Ricardo Ramos Filho nasceu no Rio de Janeiro, em 1954, mas
aos quatro anos mudou-se com a família para São Paulo, de onde nunca mais saiu.
Filho do escritor Ricardo Ramos e neto de Graciliano Ramos, desde menino viveu
intensamente o universo dos livros.
Ricardo Ramos Filho, escritor e roteirista, conta como
nasceu sua paixão por literatura. Ele fez parte da mesa do MBL na Flip 2013,
justamente no ano em que a festa homenageia seu avô, Graciliano Ramos.
Ainda me lembro da cartilha, minha alfabetização como
caminho suave. Aprender a ler mesmo, porém, entendendo o contexto, só
aconteceria um pouco mais tarde, com alguém muito especial: Monteiro Lobato.
Eu tinha sete anos quando peguei uma hepatite. Houve
diagnóstico comprovado por exames, não foi uma dessas “viroses” tão comuns
inventadas pelos médicos. Na época o
tratamento exigia repouso absoluto, fiquei dois meses de cama.
Minha avó Heloísa morava no Rio de Janeiro. Em uma de
suas vindas a São Paulo, começou a ler-me Reinações de Narizinho. Líamos e
comentávamos. Fiquei logo íntimo da Emília, do Visconde, Pedrinho, toda a turma
do Sítio do Picapau Amarelo. Comigo, desde então, sempre foi assim, geralmente
faço amizade fácil com as personagens dos livros. Minha avó Heloísa morava no Rio de Janeiro. Em uma de
suas vindas a São Paulo, começou a ler-me Reinações de Narizinho. Líamos e
comentávamos. Fiquei logo íntimo da Emília, do Visconde, Pedrinho, toda a turma
do Sítio do Picapau Amarelo. Comigo, desde então, sempre foi assim, geralmente
faço amizade fácil com as personagens dos livros.
Ricardo e o pai, Graciliano Ramos.
Quando vovó precisou voltar
para resolver uns problemas em casa, prometendo retornar o mais brevemente
possível, andávamos pela metade das aventuras contadas na obra. Eu olhava
aquele volume cheio de páginas em cima da mesinha de cabeceira dividido entre a
falta de coragem de enfrentar tantas letras, e a curiosidade em saber como tudo
terminaria. Resolvi tentar ir em frente sozinho. E logo de cara adorei a
experiência. O sentimento mais forte foi
de independência. Eu podia “ouvir” histórias quando tivesse vontade, sem
precisar pedir para ninguém. Acabei lendo tudo de Lobato, até Emília no país da
gramática, e não fiquei racista pelo que me conste, diga-se de passagem.
Minhas leituras sempre foram mediadas. Papai comprava livros, trazia para casa,
recomendava, discutia comigo e com o meu irmão o enredo, ler sempre foi assunto
de nossas conversas. A gente se emocionava, sofria, comemorava, torcia por
nossos heróis vivos da imaginação. Um dia eu chorei lendo o Cuore, de Edmondo
de Amicis. Fiquei um tempo olhando o livro impressionado. Como uma coisa como
aquela, feita basicamente de papel, podia me tocar a ponto de me deixar tão
triste?
Naquela época as crianças tinham horário para dormir.
Era uma coisa mais ou menos rígida. Às oito e meia da noite, quando tocava a
musiquinha dos cobertores Parahiba na televisão avisando ser hora de dormir,
não esperávamos mamãe mandar, íamos para cama. Mas havia um acordo. Podíamos
ler mais um pouco deitados. E a gente lia diariamente, muito. Quando passava o
tempo permitido vinham dar boa noite e apagavam a luz. Eu e meu irmão ficávamos
quietos, esperávamos o movimento da casa se aquietar, acendíamos então o abajur
e continuávamos. Era comum mamãe entrar no quarto pela manhã e encontrar-nos
lendo. Tínhamos varado a noite. Íamos para a escola insones.
E assim nasceu uma paixão. Até minha adolescência li
com volúpia, obsessivamente, nada me dava mais prazer. Aos poucos, porém, com a
maturidade, minha relação com a leitura ficou um pouco diferente. Precisei ler
alguns textos por exigência profissional. De certa forma essa obrigatoriedade
fez com que aquela febre baixasse um pouco. Ou as melhores personagens não são
rebeldes? Embora ler continue sendo um de meus maiores prazeres, tenho saudade
daqueles momentos tão intensos em que entrava na história e não queria mais
sair. Quando passava o dia alheio, sonhador, vivendo no mundo real a ficção.
