a vida, a origem de tudo, Deus, Diabo, ...) - Eu queria decifrar as
coisas que são importantes. E estou contando não é uma vida de sertanejo, seja
se fôr jagunço, mas a matéria vertente."
O
discurso ambivalente de Riobaldo (...) se abre a partir de uma necessidade,
verbalizada de maneira interrogativa. No entanto, há uma grande dificuldade em
narrar e organizar seus pensamentos: Contar é muito dificultoso. Não pelos anos
que se já passaram. Mas pela astúcia que tem certas coisas passadas - de fazer
balancê, de se remexerem dos lugares. É o compadre Quelemém de Góis que lhe
socorre em suas dúvidas, mas não de forma satisfatória, daí a sua necessidade
de narrar.
A
partir da página 80, Riobaldo começa a organizar suas memórias. Fala da mãe
Brigi, que o obrigava à esmolação para a paga de uma promessa. É nessa ocasião,
à beira do "Velho Chico",
que Riobaldo se encontra pela primeira vez com o garoto Reinaldo, fazendo
juntos uma travessia pelo rio São Francisco. Riobaldo fica fascinado com a
coragem de Reinaldo, pois como este afirma : "sou diferente (...) meu pai disse que eu careço de ser diferente
(...).
A mãe
de Riobaldo vem a falecer, sendo ele levado à fazenda São Gregório, de seu
padrinho Selorico Mendes. É lá que Riobaldo toma contato com o grande chefe
Joca Ramiro, juntamente com os chefes Hermógenes e Ricardão. Selorico Mendes
envia o seu afilhado ao Curralinho, a fim de que tivesse contato com os
estudos. Posteriormente, assume a função de professor de Zé Bebelo (fazendeiro
residente no Palhão com pretensões políticas. Zé Bebelo, querendo pôr fim aos
jagunços que atuavam no sertão mineiro, convida Riobaldo a participar de seu
bando. Riobaldo troca as letras pelas armas. É
desse ponto que começa suas aventuras pelo norte de Minas, sul da Bahia e Goiás
como jagunço e depois como chefe.
O
bando de Zé Bebelo faz combate com Hermógenes e seus jagunços, onde este acaba
por fugir. Riobaldo deserta do bando de Zé Bebelo e acaba por encontrar
Reinaldo (jagunço do bando de Joca Ramiro), ingressando no bando do "grande chefe". A amizade entre
Riobaldo e Reinaldo acaba por se tornar sólida, onde Reinaldo revela o seu nome
- Diadorim - pedindo-lhe segredo. Juntamente com Hermógenes, Ricardão e outros
jagunços, combate contra as tropas do governo e de Zé Bebelo.
Depois
de um conflito com o bando de Zé Bebelo, o bando liderado por Hermógenes fica
acuado, acabando-se por se separar, reunindo-se posteriormente. O chefe
Só Candelário acaba por integrar-se ao bando de Hermógenes, tornando-se líder
do bando até o encontro com Joca Ramiro. Nessa ocasião, Joca Ramiro presenteia
Riobaldo com um rifle, em reconhecimento à sua boa pontaria (a qual lhe faz
valer apelidos como "Tatarana" e "Cerzidor"). O grupo de
Joca Ramiro acaba por se dividir para enfrentar Zé Bebelo, conseguindo
capturá-lo. Zé Bebelo é submetido a julgamento por Joca Ramiro e seus chefes -
Hermógenes , Ricardão, Só Candeário, Titão Passos e João Goanhá - acabando a
ser condenado ao exílio em Goiás.
Depois
do julgamento, o bando do grande chefe se dispersa, Riobaldo e Diadorim acabam
por seguir o chefe Titão Passos. Posteriormente, o jagunço Gavião-Cujo vai ao
encontro do grupo de Titão Passos para informar a morte de Joca Ramiro, que foi
assassinado à traição por Hermógenes e Ricardão ("os judas").
Riobaldo fica impressionado com a reação de Diadorim diante da notícia. Os
jagunços se reúnem para combaterem os judas.
Por
essa época, Riobaldo tem um caso com Nhorinhá (prostituta), filha de Ana
Danúzia. Conhece Otacília na fazenda Santa Catarina, onde tem intenções
verdadeiras de amor. Diadorim, em determinada ocasião, por ter raiva de
Otacília, chega a ameaçar Riobaldo com um punhal.
