A INUTILIDADE DA POESIA
por RAUL ALBUQUERQUE
São novos tempos e a - pobre? - poesia vem perdendo
espaço. Há mais de cinquenta anos, um livro de poemas não entra na lista de
mais vendidos. Mas é irônico perceber que nestes mesmos tempos modernos é que
ela é mais necessária, pois a catarse é mais necessária em tempos de cárcere.
Em tempos de total conexão, desconectar-se é necessário.
Se perguntam a mim “Por que escrever poesia?”, vêm à
tona milhares de respostas subjetivas. Subjetivas, pois não há um porquê lógico
para produzir arte. A arte em si não tem fim prático. Arte é uma daquelas
coisas que se faz por vontade (ou, à la Schopenhauer, Vontade de Poder), algo
perto do instinto. Poesia é inútil, sempre foi. Até aqui, não há novidades.
A questão atual é que, numa lógica absurda e mal
construída, o que é inútil é imediatamente desimportante. Ou seja, hoje se algo
não tem um fim prático não é importante. Vivemos no tempo da razão utilitária -
onde até a racionalidade foi posta à margem do processo produtivo -, fato que
explica esse desprezo não tão recente à arte.
A constatação, porém, é que as pessoas fazem uso da
poesia não por ela ser útil - pois ela não é - mas por ela ser importante - o
que não depende de sua utilidade. Poesia tem uma finalidade intrínseca e
pessoal, o que foge ao atual conceito de "útil".
Poesia tem duas faces. Uma é apresentada ao poeta, essa
é a face do desafio. É a que apresenta as palavras como meios para chegar a um
fim - que é a própria Poesia. É a que permite libertação em moldes bem marcados
- e por vezes burlados pelo escritor. Outra é a apresentada ao leitor, essa é a
face do descobrimento. É a que disponibiliza um campo minado, onde qualquer
verso alheio pode desencadear sentimentos pessoais e intransferíveis. É o que
dá ao Outro o atestado de insanidade assinado pelo paciente - que piora a cada
verso.
Longe da tentativa acadêmica e falida de dar
"funções" à poesia, a própria história empenha-se em provar que a
poesia apresenta-se no processo cultural como algo importante, mas nunca útil.
A poesia política de Neruda, Nobel de Literatura de 71, por exemplo, foi
importante no cenário latinoamericano durante a Guerra Fria, mas não foi útil.
Despertou o desejo de liberdade do povo, mas não convocou multidões às ruas.
Poesia é, portanto, inútil, mas importante. Algo
impossível para as mentes adestradas e castradas. Não há fim determinado e
comprovável que comporte a poesia. Poesia é vital, mas não é útil.
Poesia... ... não é rentável. ... não vai salvar-nos do
aquecimento global nem da crise financeira. ... não vai trazer-nos a solução
dos problemas da sociedade contemporânea. ... não vai evitar guerras nem
amenizar seus efeitos. ... não vai encontrar a cura do câncer nem da AIDS. ...
não vai acabar com a fome nos países miseráveis.
E talvez até venha a fazer tudo isso, mas, se o fizer,
será feito um poeta por vez, um poema por vez, um leitor por vez, uma
inquietação por vez. Inútil totalmente inútil, mas igualmente indispensável.
Estudante de Direito apaixonado por Letras. Apesar
desse quadro, não acha que está no lugar errado, afinal, o amor às palavras
demonstra-se de diversos modos. Poeta desde que nasceu, mas só começou a
escrever poemas aos sete anos. Apaixonado por livros e música clássica. Sabe
que nunca vai conseguir se definir, logo, fica descrevendo inutilidades da
própria vida em perfis.
Um comentário
Inútil, mas essencial. Afinal na vida o que é essencial é o que faz bem a alma e ao coração. O resto? Ora o resto... Ótimo texto.
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