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Praça do Forró – São Miguel Paulista [Elisabeth Lorena Alves]

Praça do Forró – São Miguel Paulista

Ruas de São Miguel
(Edvaldo Santana / Roberto Claudino)
CD Edvaldo Santana
Estilo MPB

Uns Guaianases de guitarra e capoeira
Um São Miguel de Ururaí
Às vezes a gente se encontra na rua
No beco, no bar da esquina
Se encontra na roda
Que roda e alucina
Se perde menino, se perde menina
Se perdem na noite, madrugada afora
Respirando blues, esquecendo a hora
Olho de lobo, farol da cidade
Sensibilidade, ficando à vontade
Quem deixa a terra
Pensando em ir pro céu
Desaba do sonho
E cai em São Miguel [...]

Bem, na verdade em São Paulo não se tem a Cultura de preservar os prédios antigos. Vi ao longo destes meus 41 anos edifícios e moradias antigas serem destruídos e, em seu lugar, surgirem objetos de concreto de forma não identificável e de péssimo gosto. Sei que outra pessoa diria de gosto duvidoso, mas não sei precisar se alguém de fato tem o mal gosto de admirar certos edifícios que são, em minha opinião, o pior da Arquitetura. Sim, se o que é destruído são marcas da formação de um povo, nada justifica, nem mesmo uma obra do recentemente falecido Oscar Niemeyer.

Só que hoje vou falar de algo que ainda esta sendo preservado em São Paulo, uma Igreja Católica antiga – que tem sua foto até em uma embalagem de leite. Uma igrejinha pequenina, antiga, construída na Praça Padre Aleixo Monteiro Mafra, em São Miguel Paulista e sua praça muito famosa em São Paulo, a Praça do Forró. Que fique claro que eu detesto forró e odeio mesmo este gênero musical (?) por motivos óbvios, não fui apresentada a ele, fui violentada por ele, já que as pessoas que o curtem tem o hábito de ouvir em uma altura horrorosa para meu gosto – acho que é por isso que também não curto certo tipo de rock, nem me interesso em entender o que diz.

Só que a Praça do Forró – que já visitei quando em atividade – manteve aceso os hábitos de dança de parte da população nordestina, que perfaz uma grande parte dos habitantes de minha querida São Paulo. A esta Praça – e por estar longe dela, me desculpem os amigos que curtem este tipo de dança e música – dou o benefício de sua importância cultural. E dou com sinceridade, Respeito às origens nordestinas de meu Estado e sei da importância das mãos deste povo na construção, tanto das raízes de nossa população, quanto de nosso amado São Paulo.
Na Praça do Forró reuniam-se, ao som exagerado – e ali compreensível – de bandas nordestinas e nortistas também – muitos jovens e adultos que dançavam todos os finais de semana. Havia ali muitas comidas típicas e as pessoas costumavam fazer uma 'azaraçãozinha' básica para conseguirem mais que um companheiro de dança, um amigo ou algo mais. Nos dias de festas se via muitos casais de namorados, mas era comum também encontrar turistas, amigos e até pessoas desacompanhadas que iam ali para curtir o ambiente e fazer amigos.
A Praça e a Igreja ficam na Zona Leste da Capital paulista. São Miguel era, em tempos atrás, um bairro sossegado, também considerado pelos políticos como dormitório e só era visitado – e ainda é assim – em épocas eleitorais. A fama de dormitório hoje não se justifica, já que o bairro tem um comércio muito grande, escritórios diversos de todo o tipo de profissional e algumas fábricas, além de muitas confecções, tanto de roupas quanto de bonecos de pelúcia.
Para meu gosto São Miguel Paulista tem muitos sebos e, nestes, possui diversos temas de Literatura. Sou capaz de passar horas nestes lugares, diga-se de passagem. O interessante, também, nos bairros da Zona Leste Paulista são as revistarias que nasceram nas Estações de trem. Diferentes das famosas Revistariam de filmes e fotos da Europa, estas vendem Livros e revistas antigas. Como 'viciada' que sou, não resisto a uma delas ao sair de uma composição férrea. Fico um pouco triste com a modernização de nossa cidade, pois ao retirar as Estações de trem, perderam-se muito destes estabelecimentos comerciais. Talvez quem não conheça São Paulo e não tem o hábito da Leitura, não entenda meu sentimento meio saudosista, mas estas revistarias vendiam livros antigos em bom estado e foi nelas que conheci Manchete, O Cruzeiro e outras que contam a História comum de nosso país.
Na verdade, elas são conhecidas por 'Banquinhas', mesmo que algumas tenham 3 ou mais portas. Algumas resistiram à desativação das estações de trem, outras sumiram do mapa e levaram consigo a oportunidade de pessoas comuns, nascidas na Periferia de São Paulo, conhecerem a Leitura. Confesso que comprava muitas Revistas de Romances – Bianca, Júlia e Sabrina – em Guaianases, o bairro onde vivi e do qual tenho saudade, que por sinal é vizinho de São Miguel Paulista – sei que para muitos esta confissão depõe contra mim, mas agradeço a leitura destas revistinhas, pois foi através delas que consegui manter minha sanidade mental em alguns anos de minha vida. E a propósito, os verdadeiros amantes destas revistas odeiam os textos atuais, pois pouco falam dos ambientes e das paisagens, além de transformar os enredos em um absurdo desajuste da realidade - pois é, as pessoas sentem sim a diferença do que lê, seja Literatura Clássica ou literatura odiada.
A Praça chamava-se antes Campos Sales. No ano de 2007 a praça foi reformada e os shows foram proibidos para evitar que a Capela fosse destruída. O palco, em formato de chapéu de couro, foi demolido. Claro que estas mudanças não agradaram as pessoas que frequentavam a Praça. Acabou-se ai uma tradição iniciada em 1965.