Medeiro
Vaz junta-se ao bando para a vingança, assumindo a chefia. Inicia-se a
travessia do Liso do Sussuarão. O bando não agüenta a travessia e acaba por
retornar. Medeiro Vaz morre. Zé Bebelo retorna do exílio para ajudar na
vingança contra os judas, tomando a chefia do bando.
Por
suas andanças, o bando de Zé Bebelo chega à fazenda dos Tucanos, onde são
encurralados por Hermógenes. Momentos de grande tensão. Zé Bebelo envia dois
homens para informarem a presença de jagunços naquele local. Riobaldo desconfia
de uma possível traição com esse ato. O bando de Hermógenes fica acuado pelas
tropas do governo e os dois lados se unem provisoriamente para escaparem dos
soldados . Zé Bebelo e seus homens fogem à surdina da fazenda, deixando os de
Hermógenes travando combate com os soldados. Riobaldo oferece a pedra de
topázio a Diadorim, mas este recusa, até que a vingança tenha sido consumada.
Os
Bebelos chegam às Veredas-Mortas. É um dos pontos altos do romance, onde
Riobaldo faz o pacto com o Diabo para vencerem os judas. Riobaldo acaba
assumindo a chefia do bando com o nome de "Urutu-Branco"; Zé Bebelo
sai do bando. Riobaldo dá a incumbência a "seô Habão" para entregar a
pedra de topázio a Otacília, firmando o compromisso de casamento. O chefe
Urutu-Branco acaba por reunir mais homens (inclusive o cego Borromeu e o menino
pretinho Gurigó).
À
procura dos Hermógenes, fazem a penosa travessia do Liso do Sussuarão, onde
Riobaldo sofre atentado por Treciano, que é morto pelo próprio chefe.
Atravessado o Liso, Riobaldo chega em terras baianas, atacando a fazenda de
Hermógenes e aprisionando sua mulher. Retornam aos sertões de Minas, à procura
dos judas. Encurralam o bando de Ricardão nos Campos do Tamanduá-tão, onde o
Urutu-Branco mata o traidor. Encontro dos Hermógenes no Paredão. Luta
sangrenta. Diadorim enfrenta diretamente Hermógenes, ocasionando a morte de ambos.
Riobaldo descobre então que Diadorim se chama Maria Deodorina da Fé Bittancourt
Marins, filha de Joca Ramiro.
Riobaldo
acaba por adoecer (febre-tifo). Depois de se restabelecer, fica sabendo da
morte de seu padrinho e herda duas fazendas suas. Vai ao encontro de Zé Bebelo,
o qual o envia com um bilhete de apresentação a Quelemém de Góis:
Compadre meu Quelemém me hospedou, deixou
meu contar minha história inteira. Como vi que ele me olhava com aquela enorme
paciência - calma de que minha dor passasse; e que podia esperar muito longo
tempo. O que vendo, tive vergonha, assaz .
Mas , por fim , eu tomei coragem , e tudo perguntei:
-"O senhor acha que a minha alma eu
vendi , pactário?! "
Então ele sorriu, o pronto sincero, e me vale me respondeu :
-"Tem cisma não. Pensa para diante.
Comprar ou vender, às vezes, são as ações que são as quase iguais ..."
(...)
Cerro. O senhor vê. Contei tudo. Agora
estou aqui, quase barranqueiro. (...) Amável senhor me ouviu, minha idéia
confirmou: que o Diabo não existe. Pois não? O senhor é um homem soberano ,
circunspecto. Amigos somos. Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se fôr ...
Existe é homem humano. Travessia.
Comentários
O fato de Riobaldo parecer ter feito um pacto com o diabo, embora em muitos
momentos isso pareça evidente, a existência ou não do pacto fica por conta das
interpretações do leitor.
O
poder corrosivo do tempo passado confunde os acontecimentos na mente do
narrador, impedindo-o de separar o falso do verdadeiro, o vivido do imaginado.
A opção pelo monólogo de caráter memorialista implica, no plano da narrativa,
distribuição desordenada das seqüências, ligadas pelo ritmo fragmentário e
caótico da memória. Dessa forma, a linguagem assume, para o narrador, um poder
mágico.
