O
que ninguém conta sobre morar junto
por Alberto Brandão
Artigo publicado no site PapodeHomem
Um dos meus textos mais
populares aqui no PapodeHomem é o “O que ninguém conta sobre morar sozinho”.
Apesar de apresentar muitos detalhes similares – pelo simples fato de se
desvincular dos cuidados dos pais – juntar as escovas de dentes tem algumas
particularidades que só começamos a entender depois que vivemos essa transição.
Infelizmente, muitas
pessoas ficam com medo de abrir alguns detalhes, com medo de estar jogando um
balde de água fria num momento importante na vida das pessoas. Conviver é
difícil e choques vão acontecer por muito tempo até acostumarem-se.
Eu, dentro da incrível
jornada que é a vida, já morei junto, já me separei, já morei junto de novo
(até com a mesma pessoa) e assim fui colecionando alguns aprendizados que, sim,
adoraria que alguém tivesse me contado quando tomei a decisão pela primeira
vez.
O fato é que quando esse
dia chega, e os dois lados estão com o julgamento extremamente comprometido
pela paixão. Você só consegue pensar naquela pessoa, tudo o que quer é morar
junto e acordar sentindo aquele calor na nuca, todas as manhãs. Os pontos
negativos são negligenciados e a emoção acaba falando bem mais alto do que a
razão.
1. Morar junto é como
abrir uma empresa
Este é o ponto que o amor
oculta logo de início. Morar junto (casando ou não) é como abrir uma empresa e
tocar um negócio. A paixão ajuda a manter as coisas mais leves e com um peso
menor, mas existem burocracias e pormenores que acabam criando incômodos muitas
vezes inevitáveis.
Pode ser uma empresa ou
uma rebelião.... dá tudo na mesma.
Tudo isso inclui
transparência financeira, cronograma de planos e direcionamentos que o casal
pretende tomar. Levei muito tempo para aprender que, sem estes pontos, é muito
difícil se guiar em dupla sem medo. Seu parceiro é como um sócio, que apesar de
já ter confiado um passo inicial muito importante, precisa e busca por algumas
certezas que amenizem o medo de caminhar no escuro.
Por isso, é normal ver
conflitos acontecerem quando um membro da relação não entende claramente para
onde o outro está caminhando. A comunicação sobre mudança de planos,
imprevistos e o andamento do caixa deve ser frequente e sempre bem honesta.
Este é o ponto no qual
muita gente se exalta e clama por liberdade, mas é só medo de sentar e lidar
com as coisas de forma adulta.
2. Seu parceiro só mostra
a versão melhorada de quem é
Uma das coisas mais
marcantes nesta transição é o choque entre o idealizado e o modelo real.
Quando passamos apenas uma
fatia limitada de tempo com uma pessoa, é muito comum ver apenas a parte boa.
Sua namorada é doce, sensível e compreensiva porque você normalmente não está
perto quando ela perde a cabeça, fica sem paciência e quer ficar deitada na
cama, com preguiça de tomar banho e pentear o cabelo. Seu namorado não a visita
quando está com aquele calção de goleiro, que já completa o sexto jogo sem
lavar. Você acredita que ele é incrivelmente organizado porque ele sempre
arruma o apartamento quando você avisa que vai chegar, mas nunca contou que
deixou uma fatia de pizza por 2 semanas em cima da mesa da cozinha.
E você pode dizer que
passa muitos dias seguidos na casa dela e que nunca viu nada disso acontecer,
mas acredite, se tem algo que você não está mostrando, do outro lado acontece a
mesma coisa. Ao longo do tempo a resistência cai e tudo se mostra, abrindo
espaço para o choque de realidade.
3. A relação muda no
primeiro dia
Apesar do ponto anterior
ser até esperado pelos mais observadores, este me pegou inteiramente de
surpresa. É comum ver casais que passam de 3 semanas a 1 mês juntos, um na casa
do outro ou em viagens, acreditarem que esta experiência mostra como seria morar
junto. Puro engano.
Pensa que dá pra manter
essa pose toda por muito tempo?
A partir do momento que
entram na casa onde vão morar, não importando se um mudou pra casa do outro ou
mudaram juntos para um lugar novo, aquele passa a ser um problema dos dois. Já
no primeiro dia, quando os dois sentam e observam todas as caixas e coisas
espalhadas pela casa nova, fazendo a lista do que falta comprar e quanto
dinheiro ainda tem no banco, as atitudes começam a mudar.
