O mocinho, no porto, vê o navio partir. A mocinha, no
navio, vê o mocinho ficar distante. Ambos levantam suas mãos, um em direção ao
outro, na vã expectativa de alcançar, através do ar, aquele que fica para trás.
Mesmo assim o navio segue, ficando cada vez menor aos
olhos do mocinho; ao mesmo tempo, o porto vai ficando lá longe, e para a
mocinha o mocinho não passa de um pequenino ponto no meio da imensidão.
Certamente você está agora mesmo retirando seu lenço do bolso
para enxugar as lágrimas de emoção, correto? E isso que eu nem falei do pôr do
sol e dos violinos tocando.
Esta cena clichê, que solicitei ao prezado leitor ou
leitora deste blog imaginar, sou eu e a literatura – apesar de que, de mocinha
e mocinho, nós duas não temos nada.
E ela – a literatura – não é a literatura como um todo.
É a minha literatura.
Estou um pouco tensa com o fato de estar
enfrentando dificuldades realmente abissais para escrever. Atividade que sempre
foi tão rotineira quanto escovar os dentes e dormir de barriga pra baixo, agora
virou um problema.
E isso é grave.
Mas eu sabia que ia acontecer.
Quando disse cheeegaaaa!
pra minha literatura, e fui atrás de arrumar um emprego, ter um salário e viver
com dignidade, sabia que ela estava embarcando num navio que, em breve,
zarparia.
No entanto, por favor, leitor, não veja este texto como um
texto de lamentações!
Não quero fazer um drama, apesar da cena dramática do
navio. Todavia, a verdade é que minha atividade, até dois anos atrás, era
escrever – SÓ escrever. Eu não tinha um puto no bolso e fumava um cigarro
chamado Kênia, mas me dedicava única e exclusivamente a escrever, e a reclamar
que não tinha um puto no bolso e fumava Kênia.
Só que escrevia. E escrevia muito.
Agora não.
E não pensem que é por falta de esforço!
Devo ter aqui, salvo em meu computador, pelo menos uns 10
textos que comecei e simplesmente não consegui terminar. Travei no segundo
parágrafo, na segunda linha, na segunda palavra.
Não os deletei; estão aqui ainda.
Mas sei que não serão acabados, pois não sei como acabar.
Este texto mesmo, que agora escrevo.
Se você está o lendo, é por que ele foi publicado em
meu blog.
E se ele foi publicado em meu blog, é por que eu consegui
chegar ao ponto final.
E isso terá sido sensacional, e por isso eu abrirei um
champanhe hoje de noite.
Por que é bem estranho não fazer algo que sempre foi
natural para você fazer, e justamente por isso você sempre fez.
Apesar de que – devo admitir! – achei que seria pior.
Na época em que escrevia e fumava Kênia e reclamava,
imaginava que morreria, sei lá, sufocada e louca, se parasse de escrever. E nem
é assim. Também não tem pôr do sol e violinos tocando. É tudo normal, só que
existe um desconforto, uma sensação de abstinência, de vazio, de fome. Não sei
explicar.
A vida continua, mas falta um pedaço.
O que devo fazer, então?
Ora, me organizar, é claro. Eu sei disso, e também estou
tentando, com o mesmo sucesso com que concluo os textos que escrevi
recentemente.
Mas, se eu me organizar;
Se, ao invés de ficar parada no porto igual um poste,
abanando para um navio que eu nem enxergo mais;
Se, ao invés disso, eu pular na água e for atrás do navio;
Se eu alugar uma lancha e for atrás do navio;
Ou quem sabe se eu procurar saber para que raios de lugar
vai aquela embarcação, e for atrás do bendito navio, existe alguma chance de
dar certo.
Caso contrário, não.
Devemos ter cuidado para não deixar pelo caminho tudo
aquilo que faz sentido pra gente. Penso que esta deve ser a receita
certa e infalível para nos transformarmos em alguém rabugento, amargo
e infeliz, e não queremos isso.
Eu, pelo menos, não quero.
Então, Literatura, me aguarde.
Eu estou indo atrás do navio.
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