As
crônicas de Clarice
Quando
peguei o livro de crônicas que a escritora Clarice Lispector escreveu para o
Jornal do Brasil na sua coluna aos sábados (1967-73), juro que desejei
ardentemente desvendar o mundo subjetivo e o dia a dia das pessoas que
transitam todos os dias pelos acontecimentos, espaços e tempos efêmeros que
podem eternizar-se, como ela assim o fez.
Suas
palavras são simples, claras, entendíveis – como se cria uma nova palavra, e o
autor pergunta a si próprio, com ar de preocupação: “Será que entenderão o que
falo?” E, ao final de um suspiro, ele se entendeu completamente. Esse é o
sentido: entender-se e ser entendido em sua forma completa, como um todo
existente e não explicável.
O
que sei é que gosto de escrever e como já disse uma vez “acho que causo um
efeito devastador sobre as palavras”, mas deixe-me explicar: tenho em minha
forma real e visível de escrever as descrições e até os detalhes mais sórdidos
que passam a causar a náusea e o medo no interior das pessoas. Mas, cada
escritor vive e é desvendado em seu mundo de palavras e construções de
realidades e fantasias, ou os dois agindo em separado - assim prefiro
acreditar. E gosto desses mundos transversais e paralelos que saem da tinta e
do pensamento, o que me surpreende sempre em lugares quaisquer.
A
inspiração ou não sei o quê e como definir, alguns atos e inquietações minhas e
humanas, vem tão de dentro, pisando profundo, que nenhuma fibra se distrai,
arruma-se, como um emaranhado de células, organizadas e tomando formas
harmônicas em cada parte independente ou dependente, como esperamos entender a
complexidade da vida. A simplicidade está em como se vive e se descreve as sentenças
e o mistério irrevogável de estar no mundo.
Folheando
alguns livros sobre as cartas e entrevistas que Clarice realizou (Minhas
queridas e Correspondências, ambos pela Rocco), senti que o diálogo entre
pessoas pode ser mais simples do que se imagina, não precisa de meio-termo ou
alvoroço, porque alguém poderá não nos entender. Se tudo está dito em linhas e
palavras que se explicam por si só, não vale impressionar tanto nossa mente, o
que pode ser fatal para as noites em claro.
Pode
até ser estranho enviar cartas ou colecionar correspondências em nossos dias
contemporâneos – imagina! guardar cartas que talvez jamais serão lidas, aliás,
respondidas, pois nossos emails assumem a responsabilidade de dar a novidade do
momento o mais rápido possível, até para os mais desinformados ou avessos a tal
tecnologia. O que sei é que as cartas são marcantes e já passou o seu tempo,
pelo menos as pessoas já não possuem mais o hábito da comunicação através
delas. Mas ainda guardo algumas - de amigos, familiares e pessoas que jamais
voltarei a encontrar neste planeta, pois já se foram para outros planos do
universo. As de Clarice, porém, ficaram para muitas gerações se deliciarem com
a conversa informal e como gostaríamos de nos comunicar com os outros que estão
sempre do outro lado da nossa caneta, que rabisca vários papéis até encontrar a
construção certa para que irá receber nossa história que encanta ou pode
desencantar no primeiro momento da leitura. É que não existem somente as cartas
alegres, mas também as trágicas, que podem marcar o rumo de todos os planos
desde o momento que chegam as mãos do receptor.
Continuo
escrevendo e pensando outras coisas – não sei desistir ou me esquivar do que
vem às minhas mãos, dou-lhe formas -, inclusive a poesia, que tenho um lugar
secreto para guardá-las, pois, assim como as cartas, já não possuem tanto
espaço nas estantes das pessoas, e quando possuem, são saboreadas várias vezes
para que seu gosto não seja esquecido. Parece que há algo de trágico e
romântico demais nos versos, e não necessita de medos para ler, apenas de boa
disposição e esquecimento do mundo que nos cerca, tão cheio de volumes
desnecessários.
Pensar,
sentir, estar entre espaços contínuos e descontinuados, ver-se e dominar o
constante estado de flutuar ou deixar-se estender numa poltrona, sem motivos
aparentes - apenas vivencio estas sensações últimas da liberdade -, saber que
se existe. Somente o ser que é livre possui a sensibilidade para dar o sentido
pleno a sua vida.
Participei da Focus - Antologia Poética VII, pela Cogito Editora:
Vem ai a ANTOLOGIA MUNDO, da Cogito Editora! Vou participar!!
Um brinde ao encanto das palavras!
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