É difícil dizer exatamente
o que muda, dada a complexidade de cada relação. Mas é comum comentar sobre
esta súbita mudança com casais de amigos que passaram a morar junto e receber
uma confirmação de que foi parecido.
Os motivos vão variar bastante.
O medo de não conseguir pagar as contas, de estar dando um passo maior que a
perna, de ter tomado uma atitude precipitada. E se aquela não for a pessoa
certa? E se eu quiser ir para praia com meus amigos sem ela? Será que eu estava
pronto? Os medos são muitos e começam a assombrar muito rápido, surge a
realização de que qualquer decisão, por menor que seja, terá alguém a ser
consultado e essa pessoa possui um altíssimo poder de veto.
Essa pressão, se observada
com bastante antecedência pode ser reduzida e transformada em motivo de maior
companheirismo entre os dois. É comum, para quem viveu sozinho por muito tempo,
se retrair e assumir seus medos como um
problema individual, ao invés de dividir os medos e encarar a situação em
dupla, como um inimigo comum.
4. A individualidade
existe e deve ser preservada
Eu sei, falei um monte
sobre como o casal se torna uma entidade e que divide todas as decisões sobre o
andamento do time, mas existe um problema:
Você não se apaixonou por
uma cópia de você e isso pode ficar evidente o tempo todo.
Ao morar junto, vários
traços da nossa personalidade passam a ser omitidos em detrimento da vida
conjugada. Você gosta de jogar futebol nas terças à noite, mas não gosta de
deixar sua namorada sozinha em casa. Você gostava de treinar Muay Thai, mas
agora seu namorado fica em casa vendo TV e você prefere ficar esse tempo com
ele.
No começo, tudo isso
parece atitude de um casal unido, sacrificando seus passatempos preferidos para
ficar mais tempo um com o outro. Parece funcionar, até o momento em que ambos
perdem suas características mais marcantes.
O casal vai se tornando
cada vez mais dependente da presença do outro, o que antes era um cessão
voluntária passa a se tornar uma obrigação. Esse comportamento vai se estendendo
até o momento em que nenhum dos dois faz mais nada sozinho, a não ser
trabalhar. E se algum dos dois trabalha em casa, é pior ainda. Daí em diante um
vira uma cópia do outro e começa a se perceber num caminho bem entediante,
praticamente sem saída.
Evitar este ciclo é um
exercício constante. Saber quando exigir, e também respeitar a individualidade
ajuda não apenas a movimentar o cotidiano, mas a manter os assuntos variados.
Caso contrário, a pessoa
interessante que você conheceu pode estar com os dias contados.
5. Saiba existir em
silêncio
Existe algo muito ruim e
que afeta demais a forma que o casal interage diariamente. Por muito tempo
sofri do que acredito ser um mal e em conversas vejo amigos reclamarem com
bastante frequência. Existe uma dificuldade em estar junto, no mesmo cômodo sem
interagir.
Há uma inquietude em ver a
outra pessoa calada, focada em alguma atividade. A insegurança bate, o medo e
as aflições começam a falar mais alto. “Sera que fiz algo?”, “Por que ele está
tão calado?”, “Será que está chateado com alguma coisa?”.
Da faísca surgem os
questionamentos: “Está tudo bem?”, “Por que você está tão calado?”.
Assim, o casal desaprende
que ficar em silêncio e cuidar das coisas da vida faz parte, que não precisam
conversar o tempo todo, retomando a fagulha de atenção. Que este tipo de
situação vai ficar cada vez mais comum, e a ausência de toque e fala, não
significa que estão se distanciando. Apenas que estão cada vez mais à vontade
na presença do outro.
* * *
Tudo o que falei até aqui
não quer dizer que a experiência de compartilhar um lar seja intrinsecamente
negativa, mas são pontos que, acredito, devem ser observados e contornados sem
pânico.
Importante aceitar que
cada um vem de um lugar diferente, com costumes, hábitos e preocupação que às
vezes podem ser conflitantes. Seu marido pode lavar louça de uma forma que não
é costumeira pra você, assim como sua esposa pode guardar coisas com uma lógica
que você não compreende.
O choque de pequenas
diferenças vai se tornando um problema com o tempo e a convivência, caso não
entendam – e aceitem – que as diferenças fazem parte do que torna a parceria
tão interessante.
ALBERTO BRANDÃO
Também escreve sobre
Parkour no Decimadomuro, conta sua jornada falando sobre empreendeorismo no QG
Secreto. Treina Taekwondo, Jiu-jitsu, Parkour e MMA. Escreve sobre treinamento
físico em seu blog. Recentemente largou tudo para buscar um caminho mais feliz.
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