O Sino do Campanário
Lançado em 2005, quando o escritor contava com apenas
vinte e poucos anos de idade, esta coletânea de contos fez o improvável, desde
o início. Primeiro que livros de narrativas curtas geralmente não são bem
aceitos, ainda mais de autores locais. Segundo que Uili era um completo
desconhecido. E terceiro, que nem autor, editor e nem ninguém depositava muita
esperança no projeto. Contra tudo e contra todos, “O Sino do Campanário”
tornou-se o livro de ficção mais vendido da Feira do Livro de Caxias do Sul daquele
ano, sendo adaptado para o cinema no ano seguinte, adotado por diversas escolas
e esgotando rapidamente as primeiras edições.
O filme foi exibido em diversas cidades e em canais de
TV, ajudando, claro, a projetar o livro. Mas o texto se sustenta, com profundidade
e estilo, algo incomum para um rapaz de pouca idade.
No conto que nomeia o livro, Uili Bergamin junta os
extremos entre os quais o personagem é macerado, enquanto transita de uma
margem a outra de realidades vividas. Juventude e velhice, vocação e desejo,
sacro e profano, espírito e corpo, alternam-se nas suas lembranças. Sabe-se
infiel; para todos os efeitos, um falsário.
Assim, na manhã santa de uma sexta-feira, em meio aos
repetitivos afazeres, o velho religioso se olha, mais uma vez, no lustríssimo
cálice do altar do sacrifício, e o que vê é uma excrescência humana.
Sísifo do campanário a recomeçar sempre as mesmas
coisas, têm consciência dos castigo que amealhou ao trair o amor do jovem que
foi. De forma dolorosa, sente-se jogado em uma descida até a origem de tudo,
até o fundo de si mesmo, não para alçar a pedra “sísifa”, mas trazer à luz o
mistério (incompreendido) da encarnação.
Mais uma vez agarra a corda, perfeita, e enquanto bate
o velho sino, percebe a falta de sentido em tudo o que viveu nos últimos
quarenta anos. A hora seria de o velho homem dar lugar a um novo, capaz de
conviver com a liberdade.
O “nada” o ataca com o sentimento da mortalidade, com a
percepção do fim próximo. Da queda, volta de mãos vazias; não há solução para o
ser, pois o tempo transcorreu e o seu passado é uma galeria de dor.
Puxa mais e mais forte a corda, ciente de ser juiz,
algoz e vítima simultaneamente. Reflete seu pecado e, furiosamente, bate o já
rachado sino para a remissão de Eros, enlace entre céu e terra.
Maria Helena Brambila
Professora e Filósofa
Uili Bergamin-Nasci
em Bento Gonçalves e ainda criança mudei-me para Cotiporã. Já adulto,
estabeleci-me em Caxias do Sul, onde venci inúmeros prêmios literários,
nacionais e internacionais. Sou autor de seis livros: "O Sino do
Campanário" (contos), "Cela de Papel" (novela), "Do Útero do Mundo"
(poesias), "A Ilha Mágica" (juvenil), "Contos de Amores Vãos" (contos) e
"Tetraedro" (crônicas) em parceria com mais três autores caxienses.
Também escrevo para a Revista Acontece Sul, onde indico bons livros e
colaboro para jornais da região.
Nenhum comentário
Postar um comentário