ORGULHO E PRECONCEITO [Raul Arruda Filho]
O enredo é simples. As cinco filhas do casal Bennet (Jane, Elizabeth, Lydia, Catherine e Mary) precisam casar, pois o direito de herança determina que a propriedade da família, Longbourn, por falta de um descendente masculino, deve passar para as mãos de um parente distante, o Sr. William Collins, que exerce função eclesiástica em Hunsford. A chegada de estranhos, que alugaram Netherfield Park, uma mansão próxima, muda – para melhor – as perspectivas das moças Bennet. Na primeira oportunidade social, um baile público, a mais velha e a mais bonita das irmãs, Jane, se apaixona por Charles Bingley. Na mesma ocasião, Fitzwilliam Darcy consegue demonstrar o quanto é antipático – defeito que Elizabeth considera inadmissível em um cavalheiro. O resto do romance, mais de 400 páginas, está relacionado com enganos, mal-entendidos, desencontros, confusões e paixão.
Em lado oposto, a seriedade está representada pela banalidade e a canalhice que caracterizam George Wickham – um personagem raso, desses que estão em cena para dissimular as diferenças entre o certo e o errado. Lady Catherine de Bourgh, tia de Darcy, unindo o histriônico com a prepotência, não consegue entender qualquer coisa que se afaste do mundo aristocrático – redoma que se mostra incapaz de proteger os valores que defende. A falta de graça desses dois personagens vai se transformando lentamente em humor. Eles são elementos de uma paródia, de uma caricatura grotesca.
O feminismo avant-la-lettre de Elizabeth Bennett é, provavelmente, a melhor qualidade de Orgulho e Preconceito. Ela consegue entender os acontecimentos antes dos outros personagens. Utiliza esse predicado como um jogador de xadrez – que calcula vários lances antes de seu adversário. Rebelde à tirania masculina, reverte qualquer situação desfavorável com presença de espírito. Herdou do pai a língua afiada, o uso da ironia como arma de combate. Nenhum homem consegue levar vantagem com ela. Inteligente, despreocupada com as aparências, lutando ardorosamente contra as convenções machistas, Elizabeth consegue encantar o coração empedrado de Darcy. Quando ele se declara apaixonado, confirma aquilo que o leitor desconfiava desde as primeiras páginas do livro: por trás daquela máscara de indiferença com o que é importante para as mulheres, há um homem carente.
Embora não seja a mais velha das cinco filhas, Elizabeth lidera as outras irmãs. Quase todas. A insensatez de Lydia não têm controle. Em compensação, a forma com que Elizabeth oferece solidariedade para Jane é exemplar. Embora não tenha muita estima pelo estilo atrapalhado de Charles Bingley, ela quer, antes de tudo, que a irmã seja feliz. E não economiza esforços para que o romance dos dois consiga chegar a um bom termo. Quando Darcy intervém para que o casal se una, o que o leitor percebe não é exatamente o triunfo de uma história de amor. O relevo dessa cena é o poder de Elizabeth agindo nos bastidores – muito mais forte do que as forças do destino.
Orgulho e Preconceito celebra a valentia das mulheres – e a fragilidade dos homens. A reunião desses dois ingredientes resulta em um romance magnífico, um triunfo da sagrada arte de compartilhar boas histórias com o leitor. Em síntese, um clássico.
P.S.: Há várias versões cinematográficas e televisivas de Orgulho e Preconceito. Uma das mais conhecidas foi dirigida por Joe Wright, em 2005. Keira Knightley e Matthew Macfadyen interpretam os papéis principais.
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