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Sem Serventia [LÊDA SELMA]

Sem Serventia         

Inacreditável! Uma leitora brasileira, que se diz ‘rabiscadora de poesia nas horas vagas’, no fulgor de seus 93 anos, residente no Texas,  e-mailizou-me: “...Sou sua leitora assídua, e, quando morava em Ribeirão Preto, li, já faz um bom tempo, no DM, um texto seu bem engraçado que falava de uma esposa desejosa de botar para escanteio o marido descumpridor das tarefas conjugais. Integro um grupo de senhoras e queria que elas lessem o texto, pois sei que se divertirão, mas não o encontrei na internet. Como encontrá-lo?”. – Aqui, dona Mariana. Republico-o em sua homenagem:
Agora é lei. E é pra valer...! Ai do cônjuge que não desempenhar as funções para as quais se habilitou no famoso “Dia do Sim”! Maridos, cuidem-se: corpo mole, nem pensar! E ai da mulher que fraudar seu ciclo mensal em honra e glória de um premeditado descanso! Pois é, lei seca ou do menor esforço, no âmbito conjugal, coisa do passado. Portanto, ao desanimado ou preguiçoso, flagrado em negligência, a rigidez da lei. 
Sabedora disso, certa esposa  desditosa resolveu estrear a lei e buscar seus direitos. Pensou no Juizado de Pequenas Causas, mas logo desistiu: “Minha causa é enorme e precisa de um juizado maior, de grandes causas”. Mas logo soube que o tal mudou de nome: Juizado Especial e, então, animou-se ainda mais.
– É, meritíssima, o folgado, quer dizer, o arremedo de marido, no duro, é pura moleza. Pra ele, casamento é só mesmo o do sono com o travesseiro. Aquele outro, o prometido, jurado e sacramentado pelo padre, agora, só na lembrança. E, enquanto o espírito se ajeita com alguma distração, o pobre do corpo padece! A interessada, então, valha-me Deus!
– A senhora quer dizer que seu marido não tem marcado presença no leito conjugal? 
– Digo, redigo e tredigo. E mais: vim denunciar o molenga, o sovina, o negligenciador  do ofício noturno. O ridico só tem mesmo marcado é ausência. Presença? Só da soneira e do ronco.
– E a senhora já tentou conversar com o faltoso, isto é, com o marido?
– Pra mais de muitas vezes, meritíssima, bem pra mais...
– Talvez, uma estratégia nova, um temperinho diferente... 
– Ah! tenho feito de um tudo, pode crer. Temperinho? Hum, temperão! Com óleo de dendê, malagueta e tudo o mais. E os disfarces então? Já me disfarcei de donzela, encarnei a vadia, empinei as protuberâncias, inventei remelexos e tremelexos e, mesmo assim, o maldito, o tal marido sem serventia, fugiu da lida. Feito cruz-credo fugindo de água-benta ou político, de eleitor, depois da eleição.
– Se a senhora está dizendo isso, e com tantas ilustrações, é sinal de que a situação está mesmo delicada. Bem, e a que pode ser atribuído tamanho desinteresse?
– A várias incompatibilidades: de desejos, de horário, de disposição...
– E quais as suas pretensões, com relação ao caso?
– Terceirizar os serviços do inativo. Sim senhora, abrir uma franquia. E tudo se resolverá: o enfastiado se refestela na moleza, o futuro operante mostra sua serventia e eu me livro da precisão. Assim, fica até mais em conta para o infrator, pois nem preciso apelar para uma indenização por danos conjugais.
– Melhor usar o bom senso: um diálogo franco, uma viagem a dois, um terapeuta de casais...
E, com cara de pouco marido, a juíza, após um relampejar de pensamento maroto, desveste o rosto da tradicional carranca e regozija-se num monólogo interior: “Meu marido, há muito, não tem me frequentado... Terceirizar os serviços do inativo... bastante pertinente.
E, então, com certo cinismo, conclui maliciosamente: “Se a queixosa quiser ouvir meus conselhos, ficar com o bom senso, com o diálogo ou com o terapeuta de casais que fique, porque eu, ah!, vou é tratar da tal terceirização. Uma franquia... Hum... e  por que não?!

Momento poético:
         ... Já não me basta
         o amor em combustão,
         se tenho o sonho,
         mas perdi a estrela.



Baiana de Urandi e goianiense por adoção, LÊDA SELMA (de Alencar) é graduada em Letras Vernáculas e pós-graduada em Linguística. Poetisa, contista, cronista (escreveu para o Diário da Manhã por 21 anos, aos domingos), integra várias antologias nacionais e internacionais. É verbete em obras como o Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras, de Nelly Novaes Coelho, São Paulo/SP, e Enciclopédia de Literatura Brasileira, Afrânio Coutinho/J. Galante de Sousa, São Paulo/SP. Atual vice-presidente da Academia Goiana de Letras/AGL (ocupa a Cadeira 14), da Associação Nacional de Escritores/ANE, União Brasileira de Compositores/UBC, União Brasileira de Escritores/UBE-GO e Associação Goiana de Imprensa/AGI. Publicou 15 livros (poemas, contos, crônicas). Entre várias premiações, o Troféu Tiokô de poesia, da UBE/GO, Troféu Goyazes Marieta Telles Machado, de crônicas, da Academia Goiana de Letras, e o Mérito Cultural, pelo conjunto da obra, da UBE/RJ. Recebeu os títulos: Cidadã Goianiense e Cidadã Goiana.

Um comentário

Marisete Zanon disse...

Hahahahaha! Eitha que a juíza foi porreta! rss. Muito bom e ela embala na escrita e quem lê na leitura.
Um abraço!