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MEIO FIO [Fátima Venutti]

MEI0 FIO

Olhei as unhas e pensei: que cor de esmalte mais ridícula! Nada a ver comigo. Um homem passou em direção à barraca de produtos naturais e eu o seguiu com os olhos. Ele pegou um punhado de feijão verde nas mãos, conferiu se estavam bons, cheirou, chamou a vendedora e falou qualquer coisa. Acho que ia comprar... Comprou e foi-se rapidamente, passando novamente à minha frente. De repente, um menino veio correndo, agarrou as pernas da moça da barraca ao lado, a de calcinhas, e gritou bem alto sem educação: Mãe! Quero um algodão doce agora! A mãe, sem questionar, enfiou uma das mãos no bojo dos seios e tirou um bolo de notas. Deu dois reais ao menino e voltou-se pra atender a cliente que não sabia se levava o modelito de oncinha ou a de enfermeira, com uma fenda na frente.

O calor estava tão intenso, devia passar dos 38 graus, que até as flores dos jardins da praça não agüentavam ficar em pé. No veio central, uma armação enorme mostrava que algum artista ia se apresentar. – Sorvete! Olha o sorvete refrescante! O som vinha da lateral direita, percebia-se que estava bem próximo e repetindo: Sorvete! Olha o sorvete refrescante! 

Dois tiros, corre-corre, gritaria, barracas se desmontando, alvoroço. A mulher das calcinhas deu uma carreira, eu me levantei e vi, do outro lado da praça uma roda de gente se formando, em seguida um grito e o choro explosivo. Nãaaaaaaao!  Fui caminhando em sentido ao ocorrido e vi o perfil do homem que comprara feijão verde há pouco. Ele olhava pra mulher das calcinhas e sem parar repetia: ele veio correndo na minha frente, estava descalço, pensei que fosse me roubar. No chão, o algodão doce impregnou-se do vermelho do sangue e alguns feijões verdes se espalharam pelo meio fio.        
                                              
Chamaram a polícia, a ambulância e alguém se preocupou com a apresentação artística avisando a todos que o Grupo do Boi não ia mais se apresentar. 


Maria de Fátima Venutti ou simplesmente Fátima Venutti. Paulistana de Osasco. Reside em Blumenau desde dezembro de 2002. Formada em Letras, escreve desde os 11 anos. Pág. na internet: Fátima Venutti.

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