Contar
a própria vida constitui a matéria narrativa, mas as dificuldades do viver e do
narrar por distorcerem as duas práticas criam um texto ambíguo, tão enigmático
quanto à vida, em que tudo é e não é, simultaneamente.
Além
dos casos ligados à busca de Hermógenes e Ricardão, assassinos do chefe Joca
Ramiro, e que constituem um dos fios da narrativa, existe também o plano
amoroso, centrado nas relações existentes entre Riobaldo e Diadorim. O amor por
Diadorim é motivo de grandes preocupações para o narrador. Na verdade, Riobaldo
conhece Diadorim como homem - o valente guerreiro Reinaldo - e só fica sabendo
de sua identidade feminina no final da luta, quando Diadorim é morto por
Hermógenes.
De
maneira geral, os críticos apontam três planos no romance: o plano da vida de
jagunçagem, que permite rastrear os componentes geoeconômico-político-sociais
do sertão; o plano das reflexões, criado pelos temores de Riobaldo velho,
revendo e avaliando o passado e sua própria vida; e o plano mítico, centrado
nos conflitos representados pelas forças da natureza.
Os
fragmentos que transcrevemos de Grande Senão: Veredas traduzem algumas
reflexões de Riobaldo sobre a existência e a natureza do diabo:
Explico ao senhor: o diabo vige dentro do
homem, os crespos do homem — ou é o homem arruinado, ou o homem dos avessos.
Solto, por si, cidadão, é que não tem diabo nenhum. Nenhum! — é o que digo. O
senhor aprova? Me declare tudo franco — é alta mercê que me faz: e pedir posso,
encarecido. Este caso — por estúrdio que me vejam — é de minha certa
importância. Tomara não fosse... Mas, não diga que o senhor; assisado e
instruído, que acredita na pessoa dele?! Não? Lhe agradeço! Sua alta opinião
compõe minha valia. Já sabia, esperava por ela —já o campo! Ah, a gente, na
velhice, carece deter sua aragem de descanso. Lhe agradeço. Tem diabo nenhum.
Nem espírito. Nunca vi. Alguém devia de ver; então era eu mesmo, este vosso
servidor Fosse lhe contar.. Bem, o diabo regula seu estado preto, nas
criaturas, nas mulheres, nos homens. Até: nas crianças — eu digo. Pois não é
ditado. “menino — trem do diabo”? E nos usos, nas plantas, nas águas, na terra,
no vento. Estrumes... O diabo na rua, no meio do redemunho...
...
E não conheci arriação, nem cansaço.
Ele tinha que vir; se existisse. Naquela
hora, existia, Tinha de vir; demorão, ou jajão. Mas, em que formas? Chão de
encruzilhada é posse dele, espojeiro de bestas na poeira rolarem. De repente,
com um catrapus de sinal, ou momenteiro com o silêncio das astúcias, ele podia
se surgir para mim. Feito o Bode-Preto? O Morcegão? O Xu? E de um lugar — tão
longe e perto de mim, das reformas do Inferno — ele já devia de estar me
vigiando, o cão que me fareja. Como é possível se estar; desarmado, de si,
entregue ao que outro queira fazer; no se desmedir; de tapados buracos e tomar
pessoa? Tudo era para sobrosso, para mais medo: ah, aí é que bate o ponto. E
por isso eu não tinha licença de não me ser; não tinha os descansos do ar A
minha idéia não fraquejasse.
No texto que segue, uma antológica reflexão de Riobaldo:
É é não é. O senhor ache e não ache. Tudo é
e não é,., Quase todo mais grave criminoso feroz, sempre é muito bom marido,
bom filho, bom pai, e é bom amigo-de-seus-amigos! Sei desses. Só que tem os
depois - e Deus, junto. Vi muitas nuvens.
Mire veja: o mais importante e bonito do
mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram
terminadas — mas que elas vão sempre mudando, Afinam e desafinam.
No
final da narrativa, a revelação de que Diadorim era mulher, a dor de Riobaldo
pela sua morte e a expressão de seu amor:
E disse, Eu conheci! Como em todo o tempo
antes eu não contei ao senhor - e mercê peço: - mas, para o senhor divulgar
comigo, a par justo o travo de tanto segredo, sabendo somente no átimo em que
eu também só soube... Que Diadorim era o corpo de uma mulher; moça perfeita...
