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Pedro Du Bois [Poeta Brasileiro]


Pedro Du Bois, poeta e contista. Nascido em Passo Fundo-RS em 1947. Residente em Balneário Camboriú-SC. Vencedor do 4º Prêmio Literário Livraria Asabeça, Poesia, com o livro " Os Objetos e as Coisas",  editado pela Scortecci Editora, SP.  Tem publicado pela Corpos Editora, Portugal,   A Criação Estética e, pela Sarau de Letras, Mossoró, RN, o livro Seres; também, editor-autor, com diversos livros editados artesanalmente, em edições mínimas e não comercializáveis.    

A DENSIDADE DO SILÊNCIO

4
Em nenhuma hipótese
confessa. Desconhece do ato
                 o crime. Desfaz no gesto
                                            a culpa.

O silêncio incorporado ao tipo.
Fecha os olhos. As mãos entrecruzadas
sintonizam o nervosismo.

Confessa-se ao deus
interior. Em silêncio
             se diz
             inocente.


GRITO

 Estão juntos e únicos: a separação
 fadiga os corpos. A união descansa
 os espíritos.

 Repetem a junção dos dias
 felizes. Cessam os murmúrios
 e em sussurros dizem
 da unidade.

 A partilha inicia pela separação
 dos corpos: leva o sorriso.
 Deixa o inacessível grito na garganta.



A BOA LUTA

Por tudo isso
lutamos nossas cantorias
diariamente estendemos glórias
em caminhos rápidos e desaprendemos
os mistérios; retornamos o necessário
ao reconhecimento e voltamos
ao desconhecido: lutar o bom sentido
das palavras: mentir palavras sob novos
nomes: nominar o gesto e desfazer o nó
que nos prende ao nada.


A CASA

A recordação da casa indiferente ao mundo
de hoje. O dizer as coisas sem necessidade.
A ocasião do ladrão em disparada. O olho
do dragão de jade. Pela janela vislumbro
o tempo: a imobilidade. Rosto colado
ao vidro me desenho fora. O projeto
da casa não concluída. O sonho
recomposto no gesto habitual da espera.
O discurso e o método aprisionado
em calma: a colina transposta em luzes.

Recordo o dia da partida:
                           o tempo chuvoso
                           o calor aproximado
                           o abraço e o beijo.

A recordação da casa indiferente
ao todo começado.


ADEUSES

  De todos os adeuses somos testemunhas
 peregrinos de escuras vistas dos desencontros
 entre dunas e fechadas florestas petrificadas
 dos sinais compreensíveis de abrir e fechar

 vamos embora ao tempo: têmpora cinzenta
 o corpo dói a despedida na dor da ausência

 nos reencontros na frustração avistamos
 e reconhecemos não nos interessar o passo

 o atraso bem vinda forma de desencantos
 na urdidura de novas despedidas: somos
 os que foram embora e ainda não é noite

 nos adeuses voltamos nossos passados
 de encobertas memórias: estreitas ruas
 sem passagens e os olhos sobre os idos
 tempos. Acenamos sem voltar o rosto.


ANGUSTIOSA HORA

 A angústia antecipa a espera
  valise e mala
 enfileiradas
 aguardam o embarque

 antes da hora
 curiosa espera
 angustiantes passos
 e vozes

 não deixar a hora
 escondida na valise

 perdida hora de angustiosa espera.



APRENDENDO A VOLTAR
VIII
ao menosprezo antecipo mágoas
guardadas em cinzas de fotografias
oferecidas ao vento na passagem

três quartos da vida
percorrida: espera
adiada em cada paragem

do menosprezo aumento a sensação
na volta preservada em óleos elastecidos
no fundo do copo: o óbolo
é lembrança exposta à volta

quartos de hora
preenchidos: igualo o corpo
no som do quanto e me instalo
em olhos fechados ao futuro

vejo o casal sentado no batente
da porta de entrada: comunhões
desconexas antes se acabem os pares.

BRANCO

Alvo da investigação
miro o corpo
e atravesso as cores
onde se esconde.

Branco: o susto invade
              o dia sem segredos.

              Observo o olho semicerrado
              com que a arma mira
              o condenado.

Branco: a memória cede espaço
              ao presente. O tiro parte.

              Olho o alvo investigado
              na constância do pecado.

Branco: intercalada cor
              sem novidade.


CONTRÁRIO

Ao contrário do que foi dito
                                      digo
                   sobre a inexorabilidade
                   com que os fatos
                   me trespassa. A permanência
                   desobediente aos termos se completa
                                                                    no espaço.

O espelho, na reflexão da imagem
traduz o senso automático da visão:
o repositório acobertado no silêncio
da criança que dorme.

Digo, do contrário, a ilusão
de chegar e partir itinerários.
Trajetos desditos em obrigações primárias.


