Sponsor

AD BANNER

Últimas Postagens

Patrícia Porto [Professora, Escritora e Poeta Brasileira]

Patrícia de Cássia Pereira Porto. Professora e pesquisadora com Doutorado em Políticas Públicas e Educação, formada em Literatura, Poeta, cronista, contista e aprendiz de dançarina nas vagas horas.




Poesias e textos de Patrícia Porto.



Montanha ou mar?

 
Montanha, Mauá, amo... E Minas?! Não sou mineira, mas quase... Adoro o interior - principalmente. É como conversar de perto com Guimarães Rosa. Mas também sou na verdade uma sebastianista, vivo de saudades de São Luís do Mar-anhão. E minha família veio de Portugal, do Porto, “pois pois ” também sou Mar.


Noites ou manhãs? Mais mariposas ou mais bem-te-vis? Noites – longas, intermináveis, com lua, estrelas, grilos e sibilos – essas patetices de poeta. Pelas manhãs sou felina, como meu signo, dou rugidos, resmungo... É a melhor hora pra me passar a perna. Só começo a existir mesmo depois das 10:00h, mas... trabalho, faço café, levo filho na escola, etc.

A vertigem de uma paixão? Ou o aconchego de um amor? Os dois. Apaixonar-se continuamente pela mesma pessoa.

A razão e as cicatrizes dizem o amor? O meu amor é lúdico, adora dar risadas.
Disse a cigana a alguém que acabara de sair arranhada: "Uma nova paixão!"
Ela protestou assustada!

Quero um amor com gosto de café com leite! Café com leite? Acho que essa sou eu. Simples como um largo de igreja, diria o Oswald de Andrade.

Usará perfumes para aguardar notícias? Eu sim. Gole a gole...


Dizem que fé é a vontade de estar feliz. Então eu acredito.!”




enquanto a terra durar...

quando a folha seca da terra chegou,
a menina acordou em seu quarto de brincar raízes,
mas já não haviam paredes nem pertences,
nenhuma dor lhe atravessava do atalho - ao gatilho do mundo.
Os olhos viajando para o céu onde diziam morar anjos se esquivavam do saber.

Esvaziados sótão e porão da velha estrutura, a menina era ela mesma o esplêndido brincando com suas horas desertas, seus brinquedos de existir.

Amigos imaginários caminhavam entre as árvores, limpando a vista,
flutuando entre os escassos de seus dedos, transitam onde gotas gentis cintilavam.   

Do lago emerge o fundo da face daqueles que lhe deram a superfície.
Nas trincas do solo, a floresta - que a alimenta de vida - traz também os nomes dos que ficaram na guerra.
Há medalhas sim, pois podaram para fazer crescer.
Mamãe, onde você está?
Na busca do que transcende a viagem do olhar: há bonecas e flores de lótus.
Papai, por que você não voltou?

Levaram o seu quarto e lavaram seus cabelos entre claros e escuros.
Entre os remendos de seu tempo de achados
enlaça com seus braços a última lua de salvação,
pois a noite é segura e não há luzes nem pessoas artificiais.
Abastece de origens e  baobás seus velhos jogos de Infância.

O pai e a mãe na porta que se lacra é um feixe e a chuva é cinza.  Parecem protegidos nos porta-retratos de dormir. Um beijo de boa-noite sela suas chances de encontrar...
E passos sobem os degraus a destruir reminiscências...
No topo da escada um aviso e o vazio dizem: não entre!

Aqui sobram medalhas de feitos de guerras,
e o tempo-espantalho assombra a cadeia de balanço.
Na parede em solidão a cortiça de imagens de seus olhos
veem o pó no desbotado, esfarelando em suas mãos a gravidade – a rochosa – o solo  desgastado de prover.

As manhãs onde ela desenha agora andam em círculos
e constroem de sombras sua sentença, seu direito, seu destino: o etéreo do olhar.
Ninguém voltará da guerra. Dizem...

Todos se foram para o dentro do lago de suas longas memórias!
Todos contam, sussurram, narram feitos heroicos.

E ela está só, só em si mesma, só em explosões de cores e sentidos,

ela está a revolver a terra, a revolver o rapto de sua jornada pela criança que no instante,  pelo decreto do afasto, se ausenta para viver pavios e verdades fabricadas.
Ela está só no seu mundo de girar e o tempo é a pedra da Terra. Tanto bate!...
Do carrossel uma peça, um estilhaço de Marte,
um pedaço de lembrar os dias de brinquedo, os ecos de brinquedo, os sonhos de brinquedo,
os verdes de brinquedo, as estações... É velha a construção que vem rompendo...
No vento do norte o eco:

                                        “papai e mamãe não vão voltar...

                                          papai e mamãe não vão voltar...”

   



Amigos.


