A
vida-pássaro não pode ser uma gaiola!
Celso Sisto
ORTHOF, Sylvia. Cantarim de Cantará. Ilustrações de
Mariana Massarani. Rio de Janeiro, Rovelle, 2010. 56 p.
Se a vida passa rápida como um voo, o melhor é voar,
não é mesmo? E nada pode ser mais importante do que este voo! Desde que cada
pássaro possa escolher para onde quer ir.
Este livro é mesmo assim: traz a liberdade das
escolhas, as prisões das portas, as visões amplas das janelas bem abertas e os
recomeços de tudo.
E já que a história é contada em forma de peça de
teatro, há muito verso, muita música, cores, ações, poesia e movimento ágil.
A protagonista da história é a Pomba-Rolinha, que mal
amanhece o dia e mal o Pássaro-Sol deixa seu ninho, descobre que uma ventania
destruiu sua casa. Mas logo logo aparece o Urubu para resolver a questão: uma
nova casa, que na verdade é uma gaiola. Com a tristeza que toma conta dos
pássaros, o Urubu se arrepende e consegue a chave para soltar a pomba e como
recompensa, dá a ela uma porta de presente, para viver aberta. Mas o fogo
destrói a porta e justo quando a Pomba-Rolinha já ia perdendo as esperanças,
surge, sem aviso, a Borboleta Azul. Deste encontro, nossa protagonista descobre
que o caminho está dentro de si e decide reconstruir sua casa, agora com uma
janela ampla, para olhar a vida. Anoitece então e o novo ninho da Pomba-Rolinha
é presente das estrelas, da Lua, do sonho eterno. E da transformação, fica um
ovo, de onde sairá muita coisa de novo!
Então, nos damos conta que o livro aponta para o ciclo
da vida, com sua porção de morte e renovação, mostrando com cores, músicas,
afetos, como as coisas se transformam. O final não poderia ser mais feliz,
claro, pois o ovo é a esperança maior. E quando surge tudo de novo, o melhor é
aproveitar a oportunidade para viver com intensidade e com tamanha liberdade!
As ilustrações da premiadíssima Mariana Massarani
ajudam a visualizar as cenas propostas por Sylvia Orthof, que sabe, como
ninguém, falar com leveza de assuntos complicados! Ela foi buscar inspiração
para essa peça na obra “Morte e vida Severina, do grande poeta João Cabral de
Melo Neto. E a história, transposta para o reino dos pássaros e para o universo
da criança, vem carregada de brincadeiras, cantigas populares e de roda,
melodias de cirandas, toadas, sambas, falas de versos rimados, em cenas
bonitas, como a da procissão de asas, quando a Pomba-Rolinha é aprisionada.
Esta história de Sylvia, em forma de peça de teatro,
tem a esperteza de propor atmosferas conduzidas por ritmos musicais variados e
instrumentos adequados, para criarem e pontuarem a ação dramática de cada cena.
Ela também propõe um espetáculo coletivo, inclusive com personagem oriundo da
tragédia grega (o famoso Corifeu), mas, para cinco atores, bonecos, objetos e
muita poesia visual. Uma ótima maneira de introduzir as crianças na arte da
encenação e na leitura gostosa do texto dramático. Grande e eterna Sylvia!!!!
Nos deixou mais de 120 livros publicados e, se estivesse viva, teria completado
no dia 3 de setembro, 80 anos de pura arte! Viva Sylvia Orthof, a grande
inventadeira de histórias amalucadas e abagunçadas da literatura infantil e
juvenil brasileira, como ela mesma se dizia...
Celso Sisto
é escritor, ilustrador, contador de histórias do grupo Morandubetá
(RJ), ator, arte-educador, crítico de literatura infantil e juvenil,
especialista em literatura infantil e juvenil, pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), Mestre em Literatura Brasileira pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Doutor em Teoria da
Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUC-RS) e responsável pela formação de inúmeros grupos de contadores de
histórias espalhados pelo país
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