Poemas de um desconhecido [Ivana Schäfer]
De um poeta peruano desconhecido
Não me cobre atitudes perfeitas.
Eu ainda sou o mesmo do dia em que nos conhecemos.
Se algo mudou
Foram os seus olhos,
Que não refletem mais o cinza de outrora.
O abismo os engoliu, fizeram deles sua morada.
Do alto do monte Tocllaraju
Descubro que Lima ainda é a minha casa
E o teu coração o meu deserto.
Não há respostas para as insídias mal resolvidas.
As armadilhas foram antídoto para o aprendizado.
Aprender pela obsessão é como perder-se
Em labirintos vítreos que mostram os erros,
Pensamentos e neles lacunas em que reina o vazio.
Se um dia fomos clandestinos na nossa própria aventura,
Deveu-se a guerra particular a dois que inventamos.
Você, Valquíria silenciosa, abraçou-me em um tempo que findava,
Em um tempo em que exigimos um milagre
E recebemos a triste memória de eventos que não vivemos,
Apenas os narramos como vitórias do prazer e do fel.
Sejamos sincero, o sonho se desfez na alvorada,
O amor não foi suficiente.
Do alto do monte Tocllaraju
Ouvi seu grito de misericórdia
E vi todo o horror que uma palavra pode provocar.
Acabou Valquíria silenciosa!
E do alto do monte Tocllaraju,
Não me peça atitudes perfeitas jamais.
De um poeta peruano desconhecido
Na casa vivem várias mulheres,
Cada qual com seus costumes e ritmo.
Uma é a dona da casa,
Forte e serena como uma mulher de Cuzco,
Outra, em silêncio, faz as suas tarefas,
E vê nas nuvens, ao se sentar na Praça de Armas,
Um futuro longe daqui.
A morena que sonha com Machu Pichu,
É a mais ardente, e faz do dia
Noites de feitiços e prazeres.
Uma delas, melancólica, distante,
Bela e indomável, lê Neruda
Para que os dias sejam menos cinzas.
A de cabelos pretos, como todas as outras,
Estende-se num lago tal e qual Ofélia.
Aquela que lidera e dita normas,
Se diz descendente de Mama Quilla,
E ordena o rumo da vida das outras.
Eu caminho pelas ruelas cuzquenhas
E as vejo seguindo meus passos
Ou longe como inalcançáveis.
De volta para casa, penso na vida que passa
E nas noites de tempestade
Ou de madrugadas frias,
Quando elas se debatem e se unem
À procura de um corpo que abrace o mundo.
Neste momento, e apenas neste momento,
Pareço soberano, no encaixe dos corpos,
E elas se fundem e se tornam Virgínia,
Todas as mulheres são Virgínia.
E eu sussurro o diminutivo do seu nome
Em seus ouvidos e sinto a sua pele se arrepiar.
Assim, a existência se move no silêncio,
Pronta e revitalizada para as agitações seguintes,
E eu sussurro, novamente, o diminutivo do seu nome.
Desta vez, apenas para os deuses se encantarem.
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