Marcos Rey e a cidade que cresceu com ele [Cláudio Portella]
ACERVO PESSOAL/ PALMA B. DONATO |
Falecido há 15 anos, o escritor de clássicos como ‘O mistério do 5 estrelas’ fez da cidade de São Paulo órgão vital de sua criação
por: Cláudio Portella
Quem estava na região central da cidade de São Paulo no dia 11 de abril de 1999 e olhou para o céu, movido pelo barulho de um helicóptero que sobrevoava baixo a região, viu espantado uma senhora espalhando as cinzas de Edmundo Donato sobre a cidade. Pelo nome de batismo poucos sabem quem é ele. Mas muitos reconheceriam com o pseudônimo que ficou conhecido: Marcos Rey. Escritor proeminente, publicou uma vasta obra, incluindo romances adultos e juvenis. Nascido em São Paulo em 1925, não parou de produzir em nenhum momento, assim como a cidade que se ramificava em seu corpo.
Nos anos de chumbo da ditadura escreveu dezenas de roteiros de pornochanchadas para produtoras de cinema. Sobretudo para a paulistana Triunfo, integrante da Boca. Viveu alguns anos exclusivamente da atividade. O inseto do amor, Ainda agarro essa vizinha, Sedução, A filha da cafetina, Lua de mel e amendoim são alguns dos roteiros.
Tudo o que aprendeu sobre a técnica de escrever roteiros para cinema e televisão resultou no livro O roteirista profissional, destinado a curiosos e estudantes de comunicação. A publicação chegou aos meios universitários, e, por conta dela, Marcos Rey deu aulas sobre roteiros na Faap por quatro anos. Como publicitário trabalhou em várias agências de São Paulo nos anos 1950. Foi o primeiro autor a levar para a literatura termos como job, layout, media, copy, marketing e merchandising. Seu romance Entre sem bater tem uma agência de publicidade como cenário central.
Boêmio, frequentador da noite paulistana. Não perdia um show nas boates Oásis, Excelsior, Hugo e Lord. Foi na cidade de São Paulo, principalmente na noite da qual era protagonista, que encontrou muitos dos personagens que depois levaria para seus textos: cafetinas, brigões, prostitutas, vigaristas, otários, coronéis, jogadores, tiras, alcaguetes, vadios, novos-ricos, ébrios, solitários, aristocratas decadentes etc. Nos contos revelava a face oculta da metrópole e nas crônicas o lado pitoresco e memorialístico.
Quando convidado pela editora Ática a escrever literatura juvenil para a coleção Vaga-lume, viu no convite mais uma possibilidade de retratar São Paulo, sempre presente como cenário de seus livros. Sucederam-se então uma série de títulos juvenis, todos de grande sucesso: O mistério do 5 estrelas (bestseller de 1981 e que até hoje já vendeu mais de um milhão de cópias), O rapto do Garoto de Ouro, Um cadáver ouve rádio, Sozinha no mundo, Dinheiro do céu, Enigma na televisão, entre muitos outros.
Para se conhecer a sociedade parisiense, segundo Engels, o bom é ler Balzac a qualquer sociólogo. O mesmo pode-se dizer de Marcos Rey: para conhecer a metrópole paulista, o melhor é ler sua obra literária. No autobiográfico O caso do filho do encadernador, falando de Francis Scott Fitzgerald, Marcos Rey indaga sobre o que é ser um grande escritor. Responde ele mesmo: “Talvez o máximo que um escritor possa ser é o espelho de uma região ou país em determinado momento”. Sendo assim, é ele o espelho da São Paulo da segunda metade do século 20.
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