Ela é solteira, não sozinha
Ela é solteira. Não sozinha. Ela pinta as unhas de
vermelho quando quer. Mas, também, sabe deixar as unhas em cacos quando dá
vontade. Esbanja esquisitices ao falar dos seriados prediletos e se cala quando
o assunto é sobre o porquê dela não ter namorado.
Ela usa vestido de tricô, daqueles clichês para tomar
chá quando o tempo é frio. E bebe cervejas em canecas como homens
pré-históricos. Ela ri de palavrões e de piadas de humor negro. Mas, também, se
derrete mais do que picolé em frigideira quando recebe um SMS romântico de
madrugada. Mas por que não namora?
Ela acorda, escova os dentes de quem já usou aparelho,
toma chocolate quente, se arruma e vai trabalhar. Prefere usar preto. Mas
desbanca qualquer havaiana bonita quando inova em alguma vestimenta cheia de
flores coloridas, sabe? Ela é linda e desconversa. Fala do tempo, do futebol,
da novela, da mãe, da crise do Paraguai e do Joseph Gordon-Levitt. Mas por que
cê não namora?
Quando o assunto é sexo, ela fala menos do que escuta.
Escuta com os ouvidos, com os olhos, com a boca e com os pelos da coxa. Transa
menos do que deseja. E sabe esconder alguma aspirante a Sônia Braga dentro
daquele decote comportado. Ela curte os Beatles, os Novos Baianos, Caetano e o
Cícero. E fala que eu tenho péssimo tom de voz. Lê Caio, Keroauc, Fante e
Gabito. Mas diz que, também, gosta das minhas histórias.
É estranha, também. Assumo. Corta o cabelo de acordo
com as fases da lua e gosta de comer macarrão com feijão. Gosta de umas bandas
que ninguém conhece e chora com as histórias do Nicholas Sparks. Liga o ar
condicionado porque gosta de dormir sentindo frio e acaba repousando feito uma
esquimó com meias e edredom. Uma linda esquimó, por sinal. Não sabe usar o
celular. Costuma atender as ligações somente após a quarta tentativa de
chamada. Não, ela não ignora. Ela perde tempo procurando o celular na bolsa,
debaixo da cama ou pia na banheiro. Mas, vez em quando, ela sabe ignorar,
também. Não sabe dançar. Recusa os convites, mas adora ser convidada. Odeia
batom e gosta de brincos de pena.
Mas por que ninguém conseguiu ultrapassar esse muro de
Berlim que você ergueu no teu peito? Ela desconversa. Ri de canto de boca e me
pergunta se eu fumo tentando desviar o assunto pra longe. Eu insisto. Falo
coisas demodês e jogo no ar o fato de que eu a acho perfeita demais para não
andar com algum sortudo lado-a-lado. Ela empina o nariz o fino, me lança teus
olhos verdes escuro e ajeita-se sobre a mesa. Muda o tom e me fala: “Porque eu
não quero”. E eu rio sem graça da minha maldita ideia de achar que todo mundo
quer ter alguém para dividir os brownies.
Fonte:http://www.entendaoshomens.com.br
Hugo Rodrigues - Escritor, carioca e autor do romance “Um
Sorriso de Oito Graus na Escala Richter”. Fã do Capitão Planeta e da Zooey
Deschanel, aprendeu na marra que ser romântico é não ter pudor como quem se
ama. Atualmente publica seus contos e trechos dos novos livros na página: www.facebook.com/fanpagehr
Um comentário
Uau! completamente apaixonada por seus textos
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