Para Graciliano Ramos,
escrever é como lavar roupa
Artigo de Fabíola Braga,
Diretora de Redação do site Sílaba Tônica
Talento e inspiração não
bastam para escrever bem. Também é preciso muito estudo, técnica e trabalho.
Aliás, isso vale para todas as atividades, em todas as áreas. Do jogador de
futebol ao artista plástico, passando pelo chef de cozinha, ator ou escritor;
seja no campo, no fogão, no palco ou na frente do computador, “genialidade é 1%
inspiração e 99% transpiração”, dizia o inventor Thomas Edison (1847/1931).
Charles Kiefer, escritor e
professor, costuma dizer aos alunos de seu badalado curso de escrita que
“sempre que a inspiração bate lá em casa, me encontra trabalhando”,
parafraseando o pintor espanhol Pablo Picasso (1881-1973): “La inspiración
existe, pero tiene que encontrarte trabajando.”
Edison, Kiefer, Picasso…
Estamos falando de homens muito inspirados e, também, muito trabalhadores! Aí
você ouve alguém dizer “fulano tem o dom”, como se o dom fosse o começo, o meio
e o fim, quando na verdade é só o começo. Um bom começo, claro, mas o que vem
depois?
Graciliano Ramos (1892/1953),
um dos grandes de nossa literatura, comparava o ato de escrever bem ao de lavar
roupa. O autor de “Vidas Secas” dizia que um bom texto não pode ser molhado.
Para explicar, em conversa com Joel Silveira, ele fez uma interessante analogia
entre o escritor e as lavadeiras de Alagoas:
“Quem escreve deve ter
todo o cuidado para a coisa não sair molhada. Quero dizer que da página que foi
escrita não deve pingar nenhum palavra, a não ser as desnecessárias. É como
pano lavado que se estira no varal. Deve-se escrever da mesma maneira como as
lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Sabe como elas fazem? Elas começam
com uma primeira lavada.
Molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho,
torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Depois colocam o anil,
ensaboam, e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada,
agora jogando a água com a mão. Depois batem o pano na laje ou na pedra limpa e
dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota.
Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda
ou no varal, para secar. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como
ouro falso, a palavra foi feita para dizer”.
Graciliano era
extremamente exigente e tinha obsessão por textos enxutos. Ele dizia que
“escrever é uma coisa e escrevinhar é outra”. O velho Graça* escrevia à mão,
pela manhã, e refazia várias vezes seus textos e livros, sem ficar satisfeito.
Ele, que também atuou como jornalista, conhecia bem os jargões e segredos da
profissão. Nas redações de revistas e jornais é comum ouvirmos a frase “tem que
enxugar o texto”. Muitas vezes, isso significa que não há espaço editorial para
publicar um texto na íntegra, mas também quer dizer que “a coisa está molhada”,
pingando palavras.
E você, também gosta de
escrever? Então, fique atento às dicas do mestre: ”tem que torcer bem o pano,
uma, duas vezes, depois bater, e mais uma torcida, e outra, e depois pendurar
no varal”…
Ufa! É muita transpiração!
Quer saber? Com licença porque por aqui também temos muito pano pra torcer e
pendurar neste varal…
*Nota: velho Graça,
apelido do escritor Graciliano Ramos.
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Um comentário
E vamos aprendendo com os grandes: Graciliano compara o escrever ao lavar roupa, Ferreira Gullar já o comparava ao lavar feijão... e de analogia em analogia, vamos melhorando no ofício.
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