Por: Paulo Bornhofen
Paulo Bornhofen: Quando começou o
envolvimento com as letras?
Roberto Rodrigues de Menezes: Começou com minha mãe, professora primária que, estando
eu no início do quarto ano primário, me deu de presente a obra completa de José
de Alencar, prosa, e Gonçalves Dias, poesia. Alencar devia compor uns vinte
volumes de romances maravilhosos (Senhora, O tronco do ipê e Iracema penso que
li mais de dez vezes), dos quais hoje ainda tenho oito. Gonçalves Dias num
livro só. Este grande poeta maranhense tinha um estilo triste que combinava
comigo. Li Os Timbiras, Sextilhas de Frei Antão, Primeiros, Segundos e Últimos
Cantos. Ele também fez peças de teatro, mas eu só lia os poemas. Com dez anos
eu já lera tudo (não havia tevê, videogame nem computador) e gostava, apesar de
ir ao dicionário de quando em vez para entender.
Continuou
no Seminário Nossa Senhora de Lourdes em Azambuja, Brusque. Fui para lá com 11
anos cursar o que na época se chamava Ginásio. É uma pena que o pessoal da
instrução pública mude esses nomes a toda hora, como se fosse o mais
importante. O Ginásio que fiz em Azambuja foi o meu melhor curso “superior”.
Tive mestres do quilate do Cônego Valentim Loch, Padre Raulino Reitz (um
cientista e literato da Academia Catarinense), padre Cláudio Cadorim, padre Ney
Brasil Pereira (hoje comigo na Academia Desterrense). O Cônego, principalmente,
meu professor de Latim e Língua Portuguesa, me dava muita motivação, dizendo que
um dia meus versos seriam conhecidos. Aprendi com ele métrica e rima
escorreitas. Tanto que fiz todo o ginásio fazendo versos assim. Apesar de ser
no início dos anos sessenta e a tal Semana da Arte Moderna ter acontecido em
1922, nunca no seminário fiz um verso solto. O cônego dizia que verso solto
“qualquer um faz”. Hoje não concordaria com ele, pois há versos soltos
maravilhosos. Mas era uma época e um contexto.
Saí
do seminário, mas já tinha contraído a “doença”. Fazia também autos, peças
teatrais de caráter devocional. E continuei fazendo, mesmo ao entrar na Polícia
Militar aos dezessete anos para fazer a vida, pois não era filhinho de papai e
tinha que me sustentar.
Paulo Bornhofen: Prosa ou poesia?
Roberto Rodrigues de Menezes: Aprecio conto e crônica (mais o conto) quando escrevo
em prosa. Penso em fazer um romance com a história de minha avó Lídia, uma
senhorinha que foi deserdada ao casar com meu avô Bertoldo pobre, mas um
professor me disse que só se lê hoje romance de gente famosa, de preferência
ator, cantor, ou pastor da Universal. Na poesia sou cultor de versos clássicos,
pois minha vida para eles se direcionou. E ao ingressar na Academia de Letras
de São José, no mesmo mês (Março de 2011) faleceu um membro dela chamado Abel
Beatriz Pereira. Fui designado para fazer a sua elegia, o seu panegírico. E o
que vi? Um poeta de versos clássicos, de rima lapidada e métrica afinadíssima.
Estudei a obra dele e aprendi mais um pouco. Dizia ele que ser clássico não é
ser antiquado, como querem hoje, pois o clássico sempre foi a base para o
moderno. Interessante que, a partir de 2010, com 60 anos, decidi sair do
armário poético e mostrar meus versos. E até participar de concursos de
poesias. Consegui alguns segundos lugares e num deles, fiquei um tanto
chateado, desculpem a falta de modéstia, pois o primeiro repetia
insistentemente com seu verso vencedor: Eu pari um poema, eu pari um poema...
Achei estranho. Mas então vim saber que o que importa é mesmo o estranho. Hoje
se faz de tudo em nome de um conceito chamado “criatividade”. Por isso uma
Pietá de Miguelângelo não será páreo para uma escultura de dez baldes comuns
empilhados por um artista plástico, pois aí reside a criatividade. E o mesmo se
faz com poesia. Olavo de Carvalho diz que não se faz mais verso com métrica e
rima, porque ninguém mais sabe fazer, mesmo os novos poetas, com honrosas
exceções.
