por Jana Lauxen
Artigo publicado Homo Literatus
Uma das ilusões dos novos autores: acreditar que a fama
vem junto com a publicação do seu primeiro livro. Não se engane e saiba o que
pode ser feito para conquistar leitores e um possível sucesso.
O filme “A magia além das palavras” conta a trajetória
de J. K. Rowling que ralou para alcançar a fama.
Nunca foi tão fácil publicar um livro.
Há dez anos, o novo autor só conseguia se pagasse uma
pequena fortuna por uma edição independente, ou se tivesse um bom
apadrinhamento literário. Hoje, não. Com investimento relativamente baixo e
pagamento facilitado, milhares de autores conseguiram tirar seus textos do
computador, do diário ou da gaveta, e levá-los diretamente para a estante.
Porém, por mais que o caminho entre escrever e
efetivamente publicar através de uma editora tenha encurtado
significativamente, o trabalho não termina depois do lançamento da obra. Muito
pelo contrário.
A publicação em si não fará com que leitores
subitamente se interessem pelo seu livro, como num passe de mágica. Aliás, não
existe mágica na literatura, como não existe mágica em nenhuma outra profissão.
Não é por que hoje você abriu uma confeitaria, que amanhã as pessoas farão fila
na porta para comprar seus docinhos.
O pior é que estes autores, que agora encontram tantas
facilidades na hora de publicar, costumeiramente não têm um blog, não escrevem
para nenhum veículo e sequer participaram de alguma coletânea. Nunca publicaram
um texto nem no jornalzinho de sua cidade, e um belo dia sentaram e digitaram
freneticamente um livro de 300 páginas. Ou seja: são pessoas que nunca
escreveram profissionalmente – e não, os textos que você escrevia na quinta
série, nas aulas de português, não contam.
Portanto, a primeira vez que o sujeito publica na vida,
já publica seu primeiro livro. Um livro que, obviamente, ainda não possui
leitores interessados. Até porque, com exceção de seus pais, ninguém sabia que
o dito autor era, de fato, um autor. Mesmo assim, o jovem escritor tem certeza
que o trabalho de angariar leitores pertence exclusivamente à editora, e não a
ele. Jura que seu livro só não está vendendo que nem pão quente no fim da tarde
por que a editora não o divulga, não o incentiva, não o orienta, não o carrega
no colo, não lhe massageia os pés e não lhe dá comidinha na boca.
O novo autor publica através de uma pequena editora,
mas age como se estivesse lançando seu livro pela Editora Globo. No entanto,
editoras de renome continuam com suas portas fechadas para autores iniciantes e
publicam somente quem já conquistou sua fatia – e seus leitores – no mercado
editorial. Afinal, justamente porque investem pesado em determinado escritor,
as grandes editoras precisam da garantia de que este investimento lhe trará
retorno em curto prazo. E para que isso aconteça, o autor em questão necessita
ter seu público leitor estabelecido.
Assim sendo, a maioria dos escritores inicia publicando
através de editoras pequenas, sob demanda, que editam dezenas de livros por mês
– praticamente todos com tiragens muito pequenas.
Então, o novo autor tem seu original aprovado por uma
editora sob demanda, solicita 30 exemplares como se estivesse solicitando 3
mil, e quer que a editora o coloque no Programa do Jô, na capa do caderno de
cultura do Estadão e distribua sua obra em todas as livrarias do país. Porém,
ele próprio não consegue comercializar os 30 livros que pediu, o que me leva a
crer que nem sua família, amigos e colegas de trabalho compraram sua obra.
E eu pergunto: se o autor não conhece 30 pessoas
interessadas em seu livro, como a editora vai encontrar cinco mil dispostas a
pagar para ler o que um escritor desconhecido escreveu?
Lembre-se, amigo: se ficou fácil para você publicar,
também ficou fácil para todo mundo publicar.
E só ficou fácil por que a maioria das editoras sob
demanda dificilmente realiza um trabalho exclusivo de edição e divulgação sobre
cada lançamento. Não por que não querem, mas porque, se assim fizerem, não
conseguirão sobreviver por mais de 60 dias. Pois, se o autor solicita uma
tiragem minúscula, o lucro de sua editora será igualmente minúsculo.
Por isso, as editoras se obrigam a publicar muitos
autores para conseguir levantar um valor razoável e manter seu caixa em dia.
Trabalham baseadas em quantidade, e não necessariamente em qualidade. Tanto é que
algumas chegam a lançar mais de 700 livros por ano, cada um com tiragem
variando entre 30 e 50 exemplares.
A questão é: como uma editora que lança 700 autores por
ano vai fazer para efetivamente divulgar cada um? É impossível. E se, ao invés
de publicar 700 livros por ano, ela publicar 7, cada um com tiragem de 30
exemplares, faz como para pagar as contas no fim do mês?
Nunca se esqueça, amiguinho: uma editora não é a
fantástica fábrica de chocolate. É uma empresa como outra qualquer, que possui
despesas, salários, aluguel, planilhas, cronogramas, impostos e contas para
pagar.
Mas o autor não costuma entender isso, geralmente por
não querer abrir mão de suas fantasias literárias. E, apesar de estar
publicando em uma editora que lança quase 60 autores por mês, e solicitar meia
dúzia de exemplares de sua obra, exige mil regalias: quer divulgação, preço
baixo, ilustração na capa e no miolo do livro, distribuição em todas as
livrarias do país. Quer participar de bienais, de programas de rádio e TV, quer
dar autógrafo na Flip e receber muita bajulação.