Os amigos são como cofres
que nos permitem segredar nossos delírios,
que nos permitem guardar nossos desejos
e agradar todos ouvidos
só de mentiras e doces acomodações:

“Como você está bem! Emagreceu! Está mais jovem!

Está com cara de quem viu passarinho verde!
Deve estar amando.”

Os amigos vivem de si para com eles mesmos
e vivem para que possamos subtrair deles
a última nota lírica da nossa própria existência:

“_ me dá cá a tua mão, meu amigo, minha amiga...
Não chora que eu choro também.”
“Vai passar... Tudo bem. Estou aqui.”
“Como gosto de rir com você!”

Os amigos são assombrações que nos intimidam
quando cometemos erros (que culpa!): “fumando de novo? comendo outra vez?”
São responsáveis pelo acesso a uma inconsciência muito íntima: “tive um sonho revelador, eu sei que são duas horas da madrugada, mas preciso te contar...”
Os amigos são como as coisas que eu não digo,
mas permanecem grudadas na mente: para sempre - o sempre - quem saberá dizer?

Poderemos ficar meses ou anos sem nos ver e ainda assim
inexorável é saber que há sempre o tempo da redescoberta.
Pois para os amigos somos sempre repletos de infância,
de lúdicos sinais.

São pérolas,
os amigos são pétalas, pedacinhos de pão
a nos guiar no caminho de volta - ou pra longe de casa:
depois do bar, do choro, da festa, da agonia.

Lá estão eles: a nos matar a fome, a solidão, o medo dos imprevistos,
a nos alimentar a vida só de amor, abraço e bondade.

Patricia Porto


Quem semeia o amor...

Para semear brisa eu colho os olhos de meu amante.
Planto estrelas no céu, vejo mudanças ao mar.
Para semear o amor não sei da tempestade.
Na minha madura idade gosto do colo: o amor.
Na cama suave, gosto dos pés que me acolhem o quente.
Teus pés amados: um novo país, é o que chamo de terra pacífica.
Não sei mais do tempo a tempestade,
minha hora é o quando e o quando é se te vejo o retorno.

Minhas sementes foram lançadas no chão,
de onde me sustenta o caminho me faço o amor.
Não sei de nenhuma natureza que em mim
seja somente a selvagem.
Sou a mãe de meus filhos, cuido do meu jardim
e na minha madura idade os riscos são amenos,
trazem chuva fina e café com cardamomo
- que eu bebo com gosto.

Serenando, gotejando na minha nova alma de sentir,
a chuva traz bonança, mesa farta,
crianças correndo em volta da vida.
A ventania é senão de alegria, semeia paz,
colhe o amor de pijama, aparando a grama no quintal.
Nada mais sabe sobre destruir casas
ou quebrar corações.
Meu sopro é frágil, feminino,
colhe serenos, alfazemas, poemas
e rimas assim - frágeis também.
De loucura extrema, paixão violenta,
feitos de sangrar o outro por posse e desejo, nada mais eu sei.

Na minha curva idade, meu amor é quieto,
fala mansidões, escuta o vazio,
separa os pães e sorri, plantando mel e mar
no meu corpo de histórias.
Semeando os dias, o amor de meu amante
colhe ao nascer do dia o puindo da roupa
e ao cair do sol planta cúmplice nossa lealdade.

Nada sei da carne sedenta a paixão.
Sei do ouvido o perto, o beijo;
partes de ti, partes de mim - todas sabidas -
na cantiga de ninar que sempre abranda a tempestade.

Patrícia Porto


Porque o amor é e não é Fugaz.

Porque o amor é e não é Fugaz.
Depois de conviver com você durante horas, poucos dias, a distância tomou o nosso espaço e encaixou entre nós a saudade. Imaginava um dia que em mim erguesse esse monumento chamado “amor”. Desconfianças de conchas, imensidões de areia... Mas enfim, abandonada de minhas quase certezas, atravessaria a baía em forma de ponte emergindo das ondas, para me desfazer em pequenas espumas provocadas pelas barcas. Escoraria meus braços em estacas e nos rangidos da atracação seria a ligação com os terminais. Eu, terminal e germinal. Um barulho proporcionado pelo metal e madeira no encontro da embarcação.