Foi
quando um desses poetas bem antigos e de muita qualidade, tanto que está na
Academia Catarinense de Letras, me abriu os olhos: Não participa de concurso de
poemas com verso solto e verso clássico. O clássico não é páreo para o verso
solto, até porque quem julga não conhece o clássico. Participa com o clássico
somente de concursos de versos clássicos. Concursos de sonetos, por exemplo.
Vivendo e aprendendo.
Paulo Bornhofen: Existe metodologia no
processo criativo?
Roberto Rodrigues de Menezes: No processo de
criar poesia procuro seguir a rima e a métrica de forma lapidar. Mas não
procuro dificultar a mensagem, usando de termos simples quase sempre. E não
tento rimar osso com colosso, como forçam alguns. A métrica também tem que
fluir naturalmente. Não seria um bom simbolista, apesar de admirar Cruz e
Sousa, ou mesmo o parnasiano Bilac. Hoje se pode usar o verso clássico com
expressões simples, até porque se não for assim o povo não entenderá. A
linguagem tecnológica, rápida e estressante, diminuiu e muito o gosto pela
cultura clássica.
No
conto meu direcionamento é a cultura açoriana dos meus ancestrais, sua forma de
falar, seu folclore e mesmo suas manias. Mas isso não me impede de fazer contos
urbanos e de costumes, que aprecio muito. Nestes, o processo é garimpar na
fonte e usar no escritório a sensibilidade e criatividade, sem ser grotesco.
Paulo Bornhofen: O que acha da expressão:
quando eu escrevo, não dou a menor importância para o leitor?
Roberto Rodrigues de Menezes: Quem faz isso ficará no limbo. Tudo hoje exige um
público-alvo muito bem estudado e escolhido. Por isso procuro fazer versos
clássicos com palavras simples. Ninguém mais lê a corrente simbolista ou
parnasiana, porque não a entenderá. E, afinal, o cliente tem sempre razão.
Paulo Bornhofen: Em 2012, o senhor lançou
duas obras, Memória Militar Estadual e Castelo Azul. O senhor vive um momento
de explosão criativa, ou eram obras que já estavam prontas e apenas foram
lançadas agora?
Roberto Rodrigues de Menezes: O “Memória Militar” levei muito tempo a fazer, pois os
velhos coronéis da PM não ajudam muito com informações. A maioria teme a
Internet. Já o Castelo Azul só dependia de mim. Fiz de um jorro. Mas aproveitei
alguns poemas de minha juventude. Além do fato de ter mais dois Castelos para
publicar, o Púrpura e o Verde, pois desejei criar uma trilogia de cores e
versos. Confesso que o Púrpura já está pronto e o Verde só falta um terço. Mas
tenho que publicar um a cada ano, pois sai muito caro e não tenho a Globo nem e
Igreja Universal a me patrocinar. A bem da verdade, nunca pedi nada a ninguém
como patrocínio, pois fico constrangido.
Paulo Bornhofen: O senhor é integrante de
várias Academias de Letras. Quais são elas?
Roberto Rodrigues de Menezes: Entrei na Academia São José de Letras em Março de 2011
(cadeira 39, patrono o jornalista e escritor lagunense Zedar Perfeito da
Silva). Fui convidado para fundar a Academia de Letras do Brasil, seccional
Florianópolis, cadeira 15. Pedi que meu patrono fosse o major Ildefonso Juvenal
da Silva, um grande intelectual do centenário da Polícia Militar, em 1935.
Este
ano entrei nas tratativas para fundar a Academia de Letras dos Militares
Estaduais e hoje sou seu presidente, cargo que me deixa honrado e muito ciente
da responsabilidade que meus pares me confiaram. Meu vice-presidente é o
Tenente Coronel Paulo Roberto Bornhofen, do Batalhão PM de Blumenau e da
Academia Blumenauense de Letras, o que por si só demonstra que temos muita
qualidade. Meu patrono é o comendador Feliciano Nunes Pires, governador da
província catarinense que, em 1835, fundou um corpo de guardas que foi o
embrião da atual Polícia Militar.
Ocorre
que, em abril deste ano, abriram inscrições para a Academia Desterrense de
Letras, o órgão literário mais representativo da capital, minha terra natal.
Inscrevi-me, mas sem esperar muito, pois havia grandes nomes e só três vagas.
Qual a minha alegria ao ser comunicado que tinha sido um dos três eleitos.
