O MENINO QUE CARREGAVA ÁGUA NA PENEIRA
Manoel de Barros
Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino
que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira
era o mesmo que roubar um vento e sair
correndo com ele para mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo que
catar espinhos na água.
O mesmo que criar peixes no bolso.
O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.
A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio
do que do cheio.
Falava que vazios são maiores
e até infinitos.
Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito
porque gostava de carregar água na peneira.
Com o tempo descobriu que escrever seria
o mesmo que carregar água na peneira.
No escrever o menino viu
que era capaz de ser
noviça, monge ou mendigo
ao mesmo tempo.
O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
o menino fazia prodígos.
Até fez uma pedra dar flor!
A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou:
Meu filho você vai ser poeta.
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher os
vazios com as suas
peraltagens
e algumas pessoas
vão te amar por seus
despropósitos.
Manoel Wenceslau Leite de Barros,ou Manoel de Barros, nasceu
em Cuiabá (MT) no Beco da Marinha, beira do Rio Cuiabá, em 19 de
dezembro de 1916, filho de João Venceslau Barros, capataz com influência
naquela região. Mudou-se para Corumbá (MS), onde se fixou de tal forma
que chegou a ser considerado corumbaense. Atualmente mora em Campo Grande (MS). É advogado, fazendeiro e poeta.
8 comentários
Amei, pura metáfora!!! Gênio da poesia!!!
!!?
Achei muito interessante, que uma crianca possa pensar assim.Muito lindo levar o conhecimento as pessoas.
Amei esse texto ele e muito limdo
Lindo poema. Me recorreu os tempos passados da velha infância.
Lindo
E mesmo
Lindo *
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