Esse sentimento, tenho certeza, empurrou-me para a literatura infantil e
juvenil. Escrevo para aquele menino louco por livros. Eu o encontro em todas as
crianças e jovens que avisto. Eles são eu no meu melhor.
Entre sua obra, estão os livros: Sonho entre amigos, O
pequenino grão de areia, A n@ve de
noé, Vovô é um cometa, O Gato que Cantava de Galo, João Bolão, O livro dentro da conha, Na
travessa da macarronada, O cravo
brigou com a rosa e etc..
Editora Globo reedita biografia de Graciliano e outros livros de Ricardo Ramos
Graciliano: retrato fragmentado
Ricardo Ramos
Graciliano: retrato fragmentado, de Ricardo Ramos, é
diferente de uma biografia em que a vida do personagem é explicitada em
detalhes cronológicos do nascimento até a morte. Como indica o próprio nome, a
história é contada de maneira fragmentada, o que não significa que esteja
incompleta. Trata-se de um retrato profundo, feito por traços generosos,
movidos pela memória afetiva do filho, também escritor, que desenham e destacam
aspectos e momentos desconhecidos da vida de Graciliano Ramos. Aliás, um dos
pontos de partida de Ricardo Ramos foi a constatação de que as várias
biografias do grande escritor alagoano não davam a conhecer o homem por trás da
obra, algo que este retrato desfaz definitivamente ao apresentar suas sutilezas
e complexidades.
De Graciliano Ramos pode-se dizer que é, ao mesmo
tempo, uma figura muito e pouco conhecida. Muito conhecida como a figura do
escritor austero, além de autor de obras fundamentais do romance brasileiro do
século XX, como Vidas secas. Mas dele também se pode dizer que faltam as
nuances, o retrato de muitas facetas, suas dimensões humanas, pessoais. Pois
como resume o autor, “Graciliano não é uma personagem inteiriça, compacta,
quase olímpica, sem a menor sombra de conflito ou dúvida. Não é criatura rude,
sertanejo primitivo e pitoresco, o autodidata que certo dia simplesmente
resolveu escrever. Não é um partidário, cego seguidor da regra política. Não é
tampouco o intelectual cooptado, que teve de se adaptar às regras ditatoriais
do Estado Novo”. Daí Graciliano: retrato fragmentado ser, afinal, um livro de
memórias que resgata e dimensiona para seu autor a figura paterna. Para os
leitores, apresenta sua figura humana, abrindo um ciclo de reedições em torno
da obra de Ricardo Ramos: a editora publicará nos próximos meses Rua desfeita,
Os caminhantes de Santa Luzia e Circuito fechado.
Manuscritos inéditos e prefácio de Silviano Santiago
Título: Graciliano: retrato fragmentado
Autor: Ricardo Ramos
Gênero: Biografia e Memória
Páginas: 272
Formato: 14 cm x 21 cm
ISBN: 978-85-250-5086-1
Preço: R$ 39,90
Graciliano: retrato fragmentado foi originalmente
publicado em 1992, em comemoração ao centenário do nascimento de Graciliano Ramos.
Segundo Rogério Ramos, filho de Ricardo e neto de Graciliano, “pela falta de
tempo, a primeira edição saiu precursora de outra, futura, aquela que todos os
envolvidos queríamos na rede afetiva e familiar que este livro evoca e
realinha.” Quase vinte anos depois, esta é a nova edição. Revista e atualizada
– com prefácio de Silviano Santiago, cujo título, “Colagem viva”, traduz o
livro à perfeição –, é ilustrada com vasto material iconográfico, incluindo
fotos e manuscritos inéditos, além de uma completa bibliografia e cronologia da
vida de Graciliano Ramos. Merecem destaque também as apresentações dos filhos
de Ricardo Ramos (netos de Graciliano), “Editar
é preciso”, por Rogério Ramos e “Escrever
é preciso”, por Ricardo Filho.
Ricardo Ramos Filho
Todos os direitos autorais reservados ao autor.
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