Estarreci. A dor não pode mais do que a surpresa. A coice d’arma, de coronha...
Ela era. Tal que assim se desencantava, num
encanto tão terrível; e levantei mão para me benzer - mas com ela tapei foi um
soluçar; e enxuguei as lágrimas maiores. Uivei. Diadorim! Diadorim era uma
mulher Diadorim era mulher como o sol não acende a água do rio Urucuia, como eu
solucei meu desespero.
O senhor não repare. Demore, que eu conto.
A vida da gente nunca tem termo real.
Eu estendi as mãos para tocar naquele
corpo, e estremeci retirando as mãos para trás, incendiável: abaixei meus
olhos. E a Mulher estendeu a toalha, recobrindo as partes. Mas aqueles olhos eu
beijei, e as faces, a boca. Adivinhava os cabelos. Cabelos que cortou com a
tesoura de prata... Cabelos que, no só ser, haviam de dar para baixo da
cintura... E eu não sabia por que nome chamar; eu exclamei me doendo:
-"Meu amor!..."
...
"Enterrem separados dos outros, num
aliso de vereda, adonde ninguém ache, nunca se saiba..." Tal que disse,
doidava. Recaí no marcar do sofrer. Em real me vi, que com a Mulher junto
abraçado, nós dois chorávamos extenso. E todos meus jagunços decididos
choravam. Daí, fomos, e em sepultura deixamos, no cemitério do Paredão
enterrada, em campo do sertão.
Ela tinha amor em mim.
E aquela era a hora do mais tarde. O céu
vem abaixando. Narrei ao senhor. No que narrei, o senhor talvez até ache
mais do que eu, a minha verdade. Fim que foi.
Aqui a estória se acabou.
Aqui, a estória acabada.
Aqui, a estória acaba.
O
narrador, extrapolando a história, continua por mais cinco ou seis páginas o
seu monólogo.
Linguagem
Em Grande Sertão: Veredas, Guimarães
Rosa faz uma recriação da linguagem, "recondicionando-a inventivamente,
saindo do lugar-comum a fim de dar maior grandeza ao discurso. Nu da cintura para os queixos (ao invés
de nu da cintura para cima) e ainda Não
sabiam de nada coisíssima (no lugar de não sabiam de coisa nenhuma)
constituem exemplos do apuramento da linguagem roseana.
Toda
a narrativa é marcada pela oralidade (Riobaldo conta seus casos a um interlocutor),
portanto, sem possibilidades de ser reformulado, já que é emitido
instantaneamente. Ainda tem-se as dúvidas do narrador e suas divagações, onde é
percebido a intenção de Riobaldo em reafirmar o que diz utilizando a própria
linguagem.
O
falar mineiro associado a arcaísmos, brasileirismos e neologismos faz com que o
autor de Sagarana extrapole os
limites geográficos de Minas. A linguagem ultrapassa os limites
"prosaicos" para ganhar dimensão poético-filosófica (principalmente
ao relatar os sentimentos para com Diadorim ou a tirar conclusões sobre o
ocorrido através de seus aforismos):
1. Viver é muito perigoso
2. Deus é paciência
3. Sertão. O senhor sabe: sertão 'onde manda quem é forte, com as astúcias.
4. ...sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do
lugar .
5. ...toda saudade é uma espécie de velhice.
6. Jagunço é isso. Jagunço não se escabreia com perda nem derrota - quase tudo
para ele é o igual.
7. Deus existe mesmo quando não há. Mas o demônio não precisa de existir para
haver.
8. Viver é um descuido prosseguido.
9. Sertão é do tamanho do mundo
10. Vingar, digo ao senhor: é lamber, frio, o que o outro cozinhou quente
demais.
11. Quem desconfia, fica sábio.
12. Sertão é o sozinho.
13. Sertão: é dentro da gente.
14. ...sertão é sem lugar.
15. Para as coisas que há de pior, a gente não alcança fechar as portas.
16. Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer outras
maiores perguntas.
17. ...amor só mente para dizer maior verdade.
18. Paciência de velho tem muito valor.
19. Sossego traz desejos.
20. ...quem ama é sempre muito escravo , mas não obedece nunca de verdade.
As imagens foram colhidas na internet.
Revista Biografia.
Nenhum comentário
Postar um comentário