A Praça teve importância histórica específica, afinal, foi palco do Movimento Popular de Arte que na época da ditadura militar recebia Artistas de vários segmentos, Teatro, Música, Artes Plásticas e Intelectuais que lutavam a favor do Movimento Diretas já. O Movimento Popular Autonomista - MPA surgiu em 1962, por causa da insatisfação dos moradores de São Miguel com os discursos em época de eleição que prometia melhorar o bairro e estruturar com a criação de hospitais, escolas e delegacias, mas ficava no discurso apenas. Antes tentara e fracassara na ideia de emancipar o bairro através de plebiscito (1953). Apesar de não conseguir a emancipação do bairro, conseguiu fazer com que muitos pedidos fossem atendidos melhorando a estrutura local. Um dos fundadores do MPA foi o escritor Osvaldo Pires de Holanda. Sabe-se que um dos pontos de encontros deste grupo era a Praça do Forró.
A Praça guarda o sitio arqueológico mais importante da cidade de São Paulo, que é a já citada Capela de São Miguel Arcanjo.
A Praça serviu de marco inicial do bairro, afinal, iniciou-se na Capela dos Índios, isto porque a igreja foi construída para o aldeamento de indígenas da região, e, diga-se de passagem, foram os próprios índios que a construíram.. Uma curiosidade é que a Igreja foi conservada como original, com paredes em taipa de pilão, mantendo também as pinturas originais. Durante a reforma da Capela, em escavações feitas em seu interior foram encontrados diversas ossadas e objetos antigos, pinturas do período colonial paulista, arte barroca e traçados incas. Algo interessante é que com a recuperação da Capela, foram resgatados peças e ornamentos de madeiras vendidos a antiquários durante os anos anteriores.
A propósito, a Estação de trem de São Miguel ainda funciona e seus trens ainda fazem aquele barulho delicioso de lata velha quando anda pelos trilhos. Diferentes de outros bairros mais centrais que tem o 'prazer' de ver rodar em seus trilhos o silencioso 'trem espanhol' que dizem as 'más línguas' são refugos trazidos da Espanha para substituir os nossos cansados e pessimamente conservados. Se é verdade ou não, não sei dizer, mas apesar do ar condicionado, ainda gosto de pegar um trem barulhento nas estações paulistas e passear horas sem fim, lendo um livro ou apenas olhando as janelas.
A estação de São Miguel esta cercada de histórias curiosas. A primeira delas é que foi construída em 1926 e inaugurada anos depois, no dia 01/01/1834, a segunda esta relacionada com o nome. Na verdade a Estação de São Miguel é a segunda da Central a receber este nome. Antes disto, a estação de Itaquera (1876) foi inaugurada com o nome de São Miguel, isto por estar mais próxima ao bairro, apesar de parecer perdida no tempo e espaço.
O bairro de São Miguel já se chamou Aldeia de Uraraí, em referência ao Rio Tietê e era uma sesmaria autorizada por lei aos índios cristãos (1580), mas que com o passar do tempo foi sendo povoada por agricultores que desrespeitavam a Lei e iniciaram plantação de café e outros empresários da época criavam as olarias.
O que muitos não sabem é que em 2006 foi criada a Associação Amigos da Praça do Forró para manter viva a tradição e a memória da população nordestina de São Miguel Paulista. Os artistas mais representados na Praça do Forró, sem dúvida foram Luiz Gonzaga, e Jackson do Pandeiro, que são os maiores ídolos da música popular nordestina.
