Ter um nariz grande e ser poeta!
LE
THANH, Taï-Marc (adap.). Cyrano. Ilustrações de Rébecca Dautremer. Trad. Maria
Alice Araripe de Sampaio Doria. São Paulo, Martins Fontes, 2011. 32 p.
Procurando
bem, todo mundo tem algo de que não gosta, em si mesmo. Pode ser o pé, a
bochecha, ou mesmo o nariz. Não importa! O que parece feio para um, pode ser
bonito para outro. O que incomoda alguém, pode ser justo o que atrai outro
alguém...
Neste
livro, o adaptador tem uma tarefa difícil: narrar de forma enxuta, a história
de uma peça de teatro famosa, Cyrano de Bergerac, do dramaturgo francês, Edmond
Rostand. A peça é uma história de amor. Conta como Cyrano, que era considerado
extremamente feio porque tinha um narigão, era apaixonado por sua prima, Roxane
e como conseguiu, um dia, conquistar o seu amor. Dizendo assim, parece simples.
Mas não é!
A
peça famosa foi escrita em forma de poema, com versos rimados, em 1897. Mas a
história mesmo se passa entre 1640 e 1655. E neste livro aqui não há referência
à data, mas o autor diz que “Cyrano vivia numa época em que as pessoas se
locomoviam a cavalo e lutavam com espadas”. E aproveita para relatar os
costumes desse período, como tomar-se pouco banho e perder os dentes muito
cedo! Mas ainda assim esta é uma história de amor.
Predomina
no livro uma linguagem bem humorada e o autor brinca o tempo todo com
definições de palavras e com o fato de Cyrano ter um narigão. Aliás, é o
próprio Cyrano quem brinca com isso, dizendo, por vezes, que seu nariz era um
poleiro para os pardais, um trampolim para gafanhotos, um telescópio para
observar a lua. E com isso, ele mesmo se salva. Aliás, o que salva mesmo
Cyrano, é que ele é poeta. Então, a história é simples: Cyrano gosta da prima
Roxana, que gosta de Cristiano, que é um pouco tapado, mas também gosta de
Roxana. E é Cyrano que com sua poesia, ajuda Cristiano a conquistar Roxana:
fala no lugar dele, escreve por ele, sopra poesia para o outro declamar para a
sua amada. Mas, um outro homem, o duque De Guiche manda os dois amigos para a
guerra, porque também era apaixonado por Roxana (que se casa com Cristiano,
antes dele partir para a luta). E mesmo de longe, Cyrano continua escrevendo
cartas para Roxana, como se fosse Cristiano. Um dia a amada vai visitá-lo no
campo de batalha, mas Cristiano é morto no meio da luta. A guerra termina, o
tempo passa, Roxana vai morar num convento e Cyrano sempre vai visitá-la, mesmo
depois de ferido, numa luta. E neste dia, Roxana descobre o seu verdadeiro
amor...
Tudo
no livro figura com elegância: o formato, o número de páginas, a lombada, o
tipo de letra usado, o tamanho da letra, a contracapa. Dá vontade de ficar
abraçado no livro, isso sim!
A
bondade de Cyrano é cativante. Sua nobreza, sua coragem, seu desprezo pelo
poder, sua sensibilidade e sua capacidade de se sacrificar pela felicidade
alheia fizeram dele um personagem inesquecível.
Uma
atração inegável neste livro é a ilustração. Rébecca Dautremer é francesa e já
conquistou um enorme reconhecimento pelo seu trabalho. Com o livro Princesas,
em 2004 ela conquista o mundo. Suas figuras são quase fotografias, seus
cenários, seus ângulos de visão são bastante realistas, mas com uma marca
extremamente pessoal: as figuras magras e alongadas, de olhos puxados, que se
movem em diferentes atmosferas de luz, são características importante do
trabalho da ilustradora. Os detalhes cheios de delicadeza também são sua marca.
Celso Sisto
é escritor, ilustrador, contador de histórias do grupo Morandubetá
(RJ), ator, arte-educador, crítico de literatura infantil e juvenil,
especialista em literatura infantil e juvenil, pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), Mestre em Literatura Brasileira pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Doutor em Teoria da
Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUC-RS) e responsável pela formação de inúmeros grupos de contadores de
histórias espalhados pelo país.
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