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Artistas da sobrevivência [Manoel Magalhães]

Artistas da sobrevivência



Não fique triste se não olharem para você como você quer. Olhe-se no espelho; tente encontrar o narciso ferido  (curá-lo se puder), cuja alma têm esparadrapos a guisa de efígies, tapando as feridas da vida, cujas cascas estão prestes a cairem. Também não fique triste se não andas nas calçadas sonhadas. Invente-as! Surpreenda seus pés, suas cansadas pernas, arqueadas talvez, curtas quem sabe, longas em demasia, não importa. Dê a elas a chance de descobrirem nas geografias conhecidas sonhos... Qualquer um vale, mesmo pequenos, insignificantes.  Se grandes, melhor ainda! Goze-os! Viva-os!E nas esquinas costumeiras pare, olhe a volta, tentando entender o que está diante de sua vista. E não desista! Vá adiante, até cansar e deixar de sonhar, desabando num banco de praça (seu albergue),  debaixo de uma sombra amiga, pombos a ciscar na tijoleta suja, perto do pipoqueiro adormecido sobre sua carrocinha, ao lado do vendedor de algodão doce cuja boca experimenta o amargo da vida. Mas não durma! Esqueça a garrafa de aguardente, que afagas delicadamente. Tente lembrar-se dos caminhos andados. Se não puder, reinvente seus passos, dê aos sonhos (se realmente sonhou) novas interpretações. Arranje significados para os ferimentos, cujas cascas saltaram. Imagine-as  borboletas dançarinas, enfeitando o ar estagnado. E numa delas encontre o doce olhar (lembrando o rosto da menina que amaste e ficou no passado - como tudo fica, aliás), traçando voltas ao seu redor. E se um cão vadio aproximar-se, dê-lhe restos de pão (seus bolsos estão cheios de restos de pão dormido). Afague seu dorso ferido, mergulhe em seu olhar aflito. Deixe-o acomodar-se a seus pés (que se aventuraram por ruas conhecidas como se desconhecidas fossem, atrás da grande esmola), experimentando nele as batidas do coração canino em compasso com o seu, não menos canino. E sosseguem, irmanados. É o que podem fazer dois artistas (da sobrevivência).  E se força houver, continue sonhando. Para isso basta estar vivo... Ou quase vivo...

Manoel Magalhães- Jornalista, Escritor e Pintor Cinco livros publicados: Guerra Silenciosa – livro-reportagem; Dois Textos Marginais – contos; O Abismo na Gaveta – romance; O Homem que Brigava com Deus – romance; Vampiros - romance. Também escreve para teatro e cinema.Como jornalista trabalhou no Diário Popular, Pelotas; no Diário Catarinense, Florianópolis; e Correio Braziliense, Brasília. Presta consultoria online acerca de técnicas narrativas - conto, crônica, romance, roteiro cinematográfico e texto para teatro. Email: manoelsmagalhaes@gmail.com

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