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Hemingway, contista e
boxeador, praticava
os dois tipos de nocaute
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A hora e a vez do conto?
De todos os gêneros
literários, talvez o conto seja o mais difícil de definir. Ao comparar a
literatura com uma luta boxe, o escritor argentino Júlio Cortázar cunhou a
célebre definição: “o romance ganha sempre por pontos, enquanto o conto deve
ganhar por nocaute”.
É consenso que o conto
moderno nasce com poeta e escritor Edgar Alan Poe Edgar (1809-1849). E ele não
apenas escreveu histórias marcantes que entraram para o imaginário universal.
Poe desenvolveu as primeiras reflexões sobre a natureza do gênero. Ao resenhar
a obra de Hawthorne, Poe criticou o caráter alegórico e o fundo moral das
histórias de seu conterrâneo. Em sua Filosofia da Composição, o autor do poema
O corvo diz que a narrativa curta é superior ao romance e a poesia, e deve ser
composta de modo a ser lida em duas ou três horas – ou seja – de uma sentada.
Por isso, nada no conto pode estar fora do lugar.
“Nessa linha, o conto se
afastaria de uma das principais marcas da crônica: o relaxamento de linguagem.
Uma crônica-padrão parece estar sempre esteticamente desarrumada”, escreve Miguel dos Sanches Neto, autor de Chá das Cinco com o Vampiro.
Mercado
Embora seja idolatrado por
escritores, o conto sempre ocupou um lugar marginalizado no mercado. Basta
lembrar a declaração de Luciana Villas-Boas, uma das pessoas mais influentes do
meio editorial brasileiro, em uma matéria da revista da Cultura, em 2010:
“Considero um equívoco
começar a carreira com livros de contos, ou poesia, ou crônica. Esses gêneros
não têm público e os livreiros começam a associar o nome do autor a fracasso de
vendas".
Quando surgiram os
primeiros blogs – e os escritores começaram a escrever e publicar na internet –
houve quem dissesse que as narrativas curtas iriam jogar os romances para
escanteio. Livros como Guerra e Paz e Crime e Castigo, por conta do número
monstruoso de páginas - em tese - seriam inviáveis em uma época frenética como
a nossa, onde pais viciados em trabalho e em rede sociais mal tem tempo para
ver os filhos crescerem
As previsões eram que a
produção literária iria se restringir as narrativas curtas. "Sua brevidade
estaria mais alinhada ao paradigma do conteúdo digital, que favorecia cada vez
mais a fragmentação, a velocidade de leitura e a incorporação de recursos
multimídia", escreve Daniel Galera, um dos autores que esteve na vanguarda
da publicação independente nos primórdios da internet, em sua coluna no jornal
O Globo. "A história foi um pouco diferente. A nova literatura breve
baseada em hipertexto nunca se concretizou".
Com a chegada da gigante
Amazon ao mercado brasileiro, forçando as editoras locais a investirem em
e-books, as velhas previsões voltaram. A relativa popularização do eReader, o
barateamento sistemático de tablets e os aplicativos de leitura para celulares
aqueceram o mercado digital brasileiro, abrindo espaço para novos projetos.
Formas Breves
O selo digital Formas
Breves, sob a coordenação de Carlos Henrique Schroeder, é uma dessas
iniciativas inovadoras. Desde fevereiro, a coleção, que faz parte da plataforma
e-galáxia, vem publicando um novo conto a cada semana. E pela bagatela de R$
1,99. O único critério de seleção dos textos é a qualidade, segundo o editor.
Entre os autores convocados por Schroeder, que é também editor da Revista Pessoa, estão novas vozes da Literatura Brasileira, como André de Leones e o
José Luiz Passos, vencedor do Prêmio Portugal Telecom de Literatura. Há também
previsão da tradução de textos de autores estrangeiros, inéditos em português.
“Por sete vezes chegamos
no Top 10 de vendas da loja da Apple, na frente de best-seller's melosos, isso
foi demais”, comemora o catarinense de 44 anos, que se surpreendeu com o
sucesso imediato da coleção. “Isso nos motiva muito, e eu, o Tiago e a Mika,
estamos cada vez mais empolgados e encantados com o projeto”, explica.
Ao falar da boa recepção
da coleção, Schroeder ressalta o papel dos escritores que, segundo ele,
levantaram a bandeira do projeto e ajudaram a propagar a publicação nas redes
sociais. “O mérito é dos autores, pelos bons textos e pela batalha na
divulgação”, afirma.
Segundo Schroeder, a
premiação da canadense Alice Munro, em 2013, primeira contista a ganhar o
Nobel, é uma vitória simbólica e pode abrir mais espaço para o gênero no
Brasil. Nos EUA, autores como Lydia Davis e George Saunders, que se dedicam ao
conto, ocupam lugar de destaque na imprensa e no mercado em geral. Algo que não
acontece no Brasil, embora tenhamos grandes autores.
“Somos um país de grandes
contistas, mas que vive a ilusão do romance”, diz.
*Texto escrito para a disciplina jornalismo cultural.
MARCOS VINÍCIUS ALMEIDA-
Nasci em 1982, em Taboão da Serra, na Grande SP. Mas vivi desde sempre
em Luminárias-MG, com breves passagens por São João del Rei-MG e Porto
Alegre-RS. Atualmente, moro em São Paulo. Publiquei alguns contos em
antologias, sites e revistas: Cult, Suplemento Literário de MG, Germina,
Cronópios, Revista Bula, entre outros.
Contato-mvalmeida.7@gmail.com
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