Celso Sisto
AUAD, Pedro Kalil. O
menino que queria virar vento. Ilustrações de Luisa Helena Ribeiro. Belo
Horizonte, Aletria, 2012. 64p.
Talvez não haja bem maior
que a amizade. Ela deveria estar no princípio de tudo! Pelo menos, está no
princípio básico deste belo livro: amigos brincam juntos, inventam coisas novas
e permanecem unidos, onde quer que estejam!
O menino queria virar
vento, pois assim poderia visitar sua amiga que morava longe, muito longe. Das
conversas que eles mantinham, surgiu a sugestão: ela disse para ele fechar bem
os olhos e se imaginar virando vento. Ele pediu emprestado um pouco do azul
dela. Ela soprou pelo ar sua purpurina azul e então aconteceu a transformação.
A história, simples como
as brincadeiras e as coisas que as crianças dizem, está repleta de belezas:
desde as soluções mágicas que elas mesmas encontram para os seus problemas, até
a valorização extrema da fantasia como exercício fundamental desde a mais tenra
idade.
O texto é curto,
curtíssimo! Quase uma frase por página. Em algumas, só mesmo uma palavra, ou
até um pedaço de frase. Mas é o que basta para que o texto também mimetize o
sopro do vento, que é a principal brincadeira proposta pela história: virar
vento para ir aonde se quer!
Também num jogo infantil,
em que um embarca na história do outro, o faz-de-conta se realiza, com
conseqüências físicas: a menina sente uma coceirinha no pé, provocada pelo vento
e já sabe o que é!
O texto não precisa de
muitas explicações, porque tem uma beleza poética contida, em alta dosagem, nas
entrelinhas.
Dissolver-se, então, fica
sendo a palavra maior desta obra. Também fica sendo o segredo revelado, pois o
assunto principal é a amizade, a relação de entrega, a necessidade de
esquecer-se de si em prol do outro, de atravessar os céus e o tempo. É lindo!
O ir e vir do vento-menino
no livro produz imagens belíssimas, tanto poéticas, como concretas, através das
ilustrações.
A ilustradora brinca com
os azuis e todas as suas nuances. A sensação é de um dia que nasce, transcorre
e termina de novo. Essa progressão vem estampada no uso das cores de fundo.
O desenho busca a
simplicidade do traço infantil, e consegue! Linhas básicas, contornos
fundamentais e uma boa composição com as linhas pontilhadas, por vezes em
sobreposições.
A caracterização dos
personagens é surpreendente. Com pouquíssimos traços (quase esquemáticos!) o
sentimento deles reverbera, fica grande e evidencia-se!
É fantástica a solução
gráfica encontrada para o momento em que o menino começa a se esvanecer,
substituindo as páginas opacas por páginas translúcidas em papel vegetal. As
páginas dão a sensação da transparência enquanto o traço vai se dissolvendo,
até praticamente sumir. Bárbaro e simples!
Assim fico pensando no que
ouço das crianças, com freqüência: que elas querem feitos para elas livros que
possam fazer parte de suas brincadeiras. Então, esse é um deles: livro para
jogar com todos os sentidos! Livro para viver intensamente!
Autor e ilustradora
estreantes em livros infantis, neste primeiro trabalho, sabem que têm nas mãos
(na escrita, no traço, no estilo, na investigação...) uma bela estrada para
percorrer! Povoada, é claro, de bons livros como esse! A maneira como são
apresentados, ao final do livro, já dá uma ideia do caminho que trilharam para
chegar até aqui. É certo que o leitor pode esperar mais coisas boas deles!
Celso Sisto
é escritor, ilustrador, contador de histórias do grupo Morandubetá
(RJ), ator, arte-educador, crítico de literatura infantil e juvenil,
especialista em literatura infantil e juvenil, pela Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), Mestre em Literatura Brasileira pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Doutor em Teoria da
Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUC-RS) e responsável pela formação de inúmeros grupos de contadores de
histórias espalhados pelo país.
Assinar:
Postar comentários
(
Atom
)
Nenhum comentário
Postar um comentário