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Livros raros da biblioteca pessoal de Matarazzo vão para Fortaleza [Revista Biografia]

Livros raros da biblioteca pessoal de Matarazzo vão para Fortaleza


Coleção do criador da Bienal de São Paulo irá para a Fundação Edson Queiroz na Universidade de Fortaleza

Antonio Gonçalves Filho - O Estado de S. Paulo

Pronta para ser despachada para Fortaleza, a valiosa e rara coleção de livros de Francisco Matarazzo Sobrinho (1898-1977), criador da Bienal de São Paulo, comprada pelo empresário cearense Airton Queiroz, vai ocupar boa parte das novas dependências da Fundação Edson Queiroz na Universidade de Fortaleza (Unifor). São nada menos que 2.949 volumes de grande valor – comercial e cultural. Entre eles, estão livros de referência histórica, como a primeira edição, de 1750, de Opere Varie di Architettura, de Giovanni Batista Piranesi (1720-1778), um dos grandes gravadores do século 18, que o mercado avalia em US$ 150 mil. Outra raridade é a extravagante edição do livro Miserere, com 58 gravuras de grandes dimensões que George Rouault produziu entre 1922 e 1927 a pedido do marchand Ambroise Vollard, cujo sobrenome é automaticamente associado à suíte erótica encomendada a Picasso nos anos 1930.

Só existem 425 exemplares do livro de Rouault no mundo (o da coleção é o 224) e nem todos estão completos. Muitas dessas gravuras se perderam pela Europa durante a guerra. A de Ciccillo foi publicada em 1948 na forma integral. Todos os livros da coleção do empresário foram doados ao advogado Benedito José Soares de Mello Patti (1924-2013), amigo pessoal de Ciccillo e conselheiro vitalício da Bienal de São Paulo. Com a recente morte do advogado, que conheceu o empresário ao trabalhar para a Metalúrgica Matarazzo, os filhos colocaram à venda a coleção, que por pouco não fica em São Paulo. O segundo interessado se atrasou para a negociação. O valor não seria fator impeditivo, pois a compra, intermediada pelo marchand Antonio Almeida, foi feita por preço abaixo dos padrões do mercado (não chegou a R$ 700 mil).

De qualquer modo, São Paulo, em 1962, ganhou de Ciccillo Matarazzo parte de sua coleção particular de livros e revistas, parcialmente incorporada à biblioteca da Escola de Comunicações e Artes da USP (catalogados no Dédalos e disponível para consulta). As obras desse acervo são igualmente raras, destacando-se entre elas os catálogos das exposições do Salão de Belas Artes de Paris (entre 1740 e 1890), que foi o maior evento mundial de artes da Europa até o advento do impressionismo. Outra raridade da coleção da ECA é uma edição exclusiva dos poemas de Verlaine com gravuras originais de Massimo Campigli (1895-1971) autografadas pelo autor (exemplares único impresso para Ciccillo).

Há, na coleção vendida à Fundação Edson Queiroz, livros que também trazem gravuras de Campigli, lembrado por suas composições assimétricas com figuras hieráticas inspiradas em antigos afrescos. Vale lembrar que Ciccillo comprou muitas telas do pintor que hoje estão no acervo do Museu de Arte Contemporânea (MAC/USP).

Randal Martins Pompeu, vice-reitor da Universidade de Fortaleza, brinca quando se fala da perda que significa para São Paulo uma coleção histórica como essa, associada desde seu processo embrionário à criação do Museu de Arte Moderna e da Bienal por Ciccillo. “Ela está em boas mãos, pois vamos permitir o acesso público à coleção”, garante, revelando a criação de uma área específica para receber o acervo na biblioteca da Unifor, que ocupa hoje uma área de 5 mil metros quadrados, onde estão guardados mais de 330 mil volumes (cerca de 85 mil títulos).

A exemplo de Ciccillo Matarazzo, o empresário Ayrton Queiroz, de 65 anos, tem grande planos para promover a arte no Ceará. Sua coleção de obras (em número superior a 500) tem artistas brasileiros de todas a épocas e, recentemente, ele comprou duas telas do pintor viajante Johann Moritz Rugendas (vale lembrar que uma pintura do alemão oscila em torno de R$ 1,5 milhão). Rugendas (1802-1858), aliás, está representado na coleção de livros raros de Ciccillo com Voyage Pittoresque dans le Brésil, publicado em 1835 e que traz litografias feitas a partir de desenhos e aquarelas representando a paisagem e tipos do Brasil.

“Temos um projeto educacional dirigido a escolas públicas em Fortaleza que atende mais de 400 crianças por dia, e o chanceler Ayrton Queiroz pretende associar o acervo da fundação, que tem, além de Rugendas, Franz Post, e a coleção de Ciccillo, também com obras que podem contar a história do Brasil por meio da arte”, diz o vice-reitor Randal.

De fato, Ciccillo Matarazzo fez parte do exclusivo clube de 100 bibliófilos que, entre1943 e 1968, recebeu 23 títulos hoje raros com obras de autores como Gilberto Freyre ilustradas por grandes nomes. Basta citar como exemplo das litografias que Picabia fez para Janela do Caos, de Murilo Mendes.

Livros raros da biblioteca pessoal de Matarazzo

 













Evelson de Freitas/Estadão

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