À noite nenhuma estrela e o dia de nublados com a informação da chuva sem o aconchego do lar. A fome veio sem notar sabor, o corpo sem a sensibilidade, o poema esquecido sem o fôlego da alma e a mãe que deixou para trás seu filho por algo melhor para ambos, se arrependeu e não pôde voltar. Era tarde, seus seios murcharam de dor.
O mundo sem as cores vivas da natureza seguia as horas com os minutos demorados da pulsação do dia; e todos em volta continuavam numa marcha veloz. E a semente de flor sem a vontade da vida a amanhecer-lhe de esperança frente à brutalidade do asfalto. Barulhenta e cinza a cidade prosseguia. O tom único da sobrevivência vinha então no simples, na rotina, no ato de obrigação cotidiana e assim o tempo iria preenchendo e insuflando o corpo como um simples miolo de pão, dando de comer aos passarinhos do estômago

O amor não lhe pertencia. Não sabia, não sabe de você a estranheza que te habita. Não sabe onde está se envolvendo, se engajando. Mas digo sempre, há avisos, avisos de cuidado na porta: mantenha certa distância no início, vá mais devagar... Este ser que habita este amor é mais frágil que o mais frágil dos cristais mais finos. Toda sua força é ser frágil e ser frágil é a sua única linguagem.

Feito novo habitante da casa-amor, ele se alimenta do mundo ao redor, que o sacia de calor e de aguardos, vozes que lhe dizem ao corpo palavras sempre estrangeiras. No vitral, a imagem é que ilumina a suavidade das mãos duras do tempo, mas agora amansadas, amassadas em si mesmas, deixando escapar pelos dedos a areia movediça da ampulheta que não dá mais conta do mistério e da obsessão do tempo. Ele, ela é fugaz, é fuga da morte e fogo de renascimento.

O mundo é todo o silêncio da madrugada, o silêncio vermelho que se aproxima da vidraça do apartamento, avermelhando de luz a fresta, a pouca viagem de luz. E o sono, embalado dos amantes que se sentem sempre últimos e primeiros; este desconhece os sonhadores, pois não sabe do invento a saudade. Hoje adormecido o amor que ficou longe, mas próximo, transforma o tempo em sonho e o sonho é a passagem, é o amor ao lado, do lado de dentro - guardado intacto e sempre precioso.

Patrícia Porto


Espólios.

No acervo da casa grande
lá se amontoam esqueletos de objetos particulares:
pequenezas, miudezas, pequenas confissões dos muitos e presos,
de todos os respectivos fantasmas,
roendo em pós os pés dos móveis
respectivamente familiares.
Testemunhas reticentes alegam que há apenas discórdias e inventários,
divisões de bens há séculos amaldiçoados pela feliz coincidência burguesa.
Tanta tola existência!
Por que então não recusar repassar as promissórias do passado?
- Perguntam os fantasmas, olhando pela escotilha.
Por que não enterrar os mortos da família com seus panos e dejetos sepulcrais?
Por que não cessar a voz aos alhures e às pragas de maldição? Sim, mas, quem o faz?
De soberba vive o velhaco com cheiro de urina, guardando em relicários
as carnes, os pedaços arrancados dos santos.
Não, não se pode assim riscar de vez os tortos nomes sobrenaturais
para rasgar os papéis e as certidões!
Que tola insistência!
Sabem, porém, que na lacuna do invento,
no espelho que já não quebra mais mãos,
uma criança, um menino de espírito livre
pode libertar o baú dos mortos
e ousar reverter a história
- para cortar inocente
- e cálido -
a árvore verossimilhante:
pela raiz.

Patricia Porto


o operário e a bailarina

ele ergue em torno de si
uma sólida fábrica -
de armações de aço,
ferros e maquinarias

enquanto isso...
ela flutua no espaço
e move com seus passos
o tempo derretido

ele sobe em alturas
que parecem incríveis
e cerca-se de arames
sempre tão farpados!

e enquanto isso...
ela dança vestígios
e sobe em telhados
pra viver de estrelas!

ele veste capas e seu uniforme,
ele ouve sinais, ele canta ordens
sai às tantas - sempre pronto em ponto,
ele é a disciplina; é o operário:
a vida é certeza

ela escreve versos,
inventa cantigas,
dizem que é louca
sua crença e sina,
ela é a bailarina

mas, quando estão juntos:
ela rega plantas,
ele veste rios,
ela faz café,
ele conta histórias,
ele repousa em seu ventre,
ela costura bainhas,
ele cose o amanhã,

ela desenferruja as trancas,
ele ordenha o futuro,
ela adormece...
ele adormece...
não há nada que os separe

ele é todo corpo,
ela é o esquadro

eles se encontram,
se perdem inexatos
libertam seus fardos,
fazem-se os sentidos,
ela é a operária,
ele, o bailarino

...

e tudo, tudo que era tão sólido
se desmancha no ar...


Patrícia Porto
Todos os direitos autorais reservados a autora.


Blog:
Patricia Porto - Sobre pétalas e preces
http://pporto.blogspot.com.br/
Patrícia Porto - Por uma Pedagogia Lúdica.
http://leituraludica.blogspot.com.br/

Um comentário

Poesia Sem Limites disse...

Lindo o poema da Bailarina. Acho que ali você se desmancha nos versos