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Gris [Dy Eiterer]

Gris
Foi como se tivessem cortado as amarras. Todas as amarras. De repente ela se sentia meio frouxa, com muito espaço, tendo liberdade para esticar os braços sem esbarrar em ninguém, podendo virar-se para todos os lados sem ter que tomar cuidado para não empurrar pessoa alguma. 

Há muito tempo ela sentia-se presa por laços invisíveis e quase infinitos. Era uma quase dependência da presença, do afeto, do sorriso e das canções. Sabia-se livre, mas não sentia a liberdade. Sabia-se solta, mas teimava em não tirar os pés do chão. Sabia-se leve, mas não ousava dar mais do que dois ou três passeios na lua, olhando as estrelas.

Naquela manhã de inverno, gelada como o sembrol, ela caminhou devagar a até a sua janela olhando o vazio. Viu algumas folhas dançando com o vento que anunciava chuva e resolveu tomar uma xícara de chá bem quente.

Cada gole descia-lhe pela garganta aquecendo-a como brasa. E como se fosse uma nova criatura entendeu que por mais que os caminhos se cruzem, raramente as estradas seguem alinhadas uma ao lado da outra.

Desvencilhar-se do que lhe já era habitual era doloroso. Era como se equilibrar no fio de uma faca afiada: ou lhe cortaria os pés ou pularia para fora do penar. Ficar equilibrando-se no rumo do incerto só lhe traria marcas nos pés, dores, um pouco de superação e o gosto pelo desconhecido. Saltar desse caminho poderiam lhe trazer as mesmas sensações, mas com outras possibilidades, novas visões.

Talvez os dias ficassem cinza por algum tempo. Talvez ela fosse tomada de um amargo no canto da boca que lhe impediria de sorrir mostrando todos os dentes, com felicidade plena. Talvez passaria noites acordada, elaborando teorias do tipo “e se...” só pra passar a insônia. Talvez nada disso acontecesse e ela só demorasse um tempo para transformar tudo o que sentia em uma saudade dessas gostosas de se lembrar porque tinha a certeza de ter vivido cada momento. Talvez seria tudo só um talvez. E ela detestava o talvez.

Abriu um livro, acendeu um incenso, olhou pela janela. Pegou um cobertor e entregou-se de corpo e alma ao Walter Scott, sua companhia naquele dia gris e frio.



Dy Eiterer. Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil. Edylane é Edylane desde 20 de novembro de 1984. Não ia ter esse nome, mas sua mãe, na última hora, escreveu desse jeito, com "y", e disse que assim seria. Foi feito. Essa mocinha que ama História, música e poesia hoje tem um príncipe só seu, seu filho Heitor. Ela canta o dia todo, gosta de dançar - dança do ventre - e escreve pra aliviar a alma. Ama a vida e não gosta de nada morno, porque a vida deve ser intensa. Site:Dy Vagando


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