Eça está na Berra
Por Humberto Pinho da Silva
Anda a cidade de Baião em alvoroço, porque parte da população encontra-se indignada pelo facto de quererem levar, para Lisboa, os restos mortais de Eça de Queiroz.
Criou-se até movimento para defender a causa. O porta-voz, o ex -autarca António Fonseca, considera a saída do escritor do cemitério de Stª Cruz do Douro – que fica junto à serra que Eça imortalizou, – prejudica o Concelho, além de ser afronta à Fundação Eça de Queiroz, que o trouxe de Lisboa, do cemitério de S. José, em 1989.
Parte dos descendentes de Eça estão, também, contra a transladação.
Entre eles, António Eça de Queiroz, que em 07/07/21, escreveu in: "O Comércio de Baião": é "Uma farsa política negociada entre 'amigos', pois o ridículo 'processo' (...) é além duma parolada de pretensiosos, um insulto à memória das pessoas que há mais de três décadas tudo fizeram para que Eça descansasse em paz junto de sua filha mais velha, no Cemitério de Santa Cruz do Douro. Com o acordo das netas, ainda vivas".
Após a morte de Eça, em 1900, na casa de Neuilly, sua mulher regressou a Portugal, indo viver para Penamacor, com uma irmã.
Consultou o pai de Eça para que lhe indicasse onde desejava que o filho fosse sepultado. Respondeu-lhe: Aveiro; mas a viúva resolvesse como achasse melhor. Esta, decidiu colocá-lo no jazigo da família, em Lisboa.
O desinteresse dos progenitores do escritor é notório ao longo da vida de Eça. Não estiveram presentes no: batismo, no casamento, nem no funeral!
Desinteresse inexplicável. O pai era juiz, a mãe pertencia a respeitável família de Viana do Castelo, filha do Tenente-Coronel José António Pereira de Eça.
Campo Matos, diz no: “Suplemento do Dicionário de Eça de Queiroz” que uma testemunha de um familiar que conviveu de perto com ela, (a mãe) obtido em 1974 por Severino Costa:
“Ela ficou furiosa de ter caído nessa falta e tomou uma raiva ao namorado que não quis casar (…) A Mãe à hora da morte obrigou-a a fazer a promessa de casar”.
Eça, como se sabe, nasceu na Povoa do Varzim, a 25 de novembro de 1845, em casa da irmã mais velha da mãe. Confirmado por Ramalho Ortigão, o pai, e a própria mãe.
Porém, Manuela de Azevedo, em: "À Sombra de Eça e Camilo" narra que nasceu em Vila do Conde no solar da família Pizarro Monteiro, em segredo, mas nunca foi confirmado.
Após o nascimento foi entregue aos cuidados de uma ama, seguindo, decorrido tempo (5 anos?) para Verdemilho – Aveiro, para ser criado pelos avós paternos, permanecendo aí, até completar dez anos.
Matricularam-no, em seguida, como interno, no Colégio da Lapa, que pertencia ao pai de Ramalho, indo depois para a Universidade de Coimbra.
Apesar dos pais casarem quatro anos depois do nascimento de Eça e já terem mais três filhos legítimos (Eça teve 6 irmãos,) nunca reconheceram oficialmente, o primogénito. Todavia Campos Matos, menciona em: “Imagens do Portugal Queirosiano” – que recém-formado, Eça residiu em casa dos pais, que ficava no quarto andar, nº 26 do Rossio (Lisboa,) e se hospedava lá quando vinha à Capital.
Só quando o escritor necessitava dos documentos para realizar o casamento é que, a pedido do Eça – para a noiva não saber que era filho de mãe incógnita, – o reconheceram oficialmente, mas não quiseram estar presentes na cerimónia, realizada em fevereiro de 1886, na Capela da Quinta de Santo Ovídio, propriedade da mãe da noiva.
Atitude estranhíssima. Eça era diplomata, figura conhecidíssima no meio literário português e ia casar com a filha da Condessa de Resende, família abastada, da mais alta nobreza.
Estranho é, também, que após 124 anos da sua morte, o queiram levar para Lisboa.
O que, certamente, Eça desejaria, é que o País, em vez de lhe darem a honra de Panteão, não tivessem perseguido politicamente a família, chegando a ameaçar a viúva de lhe cortarem a pensão, a que tinha direito, se ela e os filhos, não apoiassem a República! Atitude que os obrigou a expatriarem-se para Londres, segunda me contou Dona Emília, neta do escritor, durante a conversa que tive em sua casa.
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