Roubando
livros para sonhar
Obs.: No mês da criança,
um recorte da vida infantil e o seu “vínculo” com a Literatura. Um texto para
os escritores refletirem sobre os seus textos e os seus destinatários. Uma
história verídica.
***
Certa vez, em sala de
aula, notei que alguns livros que guardo em uma biblioteca particular da sala
(caixas de papelão com livros) estavam sumindo. Não podia acusar nenhum aluno,
pois eu não sabia quem era a criança. Passei a ficar mais atenta. Distribuía os
livros e olhava. Sentava no pátio da escola, levava toda a turma sem mochila e
ficava atenta. Mas não conseguia perceber que estava levando os livros para
casa. Mas, foi num dia D que descobri. Porém, eu não fiquei espantada ao saber
quem era a aluna em questão, mas fiquei pasma com a resposta ao qual ela me
deu.
Chamei-a para uma conversa
particular. Quando todos saíram para o recreio fui ao ‘ataque’, mas quem saiu
ferida fui eu. Primeiramente eu indaguei a ela sobre o que estava acontecendo
(já havia abordado esse assunto em sala de aula), sobre os nossos livros que
estavam sumindo da caixa. Perguntei sobre o que ela ‘achava disso’ e ela nada
disse. Permaneceu com a cabeça baixa. Muda e calada. Depois eu fui ‘obrigada’ a
revelar a minha descoberta (vi a menina pegando um livro pequeno e escondendo
dentro das calças). Disse que se ela quisesse, poderia pedir emprestado, que eu
ficava feliz em saber que uma aluna minha gostava de ler (e ela nem lia tanto
assim na sala de aula). Depois perguntei o porquê dessa atitude. Nesse instante
ela encheu os olhos de lágrima e revelou:
- É para matar o tempo.
- Qual tempo? – indaguei.
- Enquanto a minha mãe
recebe aquelas visitas à noite.
- E o que tem “essas”
visitas? Você lê para elas?
Ela corou e deu o golpe
fatal na professora:
- Não! A mãe manda a gente
sair da casa, ir pro pátio e ela fica lá com eles e aí eu leio para a mana
(irmã menor) para ela não ficar ouvindo aqueles barulhos lá de dentro.
Fiquei sem responder. E
ela continuou:
- Quando eles vão embora
eu volto pra casa e ajudo a mãe a arrumar o nosso quarto (dormiam todos juntos:
mãe e filhas). Aí eu durmo pensando na história do livro. É isso o que mãe me
manda fazer, sonhar com o livro. Espero que a minha mana sonhe com ele também.
E eu passei dias e dias
tendo pesadelos.
Cláudia de Villar é professora, escritora e colunista.
Formada em Letras pela FAPA/RS, especialista em Pedagogia Gestora e em
Supervisão Escolar pelo IERGS/RS, também atua como colunista de site literário
Homo Literatus e Jornal de Viamão do RS, além de ser pós-graduanda em Docência
do Ensino Superior (IERGS/RS). Escreve para diversos públicos. Desde infantil
até o público adulto. Passeia pela poesia e narrativas. Afinal, escrever faz
parte de seu DNA.
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