Adolescentes brasileiros
formam legião de leitores-fãs e impulsionam as vendas das editoras
John Green e Cassandra
Clare são alguns dos nomes favoritos dessa turma que não abre mão do papel
por Josy Fischberg
RIO - Não tem nada melhor
que sentir o cheiro do livro, passar as páginas entre os dedos, saber de cara
se falta muito para o fim, admirar a capa com atenção. Parece frase de quem tem
de 40 anos para cima, mas é o que dizem adolescentes de 13 a 18 anos. No
Brasil, uma geração plenamente digital vem consumindo livros de papel
avidamente, destruindo generalizações como “adolescente vive na internet” ou
“esses meninos não gostam de ler”. Em uma fase da vida em que tudo é intenso —
eles amam demais ou odeiam demais — meninos e meninas vêm provando que suas
paixões desmedidas também podem se voltar para as letras. Impressas no papel.
Uma breve olhada nas
listas de livros mais vendidos dá a dimensão do fenômeno. Entre os dez
primeiros lugares do último ranking do PublishNews, site especializado em
mercado editorial, oito são queridinhos do público jovem, mesmo que nem sempre
pertençam à categoria infantojuvenil. Quem encabeça a lista é John Green, com
“A Culpa é das estrelas” (Intrínseca). Outros três livros do autor, cultuado
por adolescentes, também estão lá. “A escolha” (Editora Seguinte), de Kiera
Cass, que faz parte da trilogia “A seleção”, aparece em sétimo. “Instrumentos
mortais — Cidade do fogo celestial” (Galera Record), de Cassandra Clare, fecha
a lista geral dos dez mais.
— Esses jovens leitores
não são só leitores. Eles têm uma relação de fã com os livros, com as séries,
com os autores... E o livro, nessa história, é quase como um objeto de desejo:
além de ler, eles querem colecionar, colocar na estante, organizar. Com e-book
não tem muito disso. Você não tem como virar para um amigo e dizer: “Deixa eu
te mostrar a minha estante de e-books” — analisa a editora-executiva do selo
Galera Record, Ana Lima.
Julia Schwarcz, publisher
da Seguinte, selo jovem da Companhia das Letras, conta que já recebeu e-mails
de leitores de pouca idade reclamando que o volume de uma série tinha meio
centímetro a mais que outro, e isso, segundo eles, fica feio na estante:
— É curioso porque temos
um livro de contos que lançamos em versão digital gratuita e só depois lançamos
em versão física. Ele faz parte da série “A seleção”. Foi um sucesso de vendas.
Muitos leram a versão digital e ainda fizeram questão de ter a publicação em
papel.
O sucesso da série “A
seleção” é realmente estrondoso. O último volume da trilogia, chamado “A
escolha”, lançado em maio deste ano, teve tiragem inicial de 50 mil exemplares,
quando tiragens básicas giram em torno de 3 mil. Desde o lançamento, a Seguinte
já vendeu cerca de 100 mil cópias só dessa publicação.
Para o fundador do
PublishNews, Carlo Carrenho, há algumas explicações para os bons números.
Segundo ele, é preciso considerar a produção ainda pouco consistente de e-books
no Brasil. Um livro digital infantojuvenil precisa ter um mínimo de interação
para despertar interesse entre os jovens — e a leitura dos e-books por crianças
e adolescentes em outros países vem crescendo. Ainda assim, há um aspecto
social da leitura para os mais jovens que não se manifesta com tanta força
entre os adultos:
— Se você está lendo um
e-book, ninguém sabe o que você está lendo. Tem a história de você levar a
publicação para a escola, de você formar uma tribo ou se juntar a um grupo
pelos livros, o que é muito importante para os adolescentes. O adulto lê para
ele e não precisa, necessariamente, mostrar para outras pessoas. O livro acaba
sendo uma marca de consumo para os mais novos, assim como as roupas — explica
Carrenho.
Aluna do Colégio Pedro II,
Julia Amorim, de 13 anos, está lendo “Convergente” (Rocco Jovens Leitores), de
Veronica Roth. É o seu 11º livro deste ano:
— Quando eu leio,
realmente me desligo do mundo. Posso terminar um livro de 500 páginas em dois
dias, de tão curiosa que eu fico para ver o que acontece no final.
Essa questão com os finais
de livros, aliás, vem fazendo com que muita gente de pouca idade sofra com os
spoilers.