DE PAPÉIS VENTOS E BAILARINAS

O vento sobre o desenho
faz dançar a bailarina
desenhada na pretensão
de ser ágil
leve
e solta

a bailarina sobre o papel
desenha auroras e piruetas

sobre o desenho
na folha de papel
o vento traça curvas

a bailarina se recurva
quando a folha
vai ao chão.


ÉPOCAS

Desdobrada vida: introduzida
época de conquista: medos
e persas em desabalada fuga
- o egípcio olha
com desdém e desgosto -
de hinos e cânticos
escondidos em escuras roupas
e promessas não alcançadas:

credo fé e enlace
entre a história e os vencedores
das batalhas em corpos mutilados
e destroços céticos: em nada
acreditam os deuses desde o exílio
houvesse a volta e o planeta
- mágica e mistério - tomasse
outro rumo alterasse o prumo e o eixo
endireitasse: o fogo e as trevas
em desdobramentos
de inépcias conhecidas.


PARÁBOLA

Atravessar o rio
          submergir na terra
          consumida pelos passos.

          Repassar a lição de casa
          no repetir à náusea
          os quatro pontos cardeais.

Orar ao deus
que se apresenta
em pensamento: atentar
                              ao demônio
                                  a desconstrução
                                     do tempo.

Arremessar o corpo
ao rio de águas turvas
e o purificar. Retirar da terra
o ressecamento e deixar o húmus
                                na passagem.



PROVÁVEL

 Probabilidade: amanhã acordaremos
na mesma hora. Diremos palavras.
Sorriremos faces. Espalharemos
as cobertas sob os corpos. Transitaremos
caminhos conhecidos. Reiteraremos
verbos conjugados. Diremos os bons
dias necessários ao convívio.

Diremos adeuses tantas vezes
forem as separações. Os reencontros
de abraços e beijos: a probabilidade
de irmos juntos para a cama ainda
desfeita na manhã.



SEDE

Minha sede
extravasa o copo
derrama sobre a pedra
e a resseca
como solo
desértico: minha sede
                            abarca
                             mares
          abarrota armários
          sensibiliza a carne permitida:

              minha sede multiplica
              a sede e faz da hora
              o exílio

minha sede resseca minha boca
de palavras.


ÁGUAS PARA VIRGÍNIA

Houve razões para você entrar
no rio e submergir em suas águas
escuras maneiras de dizer adeus

o corpo descoberto encoberto preso ao fundo
pedra lapidada no extremo da consciência
passos decididos um após o outro
sem arrependimento ou sofrimento a morte
se apresenta com seus fantasmas zombam
da nossa fraqueza e no que riem alentam
forças com que nos apagamos e seguimos

fria água que acolhe o corpo na entrada
e se desdobra na frieza da alma trazida
pela vida mínima e o olhar absorto morto
ultrapassado na disposição de estar viva

houve razões para que a água cobrisse
a imagem refletida na entrada
como pedra submergisse e no fundo
o lodo galhos retivessem a última
vontade em que se transfigurou sua face.


CORDAS   

            a corda inelástica
            estendida
            tensa
            tensionada

            o acorde
            o som
            o estrondo quando se rompem
            vidas encordoadas
            em notas não musicais

            a corda se faz ouvir
            enreda
            enforca
            sufoca
            rasga a pele e se aprofunda
            em cordas interiores

            desafios maiores

            âmago onde as cordas
            se recolhem.


DO QUE DISSERAM

Sempre me disseram: seu tempo
surgirá quando menos esperar,
sua hora guardada ao acaso da lembrança
e sua vida se revelará no instante anterior
ao hoje; o que me disseram é o vazio do ocaso,
o fim não iniciado, a mentira cristalizada
em cenas não desenvolvidas: o que disseram
da significância da espera, frágil inconsistência
da hora marcada pela morte prevista
e agendada em passos lentos ao anoitecer:
sempre me dirão as palavras repetidas do gesto
disposto em ondas espiraladas, o imenso
e árduo caminho não percorrido dos labirintos
desencontrados: vá e fique no aguardo
da resposta, vá e veja o longe da esperança,
vá e seja o corpo imóvel do movimento
inconstante das respostas: vá e diga, fui
ao encontro de mim mesmo e estou perdido.

Pedro Du Bois
Todos os direitos autorais reservados ao autor

2 comentários

Pedro Du Bois disse...

Caro Daufen, o prazer e a honra são meus por estar em tão boa companhia. Gratíssimo. Abraços, Pedro.

krika disse...

Gostei muito da escrita, da intensidade assumida e dos sentidos despertos durante a leitura ..."Vá e diga, fui ao encontro de mim mesmo..."

Parabéns. visitei seu blog e já estou seguindo

paz e bem