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Água: um bem cultural [Ivan Belém]

Água: um bem cultural


por Ivan Belém
Artigo publicado na Folha Max

Sempre se ouviu dizer, aqui e acolá, que a água poderia acabar um dia. Para muitos essa parecia ser uma história inventada por mentes fantasiosas, férteis. Mas, infelizmente, essa é uma história tão assustadora quanto real. A água é um bem finito, e disso ninguém mais duvida, creio. Embora saibamos que o Planeta Terra possua 70% de sua superfície coberta por água, desse total 97% é de água salgada e apenas 3% é de água doce, sendo que somente 0,6% é potável. Ainda assim pesquisas apontam que, em 2050, faltará água potável para 40% da humanidade, daí a constante preocupação por parte de governos e da sociedade civil com a questão.

O caso de São Paulo é emblemático. Enfrentando a pior estiagem dos últimos 80 anos, o Estado chegou ao ponto de cancelar eventos turísticos e culturais dado à crise de água, com alguns municípios em vias de declarar estado de calamidade pública. O Ministério Público Federal recomendou ao governador e à companhia de saneamento que adote o racionamento nas regiões atendidas pelo Sistema Cantareira e caso não atenda à solicitação serão tomadas medidas judiciais.

É um paradoxo, mas o Brasil detém uma parcela considerável de toda água disponível no mundo e, no entanto, uma grande parcela da população não tem acesso à água tratada e de qualidade, sendo que todas as espécies têm direito à água e devem recebê-la em quantidade suficiente à manutenção da vida, desta e de gerações futuras. Isso ocorre porque dentre os maiores problemas ambientais do país está a deterioração dos seus rios, motivada principalmente pela ausência da coleta e tratamento de esgotos domésticos, que são despejados in natura nos rios; e pelo excessivo uso de agrotóxicos usados em monoculturas, contaminando as águas, comprometendo o abastecimento humano e ameaçando a sobrevivência das demais espécies.

Presente em todas as religiões e culturas como símbolo de purificação, a atual escassez de água limpa e segura que se vislumbra sobre a Terra vem transformando-a em potencial símbolo de iniqüidade, devido ao caráter injusto de sua distribuição, na qual o acesso à água de boa qualidade fica restrito a uma minoria em detrimento de populações mais pobres, dentre as quais estão grupos étnicos, vitimizados, dessa maneira, na plenitude de seus direitos. Trava-se, assim, uma disputa desigual, clamando por justiça.

Portanto, cuidar da água é também cuidar da diversidade cultural. É preciso pensar a água para além do seu valor de uso material, contemplando os seus aspectos simbólico, espiritual e cultural.

Ivan Belém- é doutorando e membro do Grupo Pesquisador em Educação Ambiental, Comunicação e Arte (GPEA) da UFMT.

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