Tomei posse em 22 de Novembro com a escritora Leatrice Moellman Pagani, já da
Academia Catarinense de Letras, e com a poetisa Vilca Merízio, vice-presidente
da Academia de São José.
Paulo Bornhofen: Fale um pouco de cada uma
das Academias que o senhor é filiado.
Roberto Rodrigues de Menezes: Lembro que meu primeiro afeto literário se chama
Associação dos Cronistas, Poetas e Contistas Catarinenses. Um órgão de
orientação socrática, que não exige currículo nem nome, só amor pela
literatura. Recitamos poemas “sub tegmini fagi”, ou à sombra de uma faia, ou
árvore frondosa (isso em sentido conotativo, para demonstrar que a simplicidade
e a humildade devem permear o processo literário). Dali fui eleito para a
Academia São José de Letras, presidida por escritor e poeta também da Academia
Catarinense de Letras, Artemio Zanon. O destino quis que fundássemos a Academia
de Letras dos Militares Estaduais, projeto iniciado pelo Sr Comandante geral,
coronel Nazareno Marcineiro, e o ten cel Bornhofen. Penso até que este não foi
o presidente da Academia por ter sido transferido para a bela Blumenau, terra
do meu quarto neto. A Desterrense é composta por nomes de muito peso, como
Maura Soares, Nereu do Vale Pereira, Alzemiro Vieira, Leno Caldas, o padre Ney,
Alberto Coura, Osmarina Souza, Isaque Borba, Pilati, enfim, nomes respeitáveis.
Preside-a a jornalista e poetisa Hiamir Polli, que assumiu este ano e vem
conduzindo a Academia muito bem. A ALB fez um ano agora, não tenho muito a
referir.
Paulo Bornhofen: O senhor faz planos para a
sua atividade literária, ou apenas deixa acontecer? Se tem planos, pode falar
deles?
Roberto Rodrigues de Menezes: Todos têm seus planos. Resolvi agora dar uma parada e
me dedicar por inteiro à Academia de Letras dos Militares Estaduais, que
presido. E vamos vencer, tenho certeza, pois todos os escritores e poetas da
região da grande Desterro têm sido maravilhosos e muito receptivos. Queremos
consistência neste âmbito literário, estender para toda Santa Catarina, pois
somos uma entidade estadual. Obviamente, sem descurar das outras, pois nelas
também tenho intensa atividade e entusiasmo. Deixo o futuro nas mãos de Deus.
Mas que nos dois últimos anos a minha mudança de vida literária foi
vertiginosa, lá isso foi. A partir do ano que vem lançarei um livro por ano.
Minha esposa já me deixou livre o décimo terceiro para isso.
Paulo Bornhofen: O senhor é um entusiasta
do soneto, o livro Castelo Azul nos apresenta vários belos sonetos de sua
autoria. Como é trabalhar com a poesia metrificada?
Roberto Rodrigues de Menezes: Creio que já respondi com a primeira questão. Gosto do
soneto, sim, pelo refinamento literário que exige sua criação. Dois quartetos e
dois tercetos, como diriam alguns críticos, gessados. De nove (eneassílabos) a
doze (dodecassílabos) sílabas métricas, embora eu goste de vez em quando de
fazer soneto heptassílabo, algo que os puristas não veem com bons olhos. Muitos não querem ficar amarrados, falam em
liberdade para poetar. Consideram mais fácil o verso solto. Mas imagina poder
criar e fazer coisas belas, mesmo com o tal gesso. Depois, a prática e a
leitura continuada dos clássicos fazem tudo ficar mais fácil.
Estou
muito feliz com o destino literário que minha vida tomou.
Paulo Roberto Bornhofen . SC. 48 anos, mora em Blumenau (terra de cultura
alemã), mas é de Florianópolis. Tenente-Coronel da PMSC (mas não escreve sobre segurança
pública, apenas artigos científicos). Tem mestrado em desenvolvimento regional.
Já escreveu alguns livros e participou de algumas antologias. Formado em gastronomia e concluindo o
curso de fotografia.
Eu escrevo uma coluna de viagens no portal www.blumenews.com.br e tenho dois blogs: www.ninholiterario.com.br e www.viagemeprazer.com.br. “Quanto as redes sociais, uso apenas o facebook (é muita rede!):
https://www.facebook.com/bornhofen”.
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