— A gente fala tanto sobre
o que está lendo com os amigos na escola que sempre tem um que conta o que vai
acontecer e estraga tudo — brinca Mariana Rodrigues, de 13 anos, também do
Pedro II.
Entre os livros escolhidos
pelas duas e pelas amigas Sofia Cheib, Carolina Campello, Carolina Porto, da Sá
Pereira, e Fernanda Metzler, do Franco Brasileiro, como os melhores dos últimos
tempos, estão as séries “Jogos vorazes”, “Instrumentos mortais” e “A seleção”.
Da mesma forma que jovens
leitores vêm mostrando que são mais do que leitores — são também fãs — autores
de sucesso também demonstram que são mais que autores. John Green, por exemplo,
é escritor e mestre nas redes sociais. Só no Twitter, ele tem 2,8 milhões de
seguidores em seu perfil oficial. Durante a Copa do Mundo, um outro perfil
dele, onde o autor só comenta sobre esportes, bombou. Green ainda montou uma
campanha, junto com o irmão, para arrecadar dinheiro para uma fundação de
combate ao câncer. As pessoas doavam um dólar e escolhiam por qual país o
escritor deveria torcer na Copa. No próprio Twitter, ele dizia para quem iria a
sua torcida, vestindo a camisa da seleção em questão.
— John Green é um
fenômeno. Tem canal no YouTube, tem um Tumblr, tem contas no Facebook e no
Instagram, tem os perfis seguidos por milhões de pessoas no Twitter, ou seja,
tem uma presença maciça na internet — explica Danielle Machado, editora de
infantojuvenil da Intrínseca, sobre o autor que já vendeu quase 1,5 milhão de
exemplares de “A culpa é das estrelas” no Brasil, desde o seu lançamento em
julho de 2012.
Fernanda Metzler com o
livro do fenômeno John Green - Simone Marinho
É a internet que também
aumenta a expectativa dos leitores-fãs em torno da vinda da escritora Cassandra
Clare, autora de “Instrumentos mortais — Cidade do fogo celestial” (Galera
Record), ao Brasil. Cassandra já vendeu 26 milhões de exemplares da série no
mundo todo — 800 mil só no Brasil. Mais de 3 mil pessoas já confirmaram
presença na tarde de autógrafos da moça, na Bienal do Livro de São Paulo.
De diversas formas, a web,
quem diria, ajuda muito a impulsionar e manter as vendas dos livros em papel
para adolescentes. O boca a boca virtual se tornou fundamental. Tanto é que a
rede está abarrotada de blogs, criados inclusive por jovens, onde os próprios
escrevem suas resenhas e abrem debates com outras pessoas sobre os livros do
momento. As editoras, cientes disso, enviam exemplares para esses críticos
digitais, que também colecionam seguidores. Um deles é Pedro Vinícius, de 18
anos, do site O Livreiro.
— Eu leio, em média, uns
dez livros por mês. Mas no ano passado, cheguei a ler 30 em algumas épocas, era
um por dia mesmo. Eu preciso me programar para dar conta: leio no ônibus, no
intervalo da escola, onde der — explica Pedro, que está no 3º ano do Ensino
Médio e conta com colaboradores de outras partes do país para fazer resenhas e
escrever notícias sobre o mercado literário.
O amor pelos livros também
levou a carioca Kimberlly de Moraes, de 18 anos, a criar o blog Último Romance.
— Criei o site para poder
conversar com outras pessoas que gostassem de ler, assim como eu. Depois de um
tempo no ar, você começa a ter seguidores bacanas, que às vezes começam a ler
um livro por conta de uma opinião sua, ou até mesmo escrevem para rebater com
fúria algo que você escreveu e eles não concordam — brinca Kimberlly, que tem
quase 3 mil curtidores do Facebook e 2.300 seguidores no Twitter.
A jovem, como muitos
adolescentes que hoje veneram os livros, começou sua jornada literária por
Harry Potter, que Carlo Carrenho, do PublishNews, considera um divisor de
águas.
— Harry Potter veio com
aqueles livros de muitas páginas, pesados, uma série inteira, e assim
conquistou crianças e jovens no mundo todo, espantando os adultos que não
imaginavam que isso pudesse acontecer. Depois vieram os vampiros, com a série
“Crepúsculo”. O mercado editorial passou a caminhar para um sentido de
entretenimento. Há 20, 30 anos, nós éramos crianças ou adolescentes e a nossa
leitura estava muito mais ligada ao aspecto educacional. Hoje, para essa idade,
ela está ligada à diversão — avalia Carrenho.
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