Invenções de cenas, casos e ilusões
Queria escrever uma peça de teatro somente com três
personagens, ao estilo The Good, The Bad and The Ugly, de Clint Eastwood.
Haveria um conflito maior; os personagens tomariam as cenas por completo. Seria
um emaranhado de diálogos, casos, situações dominantes, aspectos psicológicos,
todos estariam envolvidos, no íntimo, com suas características mais marcantes,
unidos por um fio de confissões e descobertas.
Um divã armado, com lentes e flashes apontados dentro
mundo contemporâneo, das relações virtuais, da intensidade da exposição frente
às telas, aos microfones ou ao consumo que dita as regras do “eu sou”. É o
cotidiano, as angústias, a incapacidade de adaptação, o processo dolorido de
não se sentir quem se é de verdade. É a exposição e expiação da busca de si
próprio; é a adaptação à vida supérflua do outro, que também o espera como a
salvação compassiva para os erros e a busca insana pela perfeição que não
existe.
Três personagens, a um só tempo, descobririam que não
vale a pena buscar mundos e pessoas perfeitas - uma mostra equivocada da arte
feita e para pessoas reais, mercadoras de ilusões, que vendem sonhos e
discursos prontos, manuais ques na prática, não funcionam. A verdade é que
todos precisam se adaptar dentro da urgência da modernidade, aos ditames
pós-modernos – palavras e conceitos bonitos que se afiguram como o esporádico
que emerge com o fulgor das sensações; a busca do sentido; o poder da
personalidade; uma esperança para um futuro que solucione todos os problemas,
pois já temos solução e tecnologia para quase tudo – necessitamos somente do
tato e testar nossos sentidos num gesto coletivo, numa esfera que se entenda de
gente, que o principal motivo sejam as pessoas, para não corrermos o risco de
nos transformarmos em máquinas pensantes.
Continuariam, a passos lentos, os três personagens no
movimentos aleatório da busca, do entendimento através das suas histórias,
pois, reconheceriam que, no íntimo, seriam desconhecidos de si. Nem mesmo
possuíam uma identidade reconhecível, adaptável entre eles, estranhariam-se a
cada ato.
Antes da peça terminar, desejariam voltar para seus
lares confortáveis, a realidade do palco se vê que é algo assustador, não é só
representar e andar para os lados, gestualizar, externar o que se tem vergonha
de mostrar, é sobretudo um desnudamento para estranhos, um reboliço que
causaria suas vergonhas. Não mais definiriam como seriam ou lembrariam o tom
dos seus rostos, poderiam até esquecer, mentir, desviar, afinal, estariam
dentro de redomas de diálogos impossíveis. Seria mais fácil se ausentar e
voltar quando quisesse, teria-se o controle nas mãos – e não é bem assim que funciona.
Estar no palco é viver, sentir, encenar, trazer o mundo
seres estranhos, esquisitos, que nem conhecemos (é como uma fera anjaulada que
prende os dedos, encaixados, nas grades quadradas das janelas pesadas); é uma
mistura do que se prova, do que se tem para comer, dos sentimentos, do grito,
do desejo de sumir para se encontrar em outros palcos, levando outra vida na
mala, ainda que seja inventada.
Imagem: Robert
Doisneau, Sabine Azéma and the truss supplier, May 1985
Patrícia Dantas-Paraibana, blogueira e escritora.
Cursou História (UFPB), pós-graduação em Turismo (UFPB) e cursando
pós-graduação em Marketing (Verbo Educacional). Adora viajar, blogar, redes
sociais, o real e virtual, se conectar e desconectar do mundo. Atualmente
possui os Blogs Poesia e mais nada e Patrícia Dantas. Atualiza semanalmente!
http://patriciadantas01.blogspot.com.br/
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