Todos os sons
Todas as vozes que saíram
de minha garganta tinham remetente e destinatário certos. Cada som que emiti,
tentando traduzir em palavras o que eu sentia saiam de mim rumo a mim mesma.
Ao longo dos anos não
economizei rimas. Declamei aos quatro ventos todas as frases que pude e matei
todas as minhas sedes de prosa, mesmo quando bebia silêncio.
Quando tocada pela
angústia fiz de carvão desenhos de minha tormenta, para contrastar com os sóis
de giz que rabiscava nos muros das casas pelas vielas que caminhei.
Quando ferida, aproveitava
o sangue pingado para colorir as pétalas caídas sob meus pés, frutos de
primaveras extintas há muitas luas, quase lembranças dos verões que não vivi.
Bebendo de infinitos
alheios, desejei o meu próprio infinito. Desejei fechar eu mesma o meu círculo.
Decidi dar vez ao meu grito, abafar o silêncio que me rodeava e reclamar a
parte que me cabe de minha existência limitada, mas que jamais chegarei a viver
em plenitude e que, portanto, é o meu infinito particular.
Só quando dei conta de que
as altas grandezas são alicerçadas em pequenas é que passei a reivindicar a
conta. A minha conta que só eu poderia pagar. Aquela que só eu deveria por todo
o sempre e cujas prestações se disfarçam de suaves, mas nunca deixam de lembrar
que a dívida é eterna.
Desejei conter a minha
febre de querer sempre mais, atenuando-a com gotas de por-hoje-é-só, mas nunca
eram suficientes e, febril, sentia meu corpo latejar ao menor sinal de comodismo.
Sonhei noites e noites com
alturas maiores e com meus ímpetos de lançarmos dos abismos que trilhei bem de
perto, quase tão de perto quanto meus ataques de egoísmo e egocentrismos.
Esses, na verdade, contribuíram para a minha proximidade com meus abismos.
Tentei avidamente fugir de
mim mesma quando a convivência não mais suportável, mas não se separa corpo e
alma. não se pode abandonar-se a si mesma na estrada. E segui entre a
indiferença e a impaciência comigo mesma até que, cansada, desisti.
Todos os sons que já ouvi
concorriam para a minha mente e me mostravam que a fuga seria frustrada. Os
planos abortados e tudo o mais que negasse o meu lado humano, demasiado humano,
levariam-me ao poço. Não o dos desejos que se realizam por uma moeda qualquer,
mas ao que parece ser sem fundo, em que bebemos nosso próprio veneno e onde
aprendemos a curar as nossas feridas.
Depois de ter
desacreditado em mim e em minhas tentativas, deixei-me cair quase sem forças, a
contemplar o céu de azul inebriante e percebi que é do chão que retiro as
minhas forças. É nele que devo buscar o apoio, a mola para o próximo impulso, a
base para os passos vindouros.
Só depois de sofrer e
correr e chorar e enxergar toda imperfeição é que pude descansar e ter a
certeza de que sou uma exclusividade sem fim, diversa e especialmente iluminada
e exposta às janelas do mundo e foi então que percebi a magnitude que se é o
ato de respirar, de sentir o sangue a correr pelas veias, de fazer parte da
criação. De viver. De ouvir todos os sons
Dy Eiterer.
Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil. Edylane é Edylane desde 20 de
novembro de 1984. Não ia ter esse nome, mas sua mãe, na última hora,
escreveu desse jeito, com "y", e disse que assim seria. Foi feito. Essa
mocinha que ama História, música e poesia hoje tem um príncipe só seu,
seu filho Heitor. Ela canta o dia todo, gosta de dançar - dança do
ventre - e escreve pra aliviar a alma. Ama a vida e não gosta de nada
morno, porque a vida deve ser intensa. Site:Dy Vagando
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