Todavia, o próprio autor não conhece meia dúzia de
pessoas interessadas em pagar para ler o que ele escreveu.
Outro erro comum que o novo autor comete é acreditar
que escritores hoje renomados somente são renomados por que publicam através de
uma grande editora. O que não é verdade. A generosa maioria de autores
atualmente reconhecidos começou como todo mundo começa: anônima e lentamente,
trabalhando muito, conquistando leitores e seu espaço embaixo do sol, devagar e
sempre.
Daniel Galera, escritor premiado, publicado fora do
país, e um dos nomes mais relevantes da nova literatura brasileira, lançou seu
primeiro livro, Dentes Guardados, em 2001, através da Livros do Mal – uma
editora que ele próprio fundou para se autopublicar, visto que, nesta época,
não havia mil e oitocentas pequenas editoras de portas abertas ao novo autor.
Clara Averbuck, quando estreou na literatura com Máquina de Pinball, em 2002, já era conhecida
pelos seus textos publicados no ezine CardosOnline, e também pelo seu blog, o
Brazileira!Preta, que na época chegou a ser um dos mais lidos do país.
Carol Bensimon, hoje autora da Companhia das Letras,
lançou seu primeiro livro, Pó de Parede, através da pequena e desconhecida Não
Editora.
E até mesmo Raphael Montes, autor da mesma Companhia
das Letras, publicou pela primeira vez em 2009, em uma coletânea da Editora
Multifoco chamada Assassinos S/A, organizada, inclusive, por esta que vos
escreve.
Ou seja: eles não enviaram seus originais para um
grande selo, foram aprovados e se tornaram escritores reconhecidos da noite
para o dia. Todos eles realizaram um trabalho sério, profissional, constante e
comprometido, durante muito tempo, dia após dia, até finalmente conquistarem
seu espaço no mercado editorial brasileiro e nas estantes de leitores Brasil
afora.
Atualmente, boa parcela dos novos autores não quer
conquistar seu espaço. Quer ganhar este espaço de mão beijada e, de
preferência, em uma bandeja de prata. O que não irá acontecer, por que nunca
acontece.
Por isso, sugiro que, antes de decidir publicar seu
primeiro livro, reflita se existe um público leitor interessado no que você
escreve. Se não houver, reflita novamente se você está disposto a trabalhar e
correr atrás para encontrar e conquistar estes leitores.
Pois, se você não estiver disposto, imagine sua
editora.
E, o mais importante de tudo: se resolver publicar
através de uma editora sob demanda, e solicitar uma tiragem minúscula, não aja
como se fosse a quintessência da literatura nacional, exigindo mundos e fundos.
Você quer que sua editora invista em seu livro, e o
divulgue, o distribua e o paparique; mas, em troca, o que você oferece? A venda
de 30 exemplares e a oportunidade de publicar um autor do qual ninguém nunca
ouviu falar?
Desculpe, amigo, mas não é o bastante para justificar
tantas reivindicações.
Pensar assim é como montar uma banda de rock com um
grupo de amigos do colégio e, no primeiro show, no barzinho ali da esquina, exigir
72 toalhas brancas e um aquário de peixes marinhos no camarim. O dono do
barzinho vai, no mínimo, rir da sua cara, e te mandar dar meia-volta e vazar.
Afinal, você não é os Rolling Stones.
O mesmo vale para a literatura: se quiser ser tratado
como um fenômeno literário, primeiro se torne um fenômeno literário.
Pois a ordem, seja na música, na literatura ou em
qualquer outra profissão, é esta: antes você trabalha, e só depois você ganha.
Nunca o contrário.
Jana Lauxen- É produtora cultural e escritora,
autora dos livros Uma Carta por Benjamin (Ed. Multifoco, 2009) e O Túmulo do
Ladrão (Ed. Multifoco, 2013). Colunista da revista Café Espacial, publicou pela
Mojo Books a historieta Pela Honra de Meu Pai. Publicou em mais de quinze
coletâneas, e organizou seis em parceria com outros escritores. Foi editora da
versão brasileira da revista eletrônica inglesa 3:AM Magazine, e também uma das
idealizadoras do projeto E-Blogue.com (in memoriam). Atualmente trabalha na
Editora Os Dez Melhores e é redatora na agência Teia de Marketing Literário
Virtual.
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3 comentários
É bem por aí. Tem de dar um passo atrás do outro.
Somente uma retificação, o ezine se chamava CardosOnline...
Abraços.
O problema não é esse, é que muita editora fica bajulando quem tem sucesso nas mídias sociais e quando se depara com um autor novo que não tem o mesmo sucesso, o trata com desdém. O certo seria tratar todos igualmente para ver qual vai se sobressair naturalmente. Ou seja, as editoras também querem que autores de sucesso apareçam do nada, não fazem qualquer triagem que não seja analisar as mídias sociais.
O paradigma atual é algo do tipo "cresça e apareça", mas crescer não significa necessariamente crescer como escritor e sim em audiência. As editoras se isentam da busca por talentos e resumem tudo a um sucesso que, muitas vezes, nada tem a ver com a qualidade (ou falta de) literária.
No mais, o texto é bem lúcido. Sucesso não vem assim de mão beijada. Escritor novato tem que batalhar até encontrar seu espaço.
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