Há outras atividades tradicionais no Bairro, como a entrega da comenda de Pioneiros aos moradores mais antigos que acontece desde 1984. Além de ser um morador antigo, para receber a comenda é necessário ter vida comunitária ativa e a ter participação social expressiva para a Comunidade. A Festa dos Pioneiros também tem seu ponto de encontro na Praça do Forró, já que as missas são celebradas na Capela de São Miguel Arcanjo.
A Caminhada da Ressurreição que acontece há quase 30 anos, na madrugada do dia de Páscoa, tem um trajeto de 13 km que compreende os bairros da Penha e de São Miguel Paulista. Conhecida originalmente como Caminhada Pique da Cruz, o evento surgiu em 1983 com a campanha da fraternidade daquele ano, sob o lema: Fraternidade sim, violência não. O objetivo é cada grupo circular na sua comunidade com uma cruz, e depois entregá-la a comunidade vizinha. Em 1983 foi percorrida toda a diocese até a Catedral da Penha. Ao final, a cruz volta para São Miguel, o que coincide com o período da celebração da Páscoa. O objetivo principal da caminhada é anunciar a ressurreição de Jesus Cristo. É na Praça Padre Aleixo Monteiro Mafra – Praça do Forró – que termina e onde é celebrada a missa de Páscoa pelo bispo da Diocese. Pela “Lei 14.565/22.10.2007”, a Caminhada da Ressurreição, foi incluída no Calendário Oficial da Cidade de São Paulo.”
Apesar de muitos moradores não gostarem do apelido recebido pela Praça Padre Aleixo Monteiro Mafra, tanto o forró quanto os nordestinos, sendo a sua maioria vinda da Bahia, fazem parte da História do Bairro e não podem ser apagados e nem relevados ao esquecimento. Muitos dos moradores têm suas raízes exatamente no Nordeste brasileiro, mesmo tendo nascido em São Paulo.
Ainda nesta Praça podem ser encontradas pessoas de todo o tipo de nacionalidade, pois fazem parte da raiz deste bairro, os portugueses, os árabes, japoneses, além de mexicanos e mais recente, bolivianos e peruanos, que estão chegando nos bairros da Zona Leste em busca de trabalho.
Claro que há muito mais histórias sobre esta Praça e a própria história do bairro esta muito ligada a ela, mas não pensei em escrever ainda sobre este bairro cheio de vida. Para mim era importante falar sobre este pedaço de chão tão cheio de histórias para contar.  Falar de São Miguel fica para outro dia...

Elisabeth Lorena  Alves - Alguém que não gosta de ficar parada, mas que estaciona frente a um bom livro e sonha com as palavras. Posta no Elisabeth Lorena Alves ( www.eliselorena.blogspot.com.br)

3 comentários

ELÓI ALVES disse...

MUito bom Beth; parabéns por falar desse bairro tão esquecido, como de resto é toda a periferia de SP, a ZL então...Essa linha de trem (VAriante) é muito largada, nela há rrastão, bandidos, grogas, crimes...sem falar que ali em Ermelindo é um cheiro de excremento horrível; Itaqua, MAnuel Feio, esses bairros e cidades por ali são todos largados; alinha do trem espanhol, que vai por outro lado, para Guainases é bem melhor; mais limpa, ar condicionado e com guardas, apesar de super lotada sempre; o transporte é horrivel, de onibus ou de trem; parabéns, gostoso de ler, com francas opinioes; bjos

Elisabeth Lorena Alves disse...

Obrigada Eloi.Pela leitura e pelo excelente comentário. Quem sabe eu fale sobre um destes bairros por estes dias...
Pensei em escrever sobre as histórias dos cemitérios paulistas. Que você acha?

Unknown disse...

Só não devia ter falado mau de Rock