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Máquina de escrever de Manoel de Barros |
Jornalista e escritora defende tese para livro
reportagem sobre "Os Outros" que habitam Manoel de Barros
Ela quer desbravar Manoel de Barros e destrinchar os
inúmeros outros que existem dentro do poeta e escritor mato-grossense que agora
reside em Campo Grande. Para realizar esta caminhada rumo ao encontro do que
representa tantos outros dentro de um gigante da literatura, ela caminhou de
Mato Grosso do Sul até o Rio de Janeiro e conheceu aqueles que o cercam em
vida. Com a veia literária latente, a jornalista e escritora cuiabana (que por
sinal nos brinda com seus textos como repórter do Olhar Conceito), Stéfanie
Medeiros, defende a sua dissertação de conclusão de curso de jornalismo na
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) nesta segunda-feira (24) às 11h e
que será publicado posteriormente em um livro reportagem. A tese "Os
outros - o livro reportagem como plataforma para a construção do perfil de
Manoel de Barros" foi orientada pelo professor MS. Ailton Segura.
Stéfanie tem grandes olhos questionadores e curiosos
que entregam a sua vontade de discorrer sobre o mundo com as suas experiências
particulares. A escolha por Manoel de Barros aconteceu com o seu primeiro
encontro com o escritor, quando em um momento difícil encontrou alento nas
palavras do poeta, que a fez abrir estes olhos curiosos para um mundo novo de
possibilidades. Era o encantamento com a poesia que fez florescer uma relação
entre leitora e escritor. A inspiração para desbravar esses outros surgiu do
poema "A maior riqueza do homem" (na íntegra ao final da matéria).
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Manoel de Barros quando jovem |
Mesmo sem conhecer Manoel, Stéfanie já se colocava a
criar em sua imaginação, como viveria o escritor, como era o seu ambiente
particular. Afinal, precisava entender tudo isso para conseguir decifrar um
pouco deste talento literário que a presenteou com diversos poemas, mas elenca
o seu preferido como o poema de Bernardo, com sua inocência e naturalidade, com
pássaros que pousam em seu ombro.
Sua relação com o Pantanal foi entendida melhor pela
jovem estudante quando pelo Olhar Conceito foi desbravar a terra que originou
muitos poemas daquele descobridor, e pode vivenciar a calmaria, a natureza, o
voar sincronizado dos pássaros, o tempo que corre devagar, o rio que leva
consigo a vida. O encantamento estava concretizado. O Manoel de Barros, o
Pantanal, a simplicidade da poesia colorida que ganhava seus dias. Pronto. Não
havia retorno.
Era preciso destrinchar esta relação, este afeto que
encontrou em palavras até então desconhecidas, mas que revelaram o mundo. Com
muita coragem e determinação, começou de forma sensível a abordar o artista.
Como chegar até Manoel de Barros? Como conseguir uma entrevista? O escritor
está com 97 anos e com a saúde comprometida. Não seria fácil.
Com as letras a borbulharem em sua mente, decidiu que a
abordagem seria pelo caminho comum aos dois: a escrita. E foi através de cartas
enviadas no decorrer de um ano, que Stéfanie tentou se aproximar de Manoel de
Barros. Enviou pedaços do que é, do que faz e o que a motivou a querer conhecer
mais sobre os outros que habitam o escritor. Entregou seu coração nas folhas de
papel que enviou e esperou por uma resposta que nunca chegou.
Tentou o telefone. Ouviu a voz de Manoel de Barros no
fundo a orientar a esposa para dizer que a jornalista procurasse um tal de João
Balão, que por coincidência do destino foi padrinho de casamento dos tios de
Stéfanie.
O empurrão foi o passo necessário para ir de encontro a
este caminho. Com um primeiro contato feito, agora era preciso caminhar em
busca destes retalhos de Manoel, como a escritora revela, e assim realizou
entrevistas com Martha Barros no Rio de Janeiro, com o irmão de Manoel, Abílio
Leite de Barros e o amigo de longa data e jornalista Pedro Spíndola em Campo
Grande.
Manoel de Barros e o amigo Pedro Spíndola
Foram muitos percalços para conseguir retratar um pouco
destes tantos outros que habitam no escritor. A filha Martha Barros tentou
dissuadir a jornalista a prosseguir com seu caminho, dizendo que não era
importante: a obra de Manoel era maior do que o escritor. Mas, com a teimosia
inerente de todo bom jornalista e escritor, prosseguiu com afinco em sua
pesquisa e recebeu informações preciosas de Spíndola que cedeu um acervo rico
do poeta, com anotações, diários, publicações, entre outras coisas.
O Manoel de Barros, não chegou a conhecer, apesar de
contemplar a sua casa de fora em Campo Grande, como parte de uma história que
não pode vivenciar. Agora, este retalho está formado em livro reportagem à
exemplo do que Gay Talese fez no perfil de Frank Sinatra, que não chegou a ser
entrevistado, apenas descrito pelos outros que o acompanharam em vida.
A jornalista Stéfanie Medeiros durante suas desventuras
pelo Pantanal de Manoel de Barros
A defesa da dissertação “Os outros - o livro reportagem
como plataforma para a construção do perfil de Manoel de Barros” irá resultar
na conclusão do livro reportagem, que Stéfanie estuda meios para a publicação.
O acervo cedido por Pedro Spíndola será devolvido no primeiro semestre deste
ano, porém, a jornalista realiza um trabalho de digitalização para tentar
parceria para expor todo este conteúdo digitalmente.
Os seus caminhos a fizeram encontrar o Manoel do papel,
o da sua imaginação, e um olhar por dentro da fechadura de sua vida para
desbravar o que é e foi real em sua vida de escritor e poeta. O resultado? Logo
será conhecido do público quando o livro for publicado e revelar mais dos
Outros Manóeis que habitam no poeta e em todos os seus leitores. Mesmo não
conhecendo em carne e osso, toda a experiência a fez se aproximar como se
fossem velhos conhecidos, a dividir silêncios, um café e poemas sobre as
desimportâncias da vida, na cadeira de balanço a contemplar passarinhos e
árvores, no caminhar preguiçoso dos dias tranquilos e pantaneiros.
Cercada pelos livros e universo literário, jornalista
mergulhou na poética de Manoel
A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.
Não agüento ser apenas um sujeito que abre portas,
que puxa válvulas, que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem usando
“A maior riqueza do homem”, do livro “O retrato do
artista quando coisa” (1998).
Marianna Marimon,
23 anos é escritora desde que se entende por gente, quando aos seis
anos de idade já arriscava poemas na máquina de escrever da sua mãe. A
paixão pelas letras a levou à profissão de jornalista e busca unir as
duas vertentes para produzir textos que possam provocar sensações e